Capítulo 4

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A felicidade da mãe de Mônica precisava ser expressa de alguma forma. Por isso, beijou a filha várias vezes, repetindo como estava orgulhosa de ela ser a primeira militar da família. O caminho até o carro foi percorrido com a mulher esfregando os olhos para conter as lágrimas de alegria. Após ligar o automóvel com a digital, respirou fundo e beijou-a pela última vez na bochecha.

O resultado da Seleção, além de ser importante para toda a família, deixou Mônica eufórica. A certeza de que teria um futuro brilhante a fazia estampar um sorriso teimoso, que não sairia dali por nada. Massageando as bochechas, já que começavam a doer, prestou atenção ao além da janela. Avistou os enormes prédios espelhados do centro comercial e as pessoas andando pelas calçadas e passarelas levando diversas sacolas. Prestou atenção às propagandas dos telões, enchendo-se de satisfação. Imaginou-se dali alguns anos fazendo o mesmo: comprando tudo o que sempre quis e ainda muito mais. Esse era o sonho de qualquer jovem da idade dela. Depois, claro, de casar e constituir uma grande família.

Ao chegarem em casa, o sorriso se desfez assim que colocou os pés dentro da sala e viu o pai sentado no sofá, diante da televisão. Com o nariz vermelho e os olhos marejados, coberto dos pés ao pescoço por um cobertor, tremia de frio mesmo com o dia quente. Por alguns segundos, Mônica esqueceu-se do que acontecia ali, deixando que a felicidade da aprovação lhe tirasse um pouco da realidade.

Ao vê-la, o pai se levantou com dificuldade e abriu os braços para recebê-la. A jovem foi até lá e o abraçou apertado. Afundou a cabeça no peito paterno e respirou fundo, na tentativa de conter a vontade de chorar.

— Estou muito orgulhoso de você — afastou-se para encará-la. Os olhos azuis iguais aos dela estavam inundados. — Você é a primeira militar da família.

Mônica trouxe de volta o sorriso, forçado, para não deixar que as lágrimas viessem. Recebeu um afago nos cabelos antes do pai voltar a se sentar no sofá, tossindo. Ela o analisou e um pesar a acometeu. Não queria perdê-lo... Porém, infelizmente, ele já alcançara os quarenta anos e não faltava muito tempo para o fim. Morreria em breve e todos sabiam disso.

Para afastar os sentimentos ruins e esquecer o fim, alegrou-o ao contar como foi a Seleção. Mesmo entre uma crise ou outra de tosse do pai, ela se esforçava ao máximo para parecer feliz, e ele a acompanhava, como se o próprio estado físico não tivesse importância. Afinal, nada havia que pudessem fazer a respeito.

***

Aline continuava a presenciar a conversa de Isabel com César e cada vez gostava menos de tudo aquilo. Cruzou os braços diante do peito e bateu incessantemente o pé no chão.

— Sua filha está linda — César olhou para Aline. — Mas, também, não seria para menos. É sua filha... — Isabel corou um pouco.

— Sim. Aline é minha pequena — alisou o braço da menina e depois o encarou. — Bem, precisamos ir agora, César. Foi muito bom reencontrá-lo — abraçou-o pela segunda vez, Aline estava contando.

— É sempre bom te ver. Espero que isso se repita mais vezes. Aquele último encontro foi rápido demais — acariciou-a no rosto e virou-se para Aline. — Até mais. Espero que seja uma ótima militar.

Despediu-se e afastou-se devagar. Ela olhou para a mãe, que o observava se distanciar atentamente.

— Desde quando você o conhece, mãe? — a voz saiu um pouco irritada. — E quando foi essa última vez que se viram?

— Está me vigiando, Aline? Tomando conta dos meus passos agora? — riu e começou a andar.

— Não, é que nunca soube dessa sua amizade com alguém do exército, ainda mais o capitão — correu atrás dela, que continuava levando tudo na brincadeira. — O pai sabe da sua intimidade com esse homem?

País Imerso [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora