XIX

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Kösem havia amanhecido com um bom humor difícil naqueles dias em Topkapi, especialmente estando em guerra contra a valide, mas seu bom humor tinha uma razão muito simples havia chegado a resposta a sua carta que enviou secretamente a Zagan Halil paxá, seus olhos brilhavam excessivamente, ele havia reunir-se em segredo no palácio de mármore. Ele era um vizir respeitado, e se Süleyman paxá caísse, seria ele quem assumiria o cargo de acordo com os antigos costumes.

Seu momento de alegria foi interrompido quando viu uma menina correndo e se jogando aos seus pés agarrando-se as vestes da sultana. Gül ağa se aproximou para tentar tirar a menina ruiva dali, mas Kösem não permitiu, fez um gesto para que o eunuco continuasse onde estava.

— Sultana, imploro que me mande de volta aos meus pais. Eu não pertenço a este lugar. — disse em espanhol, e Kösem a encarou com uma certa empatia, deixou que a menina chorasse sobre seu vestido enquanto suplicava pela liberdade.

Tocou a cabeça da menina com delicadeza, e esperou que está a olhasse com seus olhos vermelhos de tanto chorar. Uma jovem espanhola, que devia ter sido criada de acordo com os costumes católicos até aquele dia.

Ergueu o rosto dela, tocando delicadamente em seu queixo com as pontas dos dedos, ela havia sido lavada e agora Kösem podia ver com mais clareza a beleza angelical da menina. Estreitou os olhos um pouco, se a valide tivesse batido os olhos na ruiva teria enviado-a aos aposentos do sultão sem nem pensar duas vezes.

As lágrimas escorriam aos montes pelo rosto da jovem, o que lhe fez lembrar de Yelena, suspirou e repousou sua mão sobre o colo e encarou a menina com uma certa gentileza e lhe disse em espanhol:

—Esqueça de onde veio, agora pertence a este palácio, e se te comportar e me jurar lealdade prometo que as coisas serão mais fáceis para você — seu tom era gentil e amável, disfarçando a ameaça que provinha daquelas palavras. 

— Mas, senhora, eu não desejo viver aqui.

— Escute, eu também não desejava este lugar, mas agora é tudo o que tenho assim como você. Está no harém de sua majestade, o sultão, e se quiser sobreviver neste lugar precisará de mim. Eu sou a única que pode lhe garantir um futuro. — tocou a bochecha da menina e a acariciou com o polegar. — Tem a beleza de um anjo... De agora em diante seu nome será Meleksima. Agora vá, Nurhan hatun irá lhe mostrar suas nova função neste harém.

Fez um gesto, Nurhan tomou a jovem pelo braço e a levou para longe da sultana. 

— Gül ağa, prepare-se, temos que visitar uma pessoa muito importante. — disse levantando-se para ir até a lareira, não era tonta, não permitiria que a valide tivesse provas as quais pudesse usar para distorcer seus atos.

Encarou as chamas que iam consumindo o papel aos poucos, um sorriso surgiu em seu rosto, só a expectativa de ter um aliado pelo qual a valide sultana jamais esperaria fazia Kösem vibrar de emoção. 





Um biombo havia sido colocado na sala pequena e com pouca iluminação, eram regras que toda sultana deveria seguir, não deveria mostrar seu rosto a estranhos, mesmo que estes fossem paxás. Escutou a porta abrir e fechar, os passos de Halil paxá não eram muito silencioso, ela sabia que ele era quase um homem de meia idade, contudo, fora isto não sabia mais nada sobre ele e sua aparencia – o que não era muito importante.

— Halil paxá, chamei-o aqui para discutirmos sobre um inimigo em comum, a sultana Râbi'a. Sei muito bem que ela foi a culpada por evitar que o senhor se tornasse Grão-vizir do império, o que fez para que a valide tivesse tanta raiva de você, paxá? — perguntou olhando para a silhueta do homem através das frestas do biombo de madeira, voltou a olhar para frente aguardando uma resposta. 

Halil paxá parecia estar procurando pelas palavras certas, então antes que ele pudesse responder, Kösem fez questão de dizer o que ele tanto tentava esconder.

— O senhor tinha as provas contra a sultana a respeito da morte misteriosa do irmão mais velho de sua majestade, que na época era candidato a herdeiro da coroa. O şehzade Mustafa também era seu discípulo, e o senhor o amava como um filho, por que tinha uma paixão secreta pela sultana Handan, estou certa?

— Sultana o que está dizendo é...

— A verdade, Halil paxá, contudo não vou condená-lo por isso. Eu quero lhe oferecer o que tanto busca a anos, uma vingança contra a sultana Râbi'a, o qua acha?

— Sultana, creio que vingar-se da valide sultana é uma tarefa impossível ela é uma mulher muito poderosa. Tentei muitos anos e falhei. — disse com um certa desesperança na voz, mas a risada de Kösem chamou sua atenção. — O que é engraçado sultana?

— A sua falta de coragem, paxá. Como um homem que enfrentou milhares de guerras ao longo de todos esses anos, tem medo de uma mulher velha e doente? — O levantar de cabeça do paxá deixou claro que não sabia daquela parte. — Ah sim, a sultana Râbi'a está doente, e posso lhe oferecer o que tanto deseja, ter a sultana ajoelhada aos seus pés lhe implorando perdão por ter tirado a vida do şehzade e de sua filha Ayla, e lhe condenado a uma vida de sofrimento.

— Se posso perguntar, como planeja fazer isso?

— Não é algo que deva saber ainda, deve me jurar lealdade antes, e me provar que é um homem leal, lhe direi. E não só isso, o cargo de Grão-vizir será seu. Aguardo sua resposta paxá até o fim deste mês. 

Kösem deixou a sala pela porta que estava ao seu lado, estava com um enorme sorriso no rosto, sabia que o homem não resistiria a sua proposta, o que lhe garantia olhos e ouvidos dentro do conselho privado. Meter-se na politica era só mais uma das peças que precisava para ter todo o império na palma de sua mão, já não tinha o dom de ler o destino em suas mãos, mas mantinha o dom da visão. E o que via era um destino glorioso para si. 













___________¥Curiosidades¥___________

Um vizir era um ministro e conselheiro de um xá e, posteriormente, de um monarca de um país islâmico. O vizir fazia a ligação entre o monarca e os seus súditos – função parecida com a de um primeiro-ministro. O termo significa "ajudante". Durante o Império Otomano, o Grão-vizir  era a mais alta autoridade depois do sultão, sendo considerado representante deste e atuando em seu nome. Estava hierarquicamente acima de outros vizires de menor rango que se reuniam na Sublime Porta do Palácio de Topkapi, em Istambul.

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