Tatuagem

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Janeiro de 1971

Caetano tinha chegado no Rio de Janeiro, alguns amigos fizeram uma pequena festa para recebê-lo, mas de todas aquelas pessoas, quem ele mais queria ver não estava ali. Já fazia quase um ano desde que tinha visto Chico pela última vez em Londres e estava ansioso para reencontra-lo.

Caetano se afastou, na tentativa de procurar por Chico. Ele olhava em volta.

"Procurando alguém?" - Caetano ouviu aquela voz que gostava tanto no pé do ouvido.

Caetano sorriu largo, se virando para encontrar Chico atrás dele. Ele estava tão diferente, seu cabelo mais longo dava lugar a cachos e um bigode discreto. Não menos bonito do que antes, muito pelo contrário, Caetano pensou.

"Não, já encontrei exatamente quem eu queria."

Caetano não pode resistir ao impulso de abraçar ele ali mesmo.

"Eu nem acredito que você tá aqui!" - Chico sorriu, abraçando Caetano de volta e até tirando ele do chão um pouco e girando, não ligou que alguém pudesse vê-los. Chico acariciou o cabelo de Caetano, estava tão longo agora.

"Tava com tanta saudade." - Caetano se afastou para olhar para Chico, dava para ver o brilho em seus olhos. O cabelo diferente e o bigode fazia parecer que tinha passado mais tempo do que realmente tinha passado. - "Cê tá diferente."

"Diferente bonito, eu espero." - Chico riu.

"Claro, você ficaria bonito de qualquer jeito." - Caetano sorriu. - "Vem cá."

Caetano puxou a mão dele um pouco para que o seguisse. Chico entendeu o recado e esperou que Caetano tomasse alguma distância para segui-lo e não parecer tão óbvio que tinham saído da festa juntos.

A brisa da noite mal tocou o rosto de Chico, e Caetano estava pressionando ele contra a parede mais próxima. Caetano colocou a mão na nuca de Chico, trazendo para um beijo necessitado.

"Por que você demorou tanto?" - Caetano perguntou entre beijos, sentindo Chico envolver sua cintura.

"Eu queria ter ido te encontrar no aeroporto, mas Bethânia disse que provavelmente estaria cheio de jornalistas." - Chico olhou para Caetano, seus rostos estavam a centímetros um do outro, enquanto respiravam pesado.

"Vamo sair daqui." - Caetano sorriu, deixando mais um selinho nos lábios de Chico.

"Não vai ser muito óbvio? Você desaparecendo na sua própria festa, com todas essas pessoas aqui?" - Chico riu.

"Eu não quero ficar com todas essas pessoas, eu quero ficar com você."

*

Chico traçou uma linha de beijos pelo abdômen de Caetano, deitado na cama com um cobertor até a cintura. Eles tinham feito muito amor antes, já estava bem tarde, e embora Chico soubesse que deveria ir, naquela noite ele só queria Caetano.

"Meu Deus, eu senti muito a sua falta." - Chico disse, subindo mais beijos até o pescoço de Caetano.

"Dá pra perceber." - Caetano sorriu largo, envolvendo os braços em torno do pescoço de Chico. - "Eu também tava morrendo de saudade, amor."

"Que bom que você voltou..." - Chico deu um selinho nele. - "Aqui não faz o menor sentido sem você."

Caetano sorriu, roçando o rosto contra o de Chico e atraindo para um beijo lento. Eles se separaram com alguns selinhos delicados. Então Chico descansou a cabeça na curva do pescoço de Caetano, que passava os dedos pelos cabelos dele.

"Não sabia que seu cabelo era cacheado." - Caetano sorriu, olhando para Chico. - "Eu gosto, combina com você."

"Você acha? Então vai ficar assim." - Chico roçava o nariz no pescoço de Caetano, sentindo seu perfume e envolvendo sua cintura. - "Queria tanto que você pudesse ficar."

"Eu também, fico perdido em Londres sem você." - Caetano ficou sério e fez questão de ressaltar. - "Ainda mais sabendo todos os problemas que você vem tendo com a censura."

"Ah, Caê, não vamo falar disso agora..." - Chico levantou, se sentando na cama.

"É sério, Chico! Tenta pegar leve. Fico preocupado com você..."

"Me censurando agora também?" - Chico sorriu, puxando ele para um abraço. - "Isso é jogo baixo."

"Não tem graça." - Caetano disse sério, se afastando de seu toque.

Chico suspirou.

"Tá bem, eu vou tentar tomar mais cuidado."

"Promete?" - Caetano voltou a olhar para Chico.

"Só se você me der um beijo." - Chico diz, o que faz Caetano sorrir.

"Você é mesmo um aproveitador, não é?" - Caetano se move para cima do colo de Chico e se inclina para beijá-lo.

"Tá bem, eu prometo." - Chico sorriu largo. - "Acho que você poderia conseguir qualquer coisa de mim assim."

"Não me diga..." - Caetano riu. - "Talvez eu devesse começar a usar isso a meu favor."

"E depois o aproveitador sou eu, né?"

Caetano riu, passando os braços em torno do pescoço de Chico e trazendo para outro beijo. Quando se separam, Chico distribui beijos entre o canto dos lábios e a orelha de Caetano. Com a sensação do bigode de Chico roçando em seu rosto, Caetano não pode evitar de rir um pouquinho.

"Posso saber o que é tão engraçado?" - Chico sorriu, olhando o rosto de Caetano.

"Desculpa, é que..." - Caetano riu. - "Acho que eu nunca vou me acostumar com esse bigode."

"Nisso eu posso dar um jeito..."

"Não... Não, deixa assim. " - Caetano segura o rosto de Chico. - "Tá bonito, de verdade!"

"Você é engraçado..." - Chico riu.

Porém o sorriso de Caetano diminui lentamente, ele olha para Chico e passa os dedos pelo cabelo dele.

"Vou pra Bahia amanhã."

"Mas já?" - Chico olhou triste, mas compreendia Caetano, havia outras pessoas de quem ele sentia falta. - "Não pode ficar mais um pouco?"

"Eu vou passar no Rio de novo, antes de voltar pra Londres." - Caetano acariciou o rosto dele. - "Por que não vem pra Salvador comigo? A gente podia passar um tempo juntos."

"Sabe como eu queria, mas não posso, Caê... não ainda."

"Então pelo menos dorme aqui."

Chico sorriu largo.

"Tem certeza que Bethânia não vai se importar?" - Considerando que Caetano estava passando esse tempo no apartamento de Bethânia.

"Não, ela provavelmente vai ficar até mais tarde na festa."

"Sendo assim..." - Chico sorriu, derrubando Caetano no colchão. Os dois riram. - "A gente ainda pode aproveitar bastante."

Caetano sorria, seus cachos espalhados pelo lençol. Chico olhava ele por cima. Amava o sorriso dele. Como o canto de seus olhos ficavam marcados e todos os dentes apareciam. Então seu rosto se tornava todo sorriso.

"Alguém já te disse que você tem o sorriso mais lindo de todos?" - Chico se inclinou para olhar ele de perto.

"Alguém já te disse que você soa como um bajulador?"

Os dois riram. Chico beijou o rosto dele.

"Mas é verdade!"

Chico descansa o rosto na curva do pescoço de Caetano de novo, agarrado à cintura dele.

"Pode cantar pra mim?"

Caetano sorriu, deixando um beijo na testa dele.

"O que você quer que eu cante?"

"Qualquer coisa. Eu só gosto de ouvir a sua voz."

Caetano cantou baixinho perto do ouvido de Chico, algumas músicas de João Gilberto, porque sabia que ele gostava. Brincou com os cachos dele, enquanto sentia ele acariciar lentamente sua coxa. Não demorou e Chico adormeceu nos braços de Caetano.

"Queria ficar muito tempo assim." - Caetano sussurrou, antes de fechar os olhos também.

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