Capítulo 2

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André

Mais um dia, às vezes eu não queria nem acordar. Mais um dia que eu vou levantar e fingir ser alguém que não sou. Tem sido assim desde que me entendo por gente.

Ainda lembro quando tudo pareceu óbvio. Eu tinha meus 13 anos, e enquanto todos os meninos só sabiam querer espiar as meninas no banheiro, eu não sentia atração nenhuma nisso. Mas claro, sempre menti e ia junto.

Meu grupo de amigo íntimo são os filhos dos amigos do meu pais, o Félix, o Augusto e a Yasmin. Crescemos juntos, desde o jardim até hoje. Todos na PUC - Rio. Vivemos os melhores anos, filhos de empresários e advogados. Tivemos os melhores colégios, as melhores viagens, mas nem eles sabem da verdade.

O Augusto é como um irmão para mim, ele é aquele tipo de garoto que luta pela causa de tudo. Até mesmo, da planta que é pisada na rua.

A Yasmin é a típica patricinha, mas tem um coração imenso. E nutri um amor pelo Augusto. Só que, ele não percebe. Tapado só pode.

Já o Félix é o palhaço, mesmo falando algumas coisas que tem hora que me ofende sem ele saber. Típico garoto moleque.

Ligo a internet ainda na cama e lá está o grupo Paralelos da Elite, mil mensagens durante à noite. Tudo sobre a social que terá depois da amostra de profissões. Vontade de ir? Zero! Só que se eu não for, vou ficar pendurado e ainda ouvir muito sobre meu sumiço.

Me levanto e vou me arrumar, fiquei de encontrar com o Augusto na frente do prédio, e ele vai rodar o condomínio Conde De San Remo e dar carona para o nosso grupo.

A parte da manhã o Augusto e o Félix terão aula de direito penal e a Yasmin estará no estúdio de dança. Como faço jornalismo, estarei com a turma do terceiro período trabalhando nas fotografias do evento da parte da tarde.

Mais um evento de amostra de profissão, quando eu ainda não estudava na PUC era super divertido, mas agora, é algo comum.

_ Anda logo André, temos que adiantar as coisas. Você sabe que a Yasmin odeia esperar ainda mais que o Félix está com ela. Então já viu! Ele vai está jogando aqueles xavecos que nem meu avô usaria.

Entro no carro e começo a rir, realmente o Félix é um galinha. Mas é louco pela Yasmin.

_ Se ele não fosse tão galinha, ele teria alguma chance.

Augusto sorrir e saímos. Assim que chegamos na porta do condomínio lá está a Yasmin de cara fechada e o Félix quieto. Já sei que ele falou algo.

_ Aleluia, achei que vocês não iam chegar nunca. Já estava para dar um tapa na cara do Félix. É sério, ele não vai crescer nunca! Parece que tem 13 anos ainda. E anda logo André, você sabe que gosto de ir na frente.

Pulo para a parte de trás do carro na hora que o Félix está sentando e sem querer sento em seu colo.

_ Ui André, eu sei que você é mais meigo e até gosta, mas comigo não rola não.

Saio do colo do Félix e reviro a cabeça. E claro que ele está rindo. Aí se ele soubesse.

Eu só queria que tudo fosse mais simples, só isso.

_ André, já ia me esquecendo, a Dani falou comigo. Ela gostou de vê você na última apresentação minha e perguntou se estava solteiro. Eu falei que sim. E ela pediu seu número. Posso dá?

A Dani é uma amiga da Yasmin da faculdade e eu a conheci na apresentação de dança da minha amiga. E realmente ela ficou dando em cima de mim.

_ Yasmin, não passa não.

_ Ah que isso, vai dispensar um avião daqueles? Como assim? Depois eu falo que você não gosta da fruta e o Augusto manda eu parar com as brincadeiras. Mas dispensar aquela delicia assim? Eu já tinha era finalizado.

_ Pois é, é por conta disso que você, Félix, precisa nascer de novo para eu te dar uma chance. - diz Yasmin.

Os dois começam a discutir e o número de telefone fica para segundo plano. Eu só queria que eles soubessem a verdade. Mas, não posso arriscar. Eles são meus melhores amigos, cada um de nós já cuidou do outro mais vezes que eu posso me lembrar.

Olho para frente e o olhar de Augusto está em mim. Eu conheço aquele olhar em qualquer lugar. É um olhar de preocupação. Sorrio para ele e digo com o olhar que está tudo bem.

O dia mal começou, mas eu só quero poder voltar para cama. Voltar para meu computador e para meu tumblr. Muitos hoje em dia não devem conhecer, mas não conseguir apagar a minha rede social da adolescência, claro o perfil fake que criei para poder me expressar.

Tem dias que tudo parece tão difícil e ninguém percebe, nem os meus pais, nem os meus amigos, nem o mundo. A verdade é que a pergunta "você está bem?" é apenas obrigatória. Ninguém de fato quer a verdade.

Finalmente chegamos, a PUC está fervorosa. A maioria dos alunos está na parte da organização. A Yasmin irá se apresentar. O Augusto ficará na estante de Direito, e escolheu onde ele pode explicar sobre a forma de financiamento que a faculdade oferece. O Félix, claro, pegou a parte de por umas musicas fundo. Ele odeia o curso que faz de Direito, mas filho de peixe, o pai exige que ele se forme e vá trabalhar na agência de advogados dele. Mas o que ele queria mesmo era ser DJ.

A Yasmin desce correndo do carro, e logo some pelo corredor leste. O Félix sai para encontrar com a Elly, uma menina que ele tem outro tombo. Aliás, Félix tem tombo por todas as meninas do universo.

Começo a descer e o Augusto me chama e eu paro.

_ André, você sabe que o Félix é um idiota com essas piadas né? Você sabe que estou aqui por você.

Acho estranho a fala dele, mas é o Augusto, de todos do grupo ele é o elo de ligação de todos, o tipo protetor. Não é como o Félix que já entrou em um milhão de brigas, sendo uma delas por minha causa e outra pela Yasmin.

Acho que foi os momentos de susto. Um cara chamou a Yasmin de puta quando ela não quis dançar com ele na festa de fim de ano do clube que frenquentamos e quando demos conta o Félix tinha socado o cara tanto que por pouco não acontecia coisa pior.

Naquela noite, eu achei que os dois ficariam juntos, mas não rolou. O Félix saiu de lá e ninguém entendeu o porquê.

Por minha causa foi na época da escola, estávamos sentados no nosso último dia de escola da vida. E o Marquinho que já tinha bebido umas escondido na sala veio para perto da gente. A princípio parecia como um dia comum, até que ouvi ele me chamando.

_ Conta para mim, André, aproveita que hoje é o último aqui e ninguém mais vai se reencontrar fácil. Você gosta é de dá né? A Carolzinha contou que tentou te pegar e você saiu da sala mais cedo. Você gosta de homem não é?

Quando ele acabou de falar, eu só me lembro de ter ficado vermelho e de ver um vulto passando. Era o braço do Félix. Ele derrubou o Marquinho que já estava bêbado no chão. E só olhou para ele e falou que se ele me desrespeitasse de novo ou inventa-se algo ele ficaria na lama.

Pois é, o pai do Félix é um dos advogados mais importantes e possui diversas pessoas trabalhando para ele, entre eles, o pai e a mãe do Marquinho.

Aquele dia eu achei que teria uma rodada de perguntas mas não, minutos depois parecia que nada tinha acontecido. E naquela noite eu fiquei com a Sarah, mesmo não querendo. Só que, serviu para toda a história morrer de vez.

_ André, está me ouvindo?

Volto ao presente com o Augusto me chamando.

_ Estou sim, relaxa. E qualquer coisa eu falo com você.

Desço do carro antes que ele pergunte mais alguma coisa e corro para o estúdio de fotografia.

O que eu podia esperar daquele dia? Claramente mais um que eu teria que fingir um sorriso e falar bem do curso, da vida e do mundo. Mas, internamente a única coisa que eu queria era subir na janela mais alta desde prédio e acabar com tudo. Seria tudo mais simples né?

Duas Metades (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora