Capítulo 22

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Aline não quis mais olhar nada por ali. O peito doía ao imaginar a dor daquelas pessoas. Por amarem quem não deveriam segundo o sistema, tinham sido arrancadas da própria vida e jogadas ali para trabalharem sem receber nada e ainda serem castigadas. Sentia nojo do exército, do governo comandado por eles, do presidente e de todos que apoiavam aquilo.

Enquanto andava, sem enxergar os arredores, prometia a si mesmo que daria um jeito no país, faria de tudo para que mais nada daquilo acontecesse. Protegeria os mais necessitados com todas as forças e recursos possíveis.

As emoções só se abrandaram quando viu Denis sentado no chão diante de uma casa brincando com um gato. Na porta da residência, Leonel conversava com Ana e com uma mulher mais velha que ele. Assim que o irmão a viu, pegou o animal no colo e levou para perto dela.

— Olha só que fofinho! — abraçou o gato, encostando o rosto no do animal.

— Vai devagar, Denis — tirou-o das mãos do irmão e lhe acariciou a pelagem amarelada. — E como você está?

— Não tô mais fedendo e comi bastante — passou a mão na barriga, o que a fez rir.

Devolveu para ele o gato e se aproximou do pai, que passou o braço pelos ombros de Aline e a abraçou. Ainda recebeu um beijo dele na cabeça.

— Antes que você pergunte, estou bem — ele se virou para Ana. — Diga a ela.

Ana riu e fez que sim com a cabeça.

— Melhor impossível — confirmou Ana. — Preciso ir agora, ver como está o Caio — acenou e se afastou.

A mulher que se apresentou como Cora trouxe uma cadeira para Aline, que agradeceu e se sentou ao lado dela e de Leonel. Observavam em silêncio Denis brincar com o gato. Mais uma vez, perdeu-se em pensamentos, que ora transitavam nos próprios sentimentos confusos por não se encaixar em heterossexual ou homossexual, ora na vida sofrida dos rejeitados.

— Vocês devem partir amanhã, creio — comentou Cora, e Aline assentiu. — Estou torcendo para que tenham êxito naquilo que estão fazendo. Quem sabe um dia possam nos tirar daqui.

— Esse é o objetivo — garantiu. — A própria Etama me disse isso.

— Que bom — sorriu. — Nestor chegou a comentar comigo que os pais de Etama e Naara mantinham relações conosco, e os líderes antes deles também. Pelo que sei, éramos nós quem dávamos as informações antes do sistema de infiltrados começar — esclareceu. — Só que o aumento da vigilância dos militares dificultou o contato e por isso nos afastamos. Mas acredite, só não somos mais aliados porque não conseguimos. Só podemos nos afastar até certa distância da vila — acariciou o pescoço, bem em cima do chip. — Isso tudo precisa acabar...

Concordou ao notar a frustração na voz dela.

— Se depender de mim, vamos tirar vocês daqui o quanto antes — ao encará-la, Cora agradeceu com o olhar.

Para aproveitar o dia ali, procurou interagir com os moradores e aprender o modo de vida deles. Na companhia de Mônica, percorreu a vila sendo guiada por Douglas. Visitou as plantações destinadas ao rejeitados e as das cidades, muito maiores e com mais variedades de alimentos. Foi até o pasto ver o rebanho, e ali ficou sentada na sombra, observando. Como era um dia atípico, Douglas comentou que decidiram não trabalhar, já que seriam saqueados mesmo. Riram e se deitaram sobre a grama.

Ele contou um pouco sobre si. Disse ter vinte e cinco anos e estar há seis na vila. Foi pego pelo exército em um dia que estava indo para o trabalho. Na época, já havia percebido que não se interessava por mulheres e se questionava a respeito disso.

País Corrompido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora