Amor mais que discreto

O Ciúme

Depois daquela visita traumática ao Brasil, Caetano voltou para Londres. Onde permaneceu por pouco mais de um ano, na tentativa de fugir da perseguição e até de seus próprios sentimentos. Porém, Chico nunca saiu da sua cabeça.

                                          *
Março de 1973

Caetano estava no Rio de Janeiro de novo, já fazia mais de um ano que havia voltado para o Brasil. Tinha passado a maior parte de seu tempo na Bahia, evitando uma certa pessoa. Porém, quanto tempo isso poderia durar?

Haveria uma festa da gravadora, Caetano não sentia a menor vontade de ir, mas Gil tinha insistido. Então Caetano ligou para Dedé e a convidou para ir, ela não recusou nem aceitou, disse que talvez, que iria pensar. Porém, era óbvio que Dedé não iria e apenas tinha dito aquilo para não magoá-lo. Eles tinham combinado de "dar um tempo", mas geralmente as pessoas sabem quando um casamento acaba. Não houve nenhum motivo em particular, as coisas simplesmente não funcionavam mais entre eles. Caetano achava que ela tinha encontrado outra pessoa, mas não a culpava já que Chico continuava a ocupar sua mente 24h por dia. Então talvez fosse bom para ele sair com alguns amigos e esfriar a cabeça.

Caetano mal chegou na festa e seus olhos encontraram Gil e Gal conversando em uma mesa. Caetano acenou para eles e foi na direção deles. Porém, quando caminhava até os amigos um grupo de crianças corria pelo salão, brincando, e uma delas tromba em Caetano.

"Opa, tenta tomar mais cuidado, mocinha." - Caetano agacha e dá um sorriso simpático, segurando levemente os braços da garotinha que não tinha chegado a cair.

A menina ergue o rosto para olhar para ele e levanta as sobrancelhas com uma surpresa que parecia achar Caetano a coisa mais inesperada do mundo.

"Você é o cara da TV!"

Caetano riu.

"É, eu apareço na TV às vezes."

"Papai sempre fica estranho quando te vê na televisão."

"Como assim estranho?"

"Ele diz que não, mas eu acho que ele fica meio triste."

Nesse momento, Caetano franziu a testa.

"Espera, qual seu nome?" - Caetano perguntou hesitante.

"Silvia" - A garotinha sorriu.

Caetano tinha lido aquele nome em muitos jornais, agora tudo fazia sentido.

"Você é fi-"

Então Caetano ouviu aquela voz que reconheceria em qualquer lugar do mundo.

"Silvinha, eu já disse pra você não desaparecer assim..." - As palavras se perdem no ar quando os olhos de Chico param em Caetano.

"Caetano?"

Seus olhos se encontraram. O cabelo de Chico estava um pouco maior do que a última vez que se viriam, mas não tanto quanto o de Caetano, além das costeletas e o mesmo bigode de antes.

Caetano se levanta, enquanto Silvinha corre para perto de Chico, cutucando sua perna insistentemente.

"Pai, é o cara da televisão! É ele!"

Chico pisca, sendo tirado de seus pensamentos e olha para a filha.

"E-eh, eu tô vendo..." - Chico ainda estava meio aéreo com aquela surpresa. - "Silvinha... Por que você não vai brincar mais um pouco antes de irmos?"

Caetano olhou a menina se afastar. Como não tinha notado antes? Havia algo em seu rosto que lembrava Chico, talvez o sorriso.

"Puxa vida..." - Caetano olhou para Chico. - "Então agora eu sou o cara da TV."