Memória e mentira

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Izuku esfregou os olhos no meio da aula de história, em um esforço para prestar atenção no que o professor falava. Já fazia quase uma semana desde que tinha saído do hospital, mas o único contato que podia dizer ter tido com Shoto era a vista de sua silhueta algumas cadeiras à frente durante o período letivo. Não que o estivesse evitando de propósito, mas parecia que sua cabeça não funcionava direito quando estavam no mesmo ambiente.

Por outro lado, o outro rapaz calmamente copiava o conteúdo do quadro para o caderno. Izuku apoiou os cotovelos na mesa. Daquele ângulo, não conseguia dizer o que ele poderia estar pensando quando ajeitou alguns fios brancos para trás da orelha.

Até esse ponto, já tinha começado a duvidar da própria memória, porque quase não conseguia mais se lembrar do momento em que tinha acontecido aquele... Bem, ele podia chamar aquilo de beijo, certo? Não que a ideia de um mal entendido não lhe tivesse passado pela cabeça, mas para todos os efeitos, a situação estava sendo o suficiente para dar trabalho constante aos seus neurônios.

— Midoriya-san — A voz do professor preencheu a sala. Imediatamente o rapaz deu um salto, soltando um grunhido que mal podia considerar como resposta. Por quanto tempo estivera perdido nos próprios pensamentos? A voz que continuou foi dura: — Se não está se sentindo bem, pode passar na enfermaria, mas por enquanto é melhor se esforçar para acompanhar a aula.

Concordou com a cabeça, envergonhado, antes de se desculpar. Um olhar em volta e toda a sala, que havia se virado para encará-lo, agora sussurrava alguns comentários divertidos aqui e ali. Todos menos ele. Shoto continuou casualmente escrevendo alguma coisa no caderno, como a cena anterior se não fosse de seu interesse. Izuku suspirou por um momento em que ponderou se essa não era a melhor coisa a se fazer, afinal. Pelo menos até suas cabeças esfriarem.

Depois que a aula acabou, enfim era o horário de almoço. Juntou-se à Iida e Uraraka no corredor, como fazia costumeiramente, e encontraram com Asui perto da entrada do refeitório, onde pararam um segundo para conversar.

— O que aconteceu com você esses dias? — Ouviu Iida indagar quase como se fosse o próprio professor. — Já é a terceira chamada em aula que recebe e quase se deixou ser capturado de forma boba no último exercício. Eu sei que as provas intermediárias estão chegando, mas você realmente deveria dar uma pausa, caso algo o esteja afetando.

— É verdade. — A voz preocupada de Uraraka soava bem mais séria do que o usual.  — Deku-kun parece um pouco cansado e distraído esses dias. Tem se sentindo mal?

— A-ah, não, t-t-tudo bem. — Respondeu os colegas com certo receio, antes de forçar um sorriso e coçar a cabeça, admitindo. — É que eu não tenho dormido direito desde que voltei para o alojamento. Acho que aquele vilão me afetou mais do que eu podia imaginar...

Não era de todo mentira que o incidente da semana anterior o estivesse preocupando, principalmente porque a investigação não parecia chegar a lugar nenhum, mas preferiu omitir a parte do hospital. Por agora, o melhor que deveria fazer era se esforçar e parar de incomodar os amigos. Reafirmou que estava bem algumas vezes enquanto compravam o lanche até sentarem na ponta de uma mesa comprida, onde outras pessoas da turma já estavam comendo.

Jogar conversa fora era relaxante, de certa forma. Jirou revirou os olhos quando Kacchan começou a se irritar com Kirishima sobre o jeito certo de acender uma fogueira com ferramentas e quando Izuku se meteu para contar sobre a viagem escolar para a montanha que fizeram com a escola primária, a bronca se voltou contra ele.

— Ah Todoroki-kun! — Yaoyorozu fez um movimento pequeno com a mão e todos se viraram na direção do rapaz que agora estava em pé próximo à mesa, segurando uma sacola — Não quer sentar com a gente?

A história de nós doisOnde histórias criam vida. Descubra agora