Capítulo 3

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Havia se passado menos de vinte e quatro horas desde que César e Leonel acertaram os últimos detalhes da fuga do grupo de São Paulo para o acampamento rebelde. Aline não deixou o pai pregar os olhos até saber de todos os pormenores do que fariam, até porque ela era uma ex-militar treinada e se sentia responsável pela família. Quanto antes estivessem em segurança, melhor para todos, e principalmente para ela, que poderia respirar mais despreocupadamente e tirar o peso da responsabilidade das costas.

A primeira coisa que precisavam cuidar era da aparência, pois o país inteiro os conhecia como rebeldes procurados; o rosto, os olhos e os cabelos não poderiam ser parecidos com as principais fotos exibidas dia após dia nos noticiários. Por isso, aguardavam Meire retornar das compras.

— Ainda não entendi por que eu tenho que me disfarçar — Alexandre comentou, acomodando-se no sofá com um pote de pipoca em mãos, sem parecer preocupado com o que aconteceria. — Não sou o procurado nessa história.

Tanto Heitor quanto Mônica reviraram os olhos. Alexandre, no entanto, sequer percebeu a feição do outros, continuando a reclamar e olhar para Aline. Ela apenas suspirou antes de explicar, sem paciência:

— Você teve um envolvimento direto com todos nós, aposto que está marcado pela general Samara. E logo que você não aparecer no Complexo amanhã, vão relacionar o seu desaparecimento com a gente. Por isso, precisa se disfarçar também para que ninguém o reconheça.

Ele sorriu de canto como se estivesse satisfeito com a atenção lhe destinada. Aline estreitou os olhos, desconfiada de que ele apenas queria que lhe direcionasse a voz. Alexandre era esperto, entenderia sem esforço o motivo do disfarce.

Sem dar mais atenção desnecessária a ele, andou para lá e para cá na sala, angustiada, aguardando a chegada de Meire. Antes de ela sair às compras, discutiram sobre qual seria o disfarce mais adequado para cada um. Aproveitariam a época de frio e se vestiriam com o máximo de roupas possíveis, encobrindo o corpo, fazendo de tudo para que não se assemelhassem em nada com o que sempre foram.

No fim da tarde, o som da porta de entrada se abrindo apaziguou imediatamente o ambiente. Meire entrou com inúmeras sacolas de roupas e acessórios. César se apressou em ajudá-la com o que trouxera, preocupado com a demora da esposa.

— Que cara é essa, César? — Meire sorria, descontraída. — Estou bem, não vê? Aqueles remédios me ajudaram bastante.

Por ser do exército, mesmo que estivesse afastada, Meire ainda tinha acesso às drogas. Elas não inibiam todos os mal-estares das doenças que a atingiam por causa do fim do efeito da vacina, mas davam mais cor ao rosto antes pálido e mais energia.

— O que você trouxe, mãe? — Alexandre parou diante dela.

— Algumas coisas que vão nos ajudar bastante. Visitei o Centro Comercial Brás III. Eles têm de tudo naquele lugar, e, nessa época do ano, opção de roupa é o que não falta — dizendo isso, despejou o conteúdo no chão da sala.

Viam-se roupas dos mais diversos estilos, além de luvas e outros acessórios comuns de inverno. Começaram a revirar as peças, escolhendo o que usariam.

— Bom, vamos começar com o pequeno — Meire apontou para Denis, que se aproximou hesitante.

Meire cuidou de Denis, enquanto Mônica se divertia com a situação, adorando vestir Aline com roupas masculinas. Apesar de tudo, ficou feliz ao constatar um pouco da antiga Mônica de volta: aquela que não perdera o pai, morto pelo sistema, que não teve o namorado assassinado a sangue frio pelos militares em quem tanto confiava e que não viu seu mundo virando de ponta-cabeça ao descobrir a verdade, acabando com tudo no que acreditou durante a vida.

País Corrompido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora