Mas um novo dia, mesmo assim...

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É aos nove anos que Shouto se liberta daquela casa.

Ele se lembra de acordar para ver a parede mofada e sem janelas do que então era o apartamento de seu irmão. A mobília era mais do que simples, apenas a cama e uma velha cômoda no canto oposto do pequeno ambiente.

Ele sentia o cheiro leve de mofo dominado por algo que ele pensava ser alvejante (Shouto conhecia o cheiro de alvejante mais do que qualquer outro afinal). A única fonte de luz presente no ambiente era a lâmpada velha sobre sua cabeça, parecendo prestes a queimar, que oscilava frequentemente mesmo que oferecesse luz de uma maneira suave. Os cobertores sobre ele estavam longe de serem novos ou mesmo os mais conservados, mas mesmo assim proporcionavam mais conforto para o menino do que os que ele tinha em casa...

Não, se ele se lembrasse corretamente, aquela seria sua casa agora. Se tudo que passava por seus olhos naquele alucinante loop desde que acordara há poucos segundos não fosse sua mente, incrivelmente catatônica, pregando peças em si, então ele poderia realmente se atrever a acreditar que estava livre.

Shouto queria mais do que tudo que chegasse o dia que se esqueceria da sensação dos futons de Endeavor.

Foi hesitantemente que ele colocou as pernas para fora do colchão, sentindo o frio que dominava fora do casulo na cama. Ele notou então a camiseta grande demais que vestia e perguntou-se, sem realmente se importar, quando que foi banhado e trocado.

Shouto lembrava-se apenas vagamente de sua chegada ali, as informações a cada segundo mais conexas do que antes. Todo o mais era formado por borrões e imagens imprecisas, sendo completamente dominado pelo esgotamento e exaustão, mas o trajeto não era realmente importante, Shouto pensou. Não havia perspectiva mais confortável do que o ato de ter seu perdido irmão tirando-o do lugar que fora seu inferno compartilhado. Independente de qualquer escassez mais do que óbvia ao apenas olhar o ambiente em que estava, Shouto não poderia negar o conforto de saber que não seria ferido. Ele se sentiu mais seguro então do que em qualquer outra situação se a sensação em sua cabeça fosse qualquer indicativo de quão profundamente ele havia dormido.

Havia um par de pantufas grande demais esperando ao lado da cama. Tão velha, mas bem conservada quanto o demais dos itens ele sentiu-se cômodo de colocá-lo nos pés e seguir em direção a porta que estava apenas levemente encostada (ou a tentativa de uma, visto que aquela parede parecia apenas ser formada por algum tipo de divisória barata, nada que seu pai aprovaria, definitivamente). Ao sair do quarto Shouto sentiu o cheiro de ovos sendo fritos e, finalmente, teve um vislumbre do exterior a partir de uma pequena janela no outro lado do ambiente.

A porta levava para um lugar (um pouco) mais amplo do que onde estivera. Ele podia ver agora um sofá antigo de couro encostado em uma das paredes e também a pequena cozinha improvisada onde o adolescente cozinhava. Touya sentiu sua presença imediatamente, levantando o olhar de sua preparação.

"Hey pirralho." Foi praticamente a primeira coisa que ele escutou de seu irmão em mais de dois anos (sem contar as palavras apressadas que trocaram enquanto Shouto sentia-se como uma poça de gosma no chão) e isso quase levou Shouto á lagrimas. A emoção de reencontrá-lo quase não conseguia superar o pavor de não reconhecê-lo.

A pessoa a quem aquela voz pertencia estava com metade de seu rosto permanentemente queimado e, mesmo sob as folgadas roupas, Shouto podia facilmente ver a trilha de cicatrizes que se espalhava e se perdia sob as camadas de tecido. Havia estranhos pinos que, mais do que servirem como algum estranho tipo de estética, obviamente estavam mantendo sua carne junta e os vermelhos cabelos de Enji haviam dado espaço para o negro.

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⏰ Última atualização: Aug 03, 2020 ⏰

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A crueldade em meu mundo (o amor sob suas pálpebras).Onde histórias criam vida. Descubra agora