CAP 39

1.1K 171 7
                                    

Respiro fundo algumas vezes e desprendo minhas mãos das de Mor, caminho em direção ao corpo, parece um cachorro muito grande e desproporcional, ouço Sebastian me avisando para ficar longe, mas Mor o para.

A cada passo me forço mais para respirar, meus braços parecem colados ao meu tronco, enfim tomo de toda minha coragem para sentar ao seu lado.

Seu rosto é grande e sua boca está perigosamente aberta enquanto respira, seus olhos estão molhados, deve estar sentindo tanta dor.

Aos poucos vou aproximando minhas mãos, fecho bem meus olhos e o ar quase me escapa quando sinto a pelugem entre meus dedos, repito pra mim mesma que é apenas um animal ferido, imagine que é apenas um animal ferido e isso vai acabar logo.

Demora um pouco mais do que eu gostaria, mas eu sinto. O calor que transborda até minhas mãos, uma sensação de paz me consumindo, é quente e boa de sentir e enfim ela acaba, solto o ar que nem sabia que segurava.

Abro os olhos e a criatura começa a se debater, Mor me puxa para trás enquanto me levanto e aos poucos vejo o pelo, boca e membros, antes desproporcionais, diminuírem e aos poucos parecer mais com uma pessoa.

Sebastian corre e joga sua capa grossa sobre ela antes de a levantar. Nós o seguimos logo atrás.

A porta se abre assim que chegamos e Sebastian adentra para por Clarisse na mesa da cozinha.

Mor me leva a seu quarto e me deixa lá enquanto volta aos outros para ajudar com os ferimentos.

E eu fico.

Parada no meio desse grande quarto, tentando digerir informações que ainda não compreendo totalmente.

.........

- por favor_ dizia uma garotinha com roupas sujas e esfarrapadas enquanto se mantinha em pé a frente da porta do padeiro esperando por qualquer alimento, que não foi vendido a dias, fosse lhe doado.

- vamos saía, não a nada para gente como você aqui, está afastando meus fregueses com seu cheiro!

Estava ficando cada vez mais difícil conseguir a boa vontade das pessoas, crianças só ganham coisas quando são bonitas, e mesmo sendo, estar toda suja de lama não a ajudava a mostrar isso.

A garotinha até mesmo cogitou o senhor da esquina que a chamava para sua casa lhe prometendo comida, mas as sombras que o cercavam a assustava demais para aceitar.

Já não sabia mais quantos dias faziam desde que fugiu de seus guardiões, sentia saudades da casa quentinha e a mesa farta, mas não poderia mais ficar lá.

.......

- no que está pensando? _fui tirada de meus pensamentos com Mor entrando no quarto.

- minha infância _respondo enquanto abraço mais forte meus joelhos.

Mor faz uma cara de pena, foi rápido, mas pude vela, essa visão de mim deve ser lamentável.

- quer falar sobre? _ela se senta na cama ao meu lado.

Olho para ela por um momento, seu sorriso é terno, gostaria de ter tido isso naqueles dias.

Suspiro olhando para as paredes do quarto, a madeira escura fazendo o quarto parecer ainda mais sombrio.

-naquele tempo eu não tinha uma casa pra me abrigar, ou comida todos os dias, ou mesmo uma família, era apenas eu e muitas vezes me sentia sem chão, sentia que seria varrida a qualquer momento e nada que eu fizesse mudaria isso. _sinto meus olhos lacrimejar. - eu tinha tanto medo, tanto...e hoje me senti assim novamente...eu...achei que tinha deixado isso pra trás.

Mor põe a mão em meu ombro e eu simplesmente desabo, como se segurasse o mundo nas costas eu apenas choro, até não poder mais enquanto ela me abraça sem dizer nada.

 A Amante Da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora