Capítulo 26

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Saíram do galpão devagar, tomando cuidado para não serem vistos ou ouvidos. Mônica seguia atrás de Etama, que guiava o grupo apontando para onde deveriam ir. Esconderam-se atrás de uma casa, e com isso pôde ouvir com mais nitidez os gritos de Nestor, que continuava a ser chicoteado.

Viu a líder travar o maxilar antes de indicar direções para cada um seguir. Na companhia de Heitor, Mônica correu para outra casa. Ali esperaram até Etama dar a ordem. Quando ela veio, saíram correndo e atirando. Como se soubessem o que aconteceria, os rejeitados se jogaram no chão enquanto os militares pareciam tentar entender o que estava ocorrendo. Sem hesitar, ela atirou na coxa de um dos soldados que assistia à tortura de Nestor. O sujeito logo caiu para trás, e ela mirou em outro, errando quando ele se esquivou.

No entanto, aproveitando-se da distração dele, Heitor o pegou por trás, passando o braço pelo pescoço do soldado, que se debateu sem conseguir se livrar. E Mônica atirou, acertando-o na perna. Heitor o soltou, e ele caiu com as mãos no ferimento.

Pelo canto do olho, percebeu uma movimentação próxima, o que possibilitou que se abaixasse para evitar que fosse atingida pelo chicote, que passou sobre a cabeça dela. A soldado tomou impulso novamente com o braço e dessa vez acertou Etama. Mesmo sendo ferida, a líder segurou o chicote, enrolando-o na mão e o puxou da militar.

Com todos do exército rendidos, Mônica ficou ali parada admirando Etama, que disparou na mulher, atingindo-a no braço. Quando ela tombou, Etama se aproximou e passou o chicote pelo pescoço dela, enforcando-a.

— Você nunca mais vai machucar essas pessoas — e a soltou, que caiu de quatro apoios.

Mônica sorriu com a cena, satisfeita em interferir na ação do exército, que passara a simbolizar para ela o que de pior havia na sociedade. Eles assassinaram Raul e seu pai. O governo militar não só matava a população, como também a escravizava. Era nojento. Se dependesse dela, as coisas mudariam muito. Por um segundo, lembrou-se da própria família. Evitava pensar neles, pois com certeza torciam para que fosse morta o quanto antes desde que se juntara aos rebeldes. Não os culpava, eram ignorantes. Mesmo assim, lutaria para que pudessem viver mais e melhor.

Juntou-se aos demais quando começaram a desarmar os militares e a amarrá-los. Com a ajuda de Sandra, Levi tirou Nestor do tronco e o colocou sentado no chão. Ana já olhava as feridas dele.

— Quem são vocês? — quis saber a militar que Etama amarrava os pulsos.

— Não é da sua conta — colocou-a em pé.

— São rebeldes — ela cuspiu as palavras com nojo, o que fez Etama lhe acertar a cabeça com uma coronhada.

Mônica observou a vila, vendo os rejeitados felizes com a ação. Um calor lhe tomou o peito, trazendo além da satisfação a felicidade. Contudo, logo suspirou com pesar e olhou para o horizonte. A preocupação agora era com Aline. Onde ela estaria?

***

Precisou repetir mais de uma vez para Alexandre que estava bem. Mesmo não convencido, afastou-se dela, que pôde ver como ele tinha o rosto marcado da briga que travara com o militar. Como o próprio machucado parara de sangrar, usou a camiseta dele, uma parte que ainda estava limpa, para lhe secar o sangue que escorria do lábio inferior. Ao terminar, deu-lhe um selinho.

— Estamos bem — sorriu de canto.

— Sim, estamos — ele lhe segurou a mão, acariciando o dorso. Pensativo, olhava para baixo.

Como se soubesse o que ele pensava, comentou:

— Fomos muito imprudentes. Eu não deveria ter te trazido para cá assim. Não sei onde estava com a cabeça.

— Em mim — e riu. Ela o empurrou com a mão e tentou evitar o sorriso, só que falhou. — Mas tá tudo bem — tocou-a na bochecha. — Eu deveria ter pensado melhor também, não me deixado levar.

— Tomaremos mais cuidado na próxima vez — levantou-se e o segurou pela mão, ajudando-o a ficar em pé.

Catarina e Eric os esperavam com os militares prontos para voltarem à vila e lhes entregaram os tênis. Ao começarem a andar, notou que Alexandre mancava, mas ele logo disfarçou quando percebeu o olhar. Para não se preocupar com aquilo, até porque ele era bem resistente, parou ao lado de Eric. Trocaram poucas palavras, o suficiente para ele contar que Naara vira o caminhão chegando e aqueles dois entrando na floresta. Na mesma hora se preocupou com Leonel e Denis, sentindo o coração apertado. Deveria estar lá para protegê-los.

— Por que vocês vieram para a vila antes do previsto? — ela perguntou ao militar que levara um tiro.

O rapaz de rosto suado e com expressão de dor comprimiu os lábios e desviou a vista. O ímpeto de lhe acertar um soco para que falasse se apossou dela, fazendo-a fechar os punhos. Contudo, repreendeu-se no instante seguinte. Não estava mais no exército, não era uma militar.

Limitou-se a andar pelo caminho que haviam feito e apanhar as armas dos soldados. Por mais que quisesse saber mais detalhes, entender por que estavam ali, deixou de lado. Quando chegassem à vila, pensaria junto do grupo como deveriam proceder em relação aos militares.

Ao se aproximarem da vila, apenas Catarina prosseguiu para averiguar como as coisas estavam lá, pois era a única que não estava sendo caçada pelo exército. Poucos minutos depois, retornou na companhia de Naara, que sorriu largamente para Aline.

— Não suma mais desse jeito, por favor — tocou-a no ombro, e Aline assentiu.

No caminho que os separavam das casas da vila, a líder contou o que havia acontecido ali e que felizmente tinham conseguido prender os militares.

Quando os rejeitados os viram chegar, vieram em direção aos soldados e os levaram para o centro da vila, colocando-os junto dos demais capturados. Ali, vendo que tudo estava bem, pôde respirar aliviada. Isso até avistar Leonel correndo até ela.

O pai a abraçou e disse o quanto ficara preocupado. Ao se afastar, analisou-a de cima a baixo, e uma ruga se formou na testa dele. Depois, virou-se para Alexandre com a mesma expressão.

— O que aconteceu, Aline? — o tom de voz dele tornou-se subitamente sério.

Ela apenas suspirou, sem saber como começar a explicar.

País Corrompido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora