No dia seguinte acordei com as batidas na porta do meu quarto, não conseguia nem abrir os olhos, minha cabeça latejava e até mesmo o barulho dos passarinhos pareciam ser gritos estridentes no meu ouvido.
-Entra! _Murmurei, com o edredom cobrindo a cabeça.
-Garota, achei que estivesse morta, sabe que horas são? _Louise perguntou, e ouvi as cortinas se abrirem e antes que eu pudesse me preparar ela tirou o edredom de cima de mim. Agora eu sabia como os vampiros se sentiam ao serem brutalmente expostos à luz do sol.
-Vaca... _Resmunguei, observando ela sentar no baú ao pé da minha cama.
-O que é isso? _Ela perguntou, apontando para a faixa no meu tornozelo, que eu havia colocado ontem a noite, na verdade eu nem lembro em que momento coloquei aquilo.
-Eu torci o pé ontem, não foi nada demais, mas na dúvida preferi colocar esse negócio, não quero estar mancando na minha festa.
-Como isso aconteceu? Miguel me disse que te traria até aqui, pelo visto você deu trabalho!
-Ele trouxe, mas eu meio que fiz uma pequena birra e acabei caindo...
-Caiu ou fingiu que caiu só pra ele ter que te carregar até aqui? _Lise indagou, fazendo uma cara engraçada.
-Idiota, eu caí mesmo! a última coisa que eu gostaria era de colocar aquele cara aqui dentro de novo. _Falei, me levantando e indo até o banheiro.
-Sei... devia ver como ele ficou quando te viu beijando outro cara.
-Ele ficou bem irritado, tivemos um breve papo ontem a noite antes de eu jogar mais um balde de gelo nele.
-Você jogou um...
-Não! é só uma... metáfora?! que seja... foi uma expressão. _Dei de ombros, enquanto massageava meu rosto com creme.
-Eu sei que está chateada com ele, e entendo perfeitamente, também fiquei decepcionada quando soube de tudo, mas eu acho que ele gosta de você de verdade, não foi fingimento.
Suspirei, voltando para a cama e me sentando.
-Eu não duvido que ele goste de mim, mas isso não o impediu de mentir, de fingir, de enganar... gostar não resolve a vida de ninguém, o que eu mais prezava nele era a sinceridade, como ele parecia verdadeiro... e descobrir que ele é justamente o oposto me faz pensar que não o conheço, não foi por essa pessoa que me apaixonei.
-Talvez devesse dar uma chance de conhecê-lo de verdade agora que já sabe de tudo.
-Aí é que está, eu não sei de tudo! ele ainda está me escondendo alguma coisa... e eu só dou uma chance de me magoarem como ele fez, segundas chances são para pessoas estúpidas.
-Tudo bem, eu só acho que está sendo muito dura com ele, e com você também.
-Dura?! eu não estou fazendo metade do que geralmente faço quando as pessoas brincam comigo, e você sabe disso!
-Isso é verdade, você não é uma vaca mas..
-Sei ser uma. _Completo, fazendo uma careta.
-Pois é! _Fala, pegando o meu celular que estava jogado no tapete. -Estava pensando na sua festa, já recebeu uma resposta daquele buffet que entramos em contato?
-Não faço ideia, mandei um email mas não chequei ainda.
Louise entrou no meu email e resolveu o que tinha pra resolver, enquanto eu entrava em contato com um dj conhecido da cidade, ele era o melhor e com certeza ia querer ele na minha festa.
-Acho que não falta nada, o pessoal da ornamentação disse que vai chegar aqui na sexta de manhã.
-Ótimo, eu já mandei que fizessem meu vestido, devem entregar logo, também chamei a Pam, aquela cabelereira que sempre vinha fazer o cabelo da Roberta, ela é incrível, porque pra cuidar daquele loiro platinado da minha madrasta... tem que fazer milagre!
Ficamos mais alguns minutos falando sobre a festa que aconteceria na sexta-feira a noite e depois aproveitamos o domingo para nos bronzear na área da piscina e fofocar sobre os acontecimentos da noite anterior.
Dois dias se passaram, era terça à tarde quando vi um táxi parar em frente à mansão. Roberta estava com os cabelos mais curtos, a pele bronzeada e carregando mais malas do que quando viajou há meses atrás.
-Querida! _Ela disse, com um sorriso de orelha a orelha ao me ver descer as escadas em direção a sala. -Você está ainda mais linda do que me lembro!
Eu nunca tinha duvidado dos sentimentos de Roberta por mim, e ela nunca tinha fingido nada, sempre deixou claro que me amava, mas não como mãe, se tem uma coisa que ela sempre deixou claro era de que não tinha nascido para a maternidade.
-Pensei que fosse chegar só amanhã. _Falei, a abraçando.
-Eu antecipei o meu voo, é uma semana importante pra você, queria acompanhar tudo de perto.
-Claro, e como foi de viagem? _Perguntei, enquanto me sentava, a observando abrir uma das malas.
-Foi sensacional, juro que se não estivesse estudando teria mandado que fosse me encontrar, você teria passado dias enfurnada nas lojas incríveis de Madri!
-Tenho certeza que sim!
-Mas como não pôde estar comigo, eu te trouxe alguns presentinhos de aniversário. _Falou, estendendo três sacolas douradas na minha direção. -Também trouxe presentes para Louise e para Tina, elas vão arrasar!
-É muita gentileza sua! _Digo, dando uma breve olhada dentro das sacolas. Ao menos bom gosto ela tinha.
-Estou exausta, mas depois que eu tirar umas boas horas de sono, quero que me conte tudo sobre os últimos meses, principalmente sobre a formatura, os preparativos para festa de aniversário e também quero saber das reuniões para a posse da presidência!
-Bom, espero que suas horas de sono durem pelo menos uns dez anos então. _Falei, revirando os olhos e jogando a cabeça no estofado do sofá.
-Senti falta do seu senso de humor! _Disse, rindo e se levantando. -Vou para o meu quarto, peça para que levem o resto das malas para cima, por favor, senhorita engraçadinha.
-Sim senhora! _Digo, imitando um soldado. -A próposito, gostei do cabelo estilo Willy Wonka, espero que tenha uma fábrica de chocolate em uma das suas malas gingantes.
-Eu odeio você, Catarina! _Ela gritou do alto da escada, e então rimos juntas.
Passei o resto do dia na rua com Louise, fui tirar as últimas medidas do meu vestido, que a propósito eu mesma desenhei e pedi para que a costureira o fizesse, depois nós duas entramos e saímos de lojas cheias de novas roupas e sapatos, sabia que logo Louise seria aceita em uma faculdade, apesar de doidinha, ela sempre foi muito inteligente, e bom, essa era a minha última semana como uma jovem desocupada, logo eu passaria os meus dias dentro de uma sala, em frente a um computador estúpido.
Quando chegamos em casa já era noite, e assim que entramos sentimos o cheiro delicioso da comida de Tina. Depois de eu repetir dois pratos de lasanha e brigar com Tina por ter me feito sair da dieta, subi para o meu quarto, me preparando para a conversa com a minha querida madrasta. Para minha sorte Roberta entrou no quarto dela naquele dia e não saiu mais, então nossa conversa acabou ficando para o dia seguinte.
Na quarta-feira me levantei mais cedo que de costume, tinha hora marcada com a minha esteticista e depois iria na manicure, e isso já era motivo para eu acordar feliz e ansiosa. Tomei um banho, fiz minha skin care matinal e escovei os cabelos. Enquanto passava meu hidratante corporal, ouvi as batidas na porta e me apressei em procurar um roupão decente, mas antes que eu terminasse de me vestir Roberta já tinha entrado no quarto.
-Geralmente quando batem na porta as pessoas costumam aguardar uma confirmação para que entrem... _Murmurei, saindo do closet.
-Não preciso disso, você é minha enteada querida! _Disse, observando o quarto e em seguida sentando na minha cama. -Vejo que mudou as cores das cortinas, e temos algumas decorações novas por aqui.
-É, alguma coisa eu tenho que ser capaz de mudar e escolher na minha vida, não é?! _Alfinetei, passando por ela e me encostando no batente da porta da varanda.
-Não acredito que mesmo faltando apenas alguns dias para sua posse você ainda não se conformou com a ideia!
-Eu nunca vou me conformar, Roberta.
-Pelas últimas informações que tive você parece estar progredindo, tem se saído bem nas reuniões.
-E quem te deu essas informações? o seu jovem aprendiz espião?
Roberta mudou de expressão, parecia confusa com o que eu tinha acabado de perguntar, mas nós éramos parecidas até no talento para atuar, ela não ia me enganar com aquela carinha de sonsa.
-Espera, que espião? do que está falando, sua doida?
Tive que rir, ela realmente ia insistir com aquele teatrinho. Antes que eu pudesse voltar a falar, vi Miguel aparecer na varanda do apartamento e olhar para mansão, antes que ele pudesse me ver, entrei no quarto.
-Faça-me o favor Roberta, eu descobri que mandou que um cara me espionasse enquanto estava fora, e não só isso, também fez com que eu o procurasse para ter aulas de administração, e não acharia estranho se também estiver pagando para que ele more do outro lado da rua, por que sinceramente? ele não tem dinheiro para pagar nem um mês de aluguel daquele apartamento.
Roberta levantou e continuou com a mesma fisionomia confusa, mas agora ainda me olhava como se eu fosse louca.
-Catarina, eu não faço a menor ideia do que você está falando, eu não mandei cara nenhum espionar você, e nem toda essa loucura aí que disse!
-Roberta, eu sinceramente nem queria conversar sobre isso com você agora, mas essa sua ideia estúpida me causou muita coisa! _Disse, encarando a blusa de Miguel, sim, a blusa que eu usava quando saí da casa dele naquela noite ainda estava comigo, eu simplesmente não conseguia devolvê-la, era a única coisa que eu ainda tinha dele.
-Será que está me escutando?! _Ela questionou, estalando os dedos. -Eu não fiz nada disso, se eu tivesse feito diria sem problema, sabe que não faço nada pelas costas de ninguém, o que eu tenho que fazer eu faço, não mando que façam por mim!
Encarei ela por alguns segundos, realmente Roberta não fazia o estilo mentirosa e ela era ousada o suficiente para me contar tudo caso fosse mesmo a pessoa que contratou Miguel. Mas se não era ela, então quem era?!
-Isso não faz sentido... você é a única pessoa que faria isso. _Murmurei, me sentando na cama.
-Não sei se devo ficar ofendida por isso, mas a verdade é que não tenho nada a ver com essa história, inclusive preciso que me conte mais sobre isso, não quero ninguém perseguindo você, com certeza esse cara inventou uma historinha e você caiu!
Será que ela tinha razão? e se Miguel tivesse mesmo inventado aquilo só para tirar o dele da reta? talvez ele fosse mesmo um maníaco e tivesse inventado tudo para que eu não o denunciasse. Todos esses questionamentos fizeram meu estômago revirar, senti todo o peso no meu peito voltar com um novo ímpeto, mais forte, mais arrasador.

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Aquela jaqueta de couro
RomansaCatarina Aires mora em Blumenau desde que nasceu, é herdeira das empresas de sua família, escrava de uma posição que não quer ocupar e correndo um risco que desconhece, a jovem impetuosa será salva por um motoqueiro misterioso, o que ela não sabe é...