Capítulo 38

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Augusto

Ainda não acredito no que está acontecendo, saio do apartamento do Félix direto para o apartamento da Jessica. Ela queria vim dirigindo, mas ao ouvir a reação dela quando contei o que tinha acontecido com o Paulo. Soube que ela não teria condições de vim dirigindo.

Paro na porta do prédio onde ela mora e aviso que cheguei. Logo ela desce. O olhar de mais cedo, o olhar leve e descontraído não está mais lá.

_ Augusto, vocês já foram na polícia? Nós vamos para lá né? - diz Jéssica aflita.

_ Não. Não vamos. Vamos para a casa do Félix. Estamos todos lá. O André não quer por a vida do Paulo em risco.

_ O QUE VOCÊS SÃO MALUCOS? EU SEI QUE SÃO MAIS NOVOS MAS MEU DEUS!

_ Calma, olha por mim também íamos para a polícia mas o André está decidido e o Félix tem um plano. Se tudo der certo okay. Se não, vamos pensar em algo.

Jessica me olha desconfiada. A conversa que tive com ela mais cedo foi incrível, a gente se entendeu tanto. Falamos do futuro, dos sonhos. Ela não contou muito de si, mas do futuro. O que ela quer e claro um pouco da sua relação com o Paulo.

Enquanto ela falava, eu a olhava e ficava encantado. A primeira vez que a vi no auditório, não tive a chance de trocar muitas palavras. Mas lá na livraria, eu conheci uma Jessica que ama os livros que consegue se apaixonar por cada história, que consegue lembrar todos os livros que leu e ainda indicar para todos que apareceram.

A Jessica tem um brilho quando fala dos livros.

_ Jess, qual é o real motivo ? Eu sei que você se preocupa muito com o Paulo, como me preocupo com o André. Mas você é mais adulta, sabe que nem sempre é fácil cuidar daqueles que amamos. E na livraria, você não tocou muito no assunto do seu passado. E algo me diz que está tudo ligado. Eu não quero te pressionar mas saiba que se você quiser conversar, estou aqui. - digo

Ela me olha e seguimos em silêncio até o prédio onde o Félix esta. Ao parar o carro, Jessica não se mexe e eu a encaro.

_ Augusto, eu vou te contar algo que somente a Miih sabe. Mas se você quer mesmo saber porque estou aflita por conta do Paulo, além do óbvio, você vai saber. Só espero que entenda. Faz uns anos essa história mas ela ainda mexe comigo. Principalmente, depois de tudo. E não estou dizendo isso para você ficar com pena de mim ou algo parecido. Você me parece ser uma pessoa muito gente boa. Tem esse ar de super herói que quer proteger a todos, mas com o tempo vai entender que nem sempre conseguimos. Sabe, às vezes aqueles que amamos são tirados de nós, e não podemos fazer nada.

Não entendo o que ela quer dizer mas espero ela concluir tudo.

_ Augusto, quando eu estava na faculdade eu era a garota que entrou por bolsa. Fui a que se matava para estudar mas que mesmo assim, não sabia como iria pagar os livros nos próximos semestre, se teria dinheiro para ir de ônibus. Quando eu já não sabia o que fazer, eu pensei muita besteira, mas na época eu tinha um amigo o Riven. Ele sempre foi próximo a mim, desde que me lembro por gente. Eu o conheci no cursinho de inglês que fiz quando era mais nova, lá eu também era bolsista e com o tempo nossa amizade aumentou. Na faculdade, ele era o único que de fato conhecia a minha realidade. E sempre soube que eu não aceitaria que ele ajudasse. Ele era filho de uma das famílias mais ricas do Brasil. E pouca gente sabia disso.

Jessica para de falar e suspira, eu ainda não sei onde ela quer chegar mas fico preocupado.

_ Numa noite fomos ao barzinho, ele insistiu para que eu fosse com ele. Pois, tinha avisado que não iria voltar para o próximo semestre. Iria trancar por um tempo até que as coisas lá em casa se resolvem e claro, eu arrumasse um emprego. Depois do Riven insistir muito eu fui. Só que, a gente nunca chegou a se ver. Naquela noite enquanto ele ia para o barzinho, três garotos o cercaram. Começaram a chamá-lo de estranho, de fresco, e o ameaçaram querendo que ele passasse seu dinheiro, seu celular. Eu não sei muito mais, na época a polícia investigou mas o máximo que descobriu foi que eram moleques que o cercaram. Algumas pessoas ouviram mas ninguém interferiu por medo. O que eu soube foi que, entre um insulto e uma ameaça, um dos garotos pegou uma pedra e tacou na cabeça do Riven. E quando ele caiu no chão, todos os chutaram. Ele morreu na mesma hora que a Pedra o acertou, mas mesmo assim. Aqueles monstros continuaram.

Meu Deus! Que horror! A violência sempre foi um problema gigante. Mas agora entendo o que ela quis dizer com : não podemos salvar todos que amamos.

_ Naquela noite eu fiquei no barzinho e quando meu celular tocou e eu vi que era o número desconhecido eu assustei. E do outro lado uma moça me informou que meu número era o contato de emergência do Riven. Ela não alongou simplesmente disse que eu teria que ir no hospital pois um homem tinha sido levado para o hospital e ele tinha falecido. Eu corri para lá, ainda não acreditava. Tentei não pensar que o único homem, tirando meu pai, que poderia ter meu contato como emergência era o Riven. Já que, sua família não era tão presente. Quando cheguei ao hospital fui levada e eu o vi. Nunca vou esquecer. O médico disse que ele tinha sofrido um traumatismo craniano forte e que nada podia ser feito. Eu chorei e só chorei. Os pais dele logo chegaram, pois os avisei. E o senhor Alfred e a senhora Lavínia ficaram lá vendo o filho. O enterro foi no dia seguinte e quando estava indo embora, o senhor Alfred me chamou. Lá em frente a igreja, ele me contou que o Riven tinha contato a minha história para ele. E que, tinha pedido para os pais ajudarem. Na noite que ele morreu, ele estava indo me contar que o pai já tinha pago todo o material até o fim do curso e que além disso, era para eu morar num apartamento que a família tinha. No caso, o apartamento onde eu moro hoje em dia. A família dele realmente tem muito dinheiro. Muito mesmo. E sempre esteve disposta a ajudar a todos, só não davam tanta atenção ao próprio filho. Quando o Alfred me contou tudo, eu chorei mais ainda. Disse que não precisava, mas ele avisou que era um pedido direto do próprio filho. Por fim, eu aceitei e minha vida mudou. Mas, naquela noite eu perdi muita coisa. O Riven sofreu ataque simplesmente por ser mais fofo. E nunca disse para ele que o amava. Nós demos apenas um beijo quando estávamos mega bebados. A verdade é que quando ele se foi, eu perdi a esperança em tudo. Até que, vi o Paulo. Um garoto que chegou precisando de ajuda. E não soube dizer não. Paulo me lembrou um pouco a mim, e seu jeito me lembrou o Riven. É por isso que eu estou surtando! O Paulo não merece isso que ele está passando. - Diz Jessica chorando.

As palavras dela me socam por completo. Eu não fazia ideia que ela tinha vivido tudo aquilo. Eu não imaginava que ela tinha passado por tudo aquilo e ainda seguido em frente.

_ Jessica, eu estou aqui e juntos vamos dar um jeito. - digo.

Saímos do carro e ela me abraça e naquele abraço eu sinto que entreguei meu coração a ela.

Duas Metades (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora