Capítulo 21

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— Você está bem? — Marília a tocou no ombro.

— Não — também balançou a cabeça em negativa. — Mas pode continuar. Quero entender o porquê disso tudo — Aline engoliu em seco para se recompor e bloquear tudo que se remetesse à Giovana. Depois pensava naquilo.

— Você lembra do slogan do governo? Eles presam pela família, quanto mais filhos, melhor. Uma pessoa que não tem interesse no sexo oposto não se reproduzirá.

— Então há vários lugares como esse pelo país? — a pergunta veio de Mônica, e Marília assentiu. — Isso é surreal.

Nos últimos minutos de caminhada, Marília continuou falando a respeito do assunto. Contou como os monitores, tanto dos Campos de Alimentos quanto dos que conduziam os treinamentos físicos, eram orientados a observarem as crianças e os jovens. Se percebessem algum comportamento fora do comum, deveriam reportar ao exército, que passaria a analisar a pessoa mais de perto. Enquanto ela falava, Aline foi encaixando aquelas informações com o que tinha acontecido meses atrás.

Com o fim da trilha, chegaram a uma vila de pequenas casas de alvenaria dispostas ao redor de um descampado, formando um círculo. Muitas pessoas andavam para lá e para cá carregando algo ou com algum instrumento em mãos. A maioria era adulta e havia poucos jovens. Nenhuma criança. O sujeito mais baixo, chamado Cícero, os guiou em direção a um casarão de aspecto precário. Conforme andavam, alguns moradores os observavam passar.

Assim que pararam à entrada do casarão, Marília os apresentou para um homem que deveria ter mais do que quarenta anos. Encontrar pessoas vivendo mais do que sempre acreditou ser o limite ainda surpreendia Aline.

O sujeito chamado Nestor tinha alguns fios brancos no cabelo castanho e na barba que lhe cobria o rosto. A pele negra era mais clara do que a de Aline. Quando os olhos dele pararam nas líderes, ele sorriu largamente e pediu que entrassem ao abrir a grande porta de madeira. Iluminado apenas pela luz solar, o ambiente interno do casarão era extenso, um grande salão com pilastras segurando o teto e algumas mesas e cadeiras dispostas encostadas nas paredes. As largas janelas ou tinham vidros quebrados ou tapados com papelão. Ali dentro, por mais que não fosse um dos dias mais quentes do ano, o calor os atingiu em cheio, o que deixava o lugar abafado.

Nestor parou no centro do salão, o que os fez imitá-lo. Com isso, Aline olhou para trás e viu pessoas se amontoando na entrada. Provavelmente queriam saber quem eram e o que vinham fazer ali.

— As Villas Boas... — Nestor balançava a cabeça levemente. Cruzou os braços. — A última vez que um de vocês esteve por aqui, fui açoitado até perder a consciência.

Naara abaixou a cabeça em um silencioso pedido de desculpas e Etama encolheu os ombros.

— O que vocês querem de nós dessa vez? — Nestor respirou fundo após a pergunta como se estivesse se preparando para o que fosse ouvir delas.

— Já resumimos toda a situação no caminho até aqui para eles — Etama apontou para os rejeitados que os acompanharam. — O que nós precisamos realmente agora é banho e comida.

— Sempre direta, igualzinha sua mãe — ele sorriu de canto de boca e passou os olhos pelo grupo. — São muitas pessoas, Etama. E se estão indo para algum lugar, creio que precisarão levar suprimentos também — ela fez que sim.

Nestor massageou as têmporas, preocupado.

— O que eles nos fornecem mal é o suficiente para alimentar toda a vila. E você me pede ainda mais extras?

— Vocês têm um pasto enorme aqui, o suficiente para produzir uma boa quantidade de carne e vegetais — Etama insistia, e Aline se sentiu desconfortável com o fato de pedirem alimentos para aquelas pessoas que tinham tão pouco.

País Corrompido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora