30 de Setembro de 1967
O Festival começaria em uma hora. Em pé do lado de fora do estúdio de gravação, Caetano tentava respirar, não que estivesse nervoso, mas o ambiente de entrevista seguida de entrevista o deixava incomodado.
Ele pensava em tudo que acontecera até chegar aqui, ainda se lembrava do dia em que deixara a Bahia para acompanhar Bethânia em sua série de apresentações no Rio de Janeiro. Após seu primeiro disco com Gal, resolvera inscrever uma de suas composições no festival e aqui estava.
Caetano que vivera toda a vida na Bahia, ainda não tinha se acostumado com São Paulo. Frequentemente se sentia sozinho na cidade, ainda estranha para ele, muitas vezes a música era sua única companhia. Tinha escrito muito nos últimos meses, mas participar de festivais não estava em seus planos. Foi pego de surpresa ao saber que teria de alugar um blazer para a ocasião.
Caetano sentiu uma brisa fria contra o rosto, mas quando pensou em voltar para dentro, se deparou com um rapaz saindo do estúdio. Era Chico Buarque, se lembrava de ter visto ele pela primeira vez cantando em um show do Teatro Paramount, dois anos atrás. Precisava admitir, tinha ficado encantado como ele trabalhava a letra e a melodia da música. De lá pra cá, viu Chico em outros eventos, mas nunca conversou com ele, Caetano pensou que não parecia do tipo que falava muito.
Olhava com interesse o rapaz que usava um elegante smoking e gravata borboleta, um pouco antiquado para o festival daquele ano. No entanto, Caetano pensou que ele ficava muito bem no terno.
Ele observou com mais atenção e percebeu que Chico estava suando frio. Conhecendo sua fama de tímido, o festival deveria ser um desafio, o que não era de se esperar do último vencedor do programa, refletiu. Caetano queria ajudá-lo e sem pensar duas vezes, foi em sua direção.
O rapaz estava distraído, suas mãos trêmulas procuravam algo no bolso, até encontrar um maço de cigarros vazios.
- Droga... - Chico suspirou frustrado.
- Aqui. - Caetano disse, oferecendo um cigarro. Chico assustou um pouco com a voz repentina e lhe dirigiu um olhar surpreso. Ele definitivamente estava muito tenso. Caetano observou seus olhos azuis ainda fixos nele, e pensou que o rapaz era muito bonito.
- Parece que você adivinhou meus pensamentos. - Sorriu sem jeito e pegou o cigarro com a mão ainda trêmula.
- Também fugindo dos jornalistas?
- É, mais ou menos isso. Acho que meu problema é muito mais com o palco. - Respondeu enquanto acendia o cigarro.
- Sério? Pensei que alguém como você, quero dizer, todas as apresentações e o programa com a Nara, já teria se acostumado.
- Bom, se você tivesse visto o programa acho que não diria isso. - Brincou, sem olhar para Caetano.
Caetano riu, satisfeito que Chico começava a relaxar um pouco. Realmente não tinha assistido o programa, mas agora se lembrara de uma crítica que havia lido. No jornal que anunciava o fim do programa após 6 meses, chamavam Chico e Nara de "desanimadores de auditório".
- Depois de dois anos ainda não me acostumei ao palco. Quando tenho um show à noite, passo o dia agitado e entro em cena apavorado. Na televisão é ainda pior, é tudo muito artificial. Acho que nunca vou me acostumar com isso. - Suspirou, olhando para baixo enquanto falava.

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Amor mais que discreto
Fanfiction"Mas pode dispensar a fantasia O sonho em branco e preto Amor mais que discreto Que é já uma alegria" Caetano conhece Chico no Festival de MPB de 1967, logo essa amizade se desenvolve em algo mais. Entretanto, que futuro poderia ter o relacionamento...