Cap 2

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Desde criança a Vó Margô nos ensinou a enfrentar as consequências de tudo que fazíamos, ou assumir responsabilidades por nossos atos, entretanto, tudo que eu mais desejava naquele momento era fugir.

Ir para as colinas.

Me esconder debaixo da mesa do Senhor Bruno e tapar os ouvidos, fingir que sou invisível.

Sei lá.

Ruggero estava ali e, ao invés de sentir pânico, eu só conseguia reviver mentalmente a noite que tivemos.

− Ela é muda? – Ouvi Ruggero perguntar para o pai.

Me esforcei para não fazer uma careta.

Ele sabia que eu não era muda.

− Karol querida, está bem? – O Senhor Bruno tocou meu ombro de modo paternal, sua voz era genuinamente preocupada. – Você está pálida. Ruggero, pegue uma cadeira!

Eu queria dizer que estava bem, exceto pela parte que minha vida iria desmoronar assim que Ruggero abrisse aquela boca e falasse sobre nosso momento juntos. Daí, Mike surtaria e a tragédia iria se desenrolar.

Meus olhos – os traidores – não obedeciam a voz da razão que gritava lá dentro da minha cabeça e, contra minha vontade, eles seguiam Ruggero pela sala. Ele pegou uma cadeira.

A calça perigosamente colada em sua bunda, deixando pouco para a imaginação.

Seu olhar para mim.

O modo como colocou a cadeira ao meu lado; o jeito que seu perfume invadiu minhas vias respiratórias, me deixando sugar as lembranças e gravá-las mais firmemente na mente.

− E-eu... – Pigarreei, lembrando que tenho voz e que preciso usá-la. – Bem. Digo, bem estou. Quer dizer, estou. Estou bem. É isso.

Havia um meio sorriso dançando em seus lábios. Aquele sorriso que dizia que me desafiava, ele sabia que eu estava começando a surtar, mas queria testar até onde eu iria.

Esse maldito.

− Pai, eu acho que ela está com defeito. – Ruggero me olhou me analisando. – Será que a pilha está falhando? Ou a placa mãe está pifando? – Riu. Ele se achava muito engraçado.

Imbecil.

Um lindo imbecil.

− Ruggero, pare! – O senhor Bruno bradou, me ajudando a sentar. – Karol, não ligue para o meu filho, ele adora implicar com as pessoas. Se diverte falando besteiras.

Sim. Ele amava falar besteiras.

Passei as mãos pelos cabelos, expirei longamente.

Ruggero não iria me desestabilizar.

Ele apareceu. Ok. Podia contar tudo. Ok. Mas já fazia três anos, já tinha ficado no passado e, rezei, que ele não fosse do tipo que saia se gabando. Sendo indiscreto.

Somos adultos, afinal.

− N-não me incomoda, Senhor Bruno. – Ri, nervosa. – Está tudo bem.

Aos poucos senti que minha respiração ia voltando ao normal. Eu estava voltando para os eixos. De repente as paredes não estavam mais se fechando a minha volta e tudo ia ficando normal como sempre foi.

Tudo certinho.

A grande mesa de mogno em formato de L que se destacava na sala clara e pouco decorado do Senhor Bruno; os quadros na parede com figuras abstratas, mas que eu imaginava serem pessoas com seus corpos entrelaçados, porém nunca tive certeza.
O tapete discreto no chão, o sofá branco no canto, uma TV enorme na parede... Tudo normal.

LuxúriaOnde histórias criam vida. Descubra agora