Capítulo 44

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Assim que adentrou o quarto, Alexandre sequer cogitou descansar. Andou até a janela e abriu as cortinas, vendo o dia amanhecer. Desfazendo-se de todo o autocontrole, socou a parede em uma explosão de fúria. As lágrimas finalmente escorreram, e ele caiu de joelhos no chão com as mãos nos cabelos, sem acreditar que fora enganado todos aqueles anos.

Acreditou que estivesse fazendo a coisa certa. Os pais, ambos do exército, eram o objetivo dele. Sempre quis ser igual a eles, um militar dedicado. Alcançar o posto de capitão, igual a César, era o mínimo que esperava de si mesmo. Por isso, dedicou-se aos treinos físicos, tentando ser o melhor, mas sempre esbarrando em Aline.

Ser um militar de alta patente e exterminar o maior número de rebeldes possível eram os objetivos que o guiavam. E depois se casar e ter filhos, como toda pessoa de bem. No entanto, as coisas não caminhavam do jeito que idealizara. Seus pais eram rebeldes, Aline também; agora entendia as atitudes dela. Por que fora se apaixonar justo por ela? Chorou com ainda mais ódio e socou o chão.

Sentiu-se inútil, burro, incompetente. Acreditou fielmente em uma realidade baseada em mentiras. Lutou por um futuro que nunca poderia ter. As costas pesaram com o peso da verdade. Doía mais do achou ser possível, e as palavras de César cada vez mais penetravam em seu coração, em sua alma.

Arrastou-se dali e sentou-se na cama, apoiando a cabeça nas mãos. Ele, terceiro-sargento Alexandre Guerra, que tinha como objetivo um dia se tornar general, agora não passava de um rebelde.

***

Leonel colocou Denis na cama e saiu do quarto. Aline deitou-se ao lado do irmão para lhe fazer companhia. Com o dia amanhecendo, mesmo com a pouca luz do ambiente, via as marcas das lágrimas no rosto do menino. Beijou-o na testa, torcendo para que toda a dor da perda não fosse eterna, cobriu-o e saiu do aposento.

Encontrou Meire no corredor, e ela a chamou para seu quarto. Andando vagarosamente por causa do ferimento, seguiu-a. Ao entrar, viu Mônica sentada em uma cadeira com os machucados limpos e enfaixados. Só ali se deu conta de que ela também se machucara de alguma forma.

Heitor estava sentado na cama cuidando do próprio machucado na cintura. O do braço também já sofrera os devidos cuidados. Meire parou ao lado dela com algumas mudas de roupas nas mãos.

— Caso queira tirar essa roupa suja, devem servir em você — entregou-lhe as peças.

Agradeceu e foi para o banheiro ali dentro do quarto. Tomou um banho rápido, mais para tirar os vestígios de sangue. Refez os curativos e, ao se vestir, encaminhou-se para o andar inferior. Na cozinha, Leonel e César estavam à mesa tomando café, e ela se acomodou ao lado deles.

— Quando vamos sair daqui? — a pergunta dela foi direcionada a César.

— Não sei. Tudo ainda é muito recente, precisamos esperar a poeira abaixar. Eles procurarão por vocês e, se encontrarem, é execução na certa. Nunca desconfiarão de mim, sendo aqui o lugar mais seguro. Por isso, sugiro que se acalme e descanse. Cure o corpo e a alma. Sofra o quanto precisar pela morte de sua mãe, porque depois não terá tempo para isso.

Afagou a cabeça dela e se levantou, deixando o cômodo. Leonel continuou ali, observando o nada, e Aline direcionou-se até uma porta de vidro que dava acesso ao quintal e olhou para o horizonte. A manhã sem nuvens já se estabelecera. Pensou em Giovana e em Isabel, que não estavam ali para ver mais um dia começar. Era até injusto um dia ensolarado depois de tudo o que aconteceu. Falhara com elas e se sentia culpada pela morte de ambas, algo que carregaria para sempre.

Lembrou-se do colar que a mãe lhe dera e o tirou do bolso, no qual o colocara após o banho. Analisou o pingente de um livro aberto e um punho fechado saindo dele. Virou-o e leu na parte de trás os seguintes dizeres: Lutaremos até o fim pelo conhecimento.

Apertou-o na mão e o colocou no pescoço. Ali, diante do nascer de um belo dia, prometeu que a morte delas seria vingada. Reforçou a si mesma que derrubaria aquele sistema assassino nem que isso custasse a própria vida. Seria a melhor rebelde possível, ou pior, na visão do governo.

País Imerso [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora