CATARINA

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   Na segunda-feira eu cheguei na aula super atrasada, sempre que Louise não dormia em casa eu perdia a hora já que ela era meu próprio alarme matinal. Quando entrei a professora vazia a chamada e para minha sorte ela falava o nome da menina que vinha antes de mim:
-Carolina Maia!
Enquanto ela anotava a presença da garota, eu voei até minha cadeira.
-Catarina Aires!
-Presente, professora! _Disse, e logo me virei para Louise, estávamos sem nos ver desde sábado de manhã e sempre tínhamos assuntos para colocar em dia. -Como foi seu fim de semana na casa do nerd, "estudaram" muito?
-Estudamos, até demais! _Ela disse, fazendo uma careta.
-Era pra estar feliz então!
-Não Cat, nós realmente passamos o fim de semana todo estudando!
Não me contive e explodi em uma risada, que foi julgada pelo olhar fatal da minha professora.
-Não teve graça nenhuma... _Ela resmungou. -E você, como foi o tempo sem mim?
-Eu fui na casa do Miguel. _Disse, precisava resumir os assuntos já que a professora já estava na letra L da chamada.
-Presente! _Louise disse, respondendo a chamada mas sem desviar o olhar acusador de cima de mim. -O que você foi fazer lá? não vai deixar esse cara em paz?
-Fui por motivos de força maior, o funcionário que estava me ajudando a entender dos assuntos administrativos da empresa desistiu de mim, dai Roberta disse que eu precisava dar o meu jeito de aprender, e o Miguel é fera nesses assuntos!
-E como você sabe disso?
-Porque ele me disse na nossa conversa no pátio, enfim, eu fui até lá pedir ajuda e ele super topou me ensinar algumas coisas.
-Eu não sei porque mas minha intuição me diz que você vai se meter no que não deve, esse cara caiu de paraquedas na sua vida, deveria ser menos impulsiva e ficar longe dele, mas o que você faz? se mete na casa dele!
-Você acha que ele é um assassino? pedófilo? um apreciador de camisas pólo? não, não mesmo, isso ele não é! _Eu disse, me lembrando do estilo largado - até demais - que ele tinha.
-Tanto faz Cat, você nunca me escuta mesmo, só depois que está metida em confusão que vem correndo pedir minha ajuda e querer saber o que os astros me dizem!
-Começou a astrochata! _Ironizei, abrindo meu caderno.
Senti a caneta de Louise voar até a minha cabeça, e com uma careta eu a joguei de volta para ela.
Depois da aula enquanto descia com Louise até o pátio, vi Miguel sentado na escada parecendo distraído com mais contas complexas.
-Olha quem está ali, seu mais novo professor. _Lise comentou.
-Não sei se gosto do tom de deboche... _Resmunguei. -Me espera lá no carro que eu já vou, só vou marcar com ele um horário para aulinha de hoje. _Disse, imitando o tom de deboche dela.
-Não demora, estou morrendo de fome!
Observei Louise se afastar e então desci as escadas e parei em frente a ele, um degrau abaixo.
-Ei, você! _Chamei sua atenção, e vi quando ele encarou meus sapatos e depois levantou o olhar até o meu rosto.
Ali com o sol refletindo nele, eu fui atingida de novo por um tipo de frenesi ao olhar seus olhos verdes e profundos, e precisei de alguns segundos para me recompor.
-E aí, riquinha!
Fiz uma careta, como era de se esperar.
-Eu estou indo pra casa, queria saber se não quer uma carona. _Me ouvi dizer, mas eu nem estava pensando em dizer aquilo, e não sei porquê o fiz.
-Agradeço, ainda preciso esperar um dos meus professores chegarem para entregar uns trabalhos atrasados, então devo demorar mais um pouco por aqui.
-Ah tudo bem, então nos vemos mais tarde, que horas posso aparecer lá no seu apartamento?
-Fica de olho na minha varanda, geralmente quando estou lá significa que tenho um tempo livre dos estudos.
-Parece que agora eu serei sua stalker! _Brinquei.
-Eu nunca fui seu stalker. _Ele disse, parecendo incomodado com o comentário.
-O-k! eu ainda não tenho tanta certeza disso, foram muitas coincidências, mas vou te dar esse voto de confiança.
-Não pedi voto nenhum, você quem não larga do meu pé desde que descobriu que eu era o dono da jaqueta misteriosa. _Resmungou.
-Você tem um péssimo senso de humor, está explicado porque gosta tanto de números e contas...
-Estou prestes a desistir de ter você no meu apartamento por tanto tempo.
-Não, tudo bem, eu vou parar de te encher, nos vemos mais tarde mal humorado.
Ele me lançou uma careta e um hangloose, o que me deixou inquieta já que eu pensava que o hangloose estava extinto desde 2012.
Enquanto caminhava até a saída, vislumbrei Jonas encostado no portão me encarando, estranhei o fato dele estar ali já que raramente me buscava na escola, porque de acordo com ele as garotas ficavam muito "em cima".
-Ei, o que faz aqui? _Perguntei, me aproximando para beijá-lo, mas ele se esquivou. -O que foi?
-Você é inacreditável. _Ele murmurou, bufando e me dando as costas.
Confusa, eu o segui pela rua, e parei por um instante fazendo um sinal para que Louise mandasse o motorista esperar mais um pouco.
-Jon, o que aconteceu? _Indaguei, falando mais alto enquanto atravessávamos a rua em direção ao carro dele.
Ele se encostou no carro e passou o polegar nos lábios, o que fazia quando estava com raiva ou incomodado, e percebi que ele fazia muito aquilo no tempo em que passávamos juntos.
-O que aconteceu?! eu vim até aqui para me desculpar pelo modo como agi com você na última vez que nos vimos e vejo você me fazendo de idiota mais uma vez com aquele imbecil!
-Eu não entendo, está falando do Miguel?
-Por que? tem outros também? _Ele perguntou, como se eu fosse uma vagabunda, o que me deixou profundamente sentida, não deveria me importar, mas foi inevitável.
-Você está insuportável com esse ciúmes bobo.
-Eu não preciso sentir ciúme, ainda mais de você, mas o mínimo que gostaria era respeito pela nossa relação, ou você acha que as pessoas não comentam sobre você estar entrando no apartamento de um desconhecido, ou passando seu tempo na escola com esse mesmo cara?
"Ainda mais de você", não sei o que ele quis dizer com aquilo, e nem tinha vontade de descobrir, já estava magoada o suficiente.
-Eu vou pra casa, você está desequilibrado e falando um monte de merda desnecessária, de novo! _Virei as costas, mas senti a mão dele apertar meu braço e forçar a minha atenção outra vez.
-Não quero mais continuar tolerando suas imaturidades, Catarina. _Ele disse, me soltando assim que eu me virei para olhar pra ele.
-O que está insinuando? _Perguntei, temerosa de sua resposta.
-Exatamente o que parece, estou terminando com você.
-A gente não precisa terminar assim, Jonas, só precisamos conversar e tentar ajei...
-Eu não quero mais, quando a minha mãe disse que eu precisava tentar namorar você, achei que fosse saber lidar com o fato de me relacionar com uma garota mais nova, mas não sei.
-Espera aí, como assim a sua mãe disse para que namorasse comigo? _Questionei, mais alto do que gostaria.
-Não queria que soubesse disso, mas essa é a verdade, você deu um grande engajamento para a minha marca de roupas quando começou a trabalhar com a gente, minha mãe achou que namorar você fosse me colocar na mídia, e como você era bonita e bem vista eu não vi problema em tentar.
Senti meu ar faltar por alguns instantes, eu não conseguia acreditar no que ele tinha acabado de dizer com a maior cara lavada. Ele tinha me usado, e agora estava jogando aquilo na minha cara para me magoar ainda mais. Eu tinha duas opções, chorar ali e continuar me humilhando ou fazer o que eu fazia de melhor: engolir a dor e retribuir a dor.
-Então está me falando que só namorou comigo porque não era interessante e capacitado o suficiente para se manter na mídia sozinho? não se sente envergonhado de falar isso em voz alta? _Eu disse, rindo, e quase podia sentir um gosto amargo na minha boca. -Você é mais patético do que pensei que fosse.
Observei ele arfa e gaguejar antes de rebater as minhas palavras.
-É claro que eu sou capaz, mas se eu podia ser visto na mídia e ainda ter um corpinho bonito ao meu lado, por que não?
-Você não convence nem a si mesmo com esse discursinho fracassado. _Falei, suspirando e jogando o cabelo para o outro lado. -Olha Jonas, eu espero que arranje outra pessoa que te deixe se escorar nela para chegar ao topo, por que sinceramente? olhando pra você agora, não consigo ver capacidade alguma, e é triste saber que nem mesmo a sua mãezinha acredita no seu potencial.
-Sua vadi...
-Isso, se humilhe mais, mas não esquece que eu sou engajada demais e algum paparazzi pode estar nesse exato momento escondido e gravando tudo para colocar na página de fofoca do jornal de amanhã. _Rebati, antes que ele terminasse seu insulto.
Lancei um beijinho no ar e virei as costas, ouvindo ele me xingar e bater a porta do carro com força. Sentia como se tivesse uma bola de gude presa na minha garganta, me impedindo de engolir, meu peito queimava, e eu não sabia dizer se era de ódio ou decepção.
Cheguei até o meu carro, Louise estava com uma cara feia de quem tinha esperado bastante. Entrei em silêncio e fechei a porta antes de desabar em lágrimas.
-Você está chorando? _Louise perguntou, surpresa.
-A senhorita está bem? _O motorista perguntou, virando-se para o banco de trás.
-Eu estou ótima, apenas nos leve para casa. _Disse, secando as lágrimas com o dorso da mão.
-O que aconteceu, Cat?
Senti a mão de Louise no meu braço e depois no meu queixo, me fazendo olhar para ela.
-Jonas terminou comigo. _Murmurei.
Ela ficou me encarando boquiaberta por alguns segundos.
-Como ele pôde? por que fez isso?
-Disse que estava cheio de ter que aturar minhas imaturidades e de acordo com ele eu estava o fazendo de idiota e dando mole para o Miguel na frente de todos...
-Isso é um absurdo, você jamais trairia ele.
-Mas se eu soubesse do que sei agora... eu teria fincado um milhão de chifres naquele idiota. _Vociferei, sentindo as lágrimas voltarem novamente.
-Soubesse o quê? _Ela indagou, secando algumas lágrimas do meu rosto com o polegar.
-A mãe estúpida dele o instruiu a namorar comigo para que ele alavancasse os negócios, eu basicamente servi de escada para o sucesso dele.
-Que babaca! E ele admitiu isso na sua cara? 
-Sim... mas eu também não deixei barato, e as coisas que eu disse pra ele não são nem o começo, eu não o fiz ser mais engajado? pois então agora ele vai ser ainda mais conhecido... só não garanto que ele vá gostar da fama.
-Você está com aquela cara de vilã de novela mexicana, o que está pensando em fazer? _Ela questionou.
-Você vai ver, eu só preciso de mais algumas horinhas de choro e então eu enterro tudo o que sentia por ele, e posso focar na minha pequena vingança. _Disse, assim que o carro estacionou na garagem.
  Após duas horas trancada no quarto chorando copiosamente, estava pronta para pôr meu plano de vingança em prática. Mandei uma mensagem para Romain - meu estilista pessoal - e após explicar meus planos, e pedir para que ele apenas confirmasse a minha história inventada, ele concordou prontamente, como eu já esperava. Enquanto estava no jardim mandando mensagens para os jornalistas locais que eu conhecia, vislumbrei Miguel na varanda de seu apartamento, e foi então que me lembrei que teríamos nossa primeira aula hoje. Ele me viu e acenou, e depois fez um gesto para o pulso, como se eu estivesse atrasada, mesmo que não tivéssemos marcado hora. Observei rapidamente minha roupa, meu vestido estampado não era exatamente um look que eu gostaria para minha primeira aula, mas como eu aparentemente já o tinha feito esperar bastante, não quis subir e me arrumar só para atravessar a rua e ter umas aulas chatas. Miguel me lançou uma careta assim que me viu atravessar a rua, eu mostrei a língua e segui em direção a entrada do prédio.
-Boa tarde, dona Catarina! _O porteiro disse, sorridente ao me ver entrar.
-Boa tarde, seu Roberto, eu vim visitar o morador do 27. _Falei, apertando o botão do elevador.
-Ah fique a vontade, mas desculpe perguntar, a senhora sente-se bem?
-Hmm, me sinto sim, obrigada por perguntar. _Murmurei, confusa, mas enfim o elevador se abriu.

Aquela jaqueta de couroOnde histórias criam vida. Descubra agora