27. Anabel

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A tarde foi muito agradável, nós cantamos Parabéns e os gêmeos ficaram encantados com toda a atenção que receberam.
Noah acabou aceitando bem o fato de Marcus estar ali, mesmo um pouco tímido ainda.

No final, ajudei minha mãe com o lixo e nos despedimos com abraços.

Como fui no meu carro até ali, tive que ir dirigindo até o prédio onde moro para deixá-lo no estacionamento, além de pedir que o porteiro guardasse minhas flores até minha chegada. LeBlanc insistiu para darmos uma volta, todos juntos.

— Onde a gente vai, mamãe? – Alicia indaga, curiosa, enquanto prendo-a na cadeirinha.

— Não sei ainda, meu bem.

Sorrio para Noah que já está acomodado e seguro, dando a volta no carro para me sentar no banco do passageiro, ao lado de um Marcus calado.

— Estamos prontos – digo.

Ele dá a partida no carro e deixamos o prédio, parecendo saber para onde vai. Não faço nenhuma pergunta, apenas deixo que nos leve para onde quer que seja.
A viagem não é muito longa, o trânsito está razoável, mas meus filhos e eu tivemos tempo de apreciar as paisagens.

Agora, estamos no Brooklyn, e não é um lugar que costumo visitar, para ser sincera. Quando o carro para, olho ao redor e vejo que estamos perto do Times Out Market, na região do DUMBO, dentro da Empire Stores. O lugar é grande e charmoso, com estilo industrial, assim como grande parte dos food halls de Nova Iorque. Costuma ser cheio de turistas, ainda mais em um dia como hoje.

— Vamos lá – diz, Marcus, descendo do carro.

Faço o mesmo e tiramos as crianças do banco de trás. Eles ficam curiosos quanto ao local, olhando para todos os lados de um jeito engraçado.

Entramos no estabelecimento, que como imaginei, está cheio. Marcus conversa com um homem que parece já conhecê-lo. Somos guiados para o quinto andar, no terraço, e para minha surpresa, está vazio. Fico desconfiada de que tenha um dedo milionário nisso.

A vista para Manhattan é incrível, principalmente agora, com uma noite linda e estrelada, e toda a iluminação da cidade.

Nos acomodamos em uma das mesas, um garçom fica de prontidão, esperando pelos nossos pedidos.
Escolho algo mais leve para mim e para as crianças, que estão agitadas em conhecer um novo lugar. Sorrio enquanto ouço os sussurros dos dois, e olho de relance para Marcus, que está me observando.

— Do que está rindo? – Pergunta, com uma sobrancelha arqueada.

— Não está vendo a empolgação dos dois? – Aponto para os gêmeos, que ainda estão em uma pequena bolha de animação e cumplicidade. — Estão amando.

— E você?

Coloco meus cabelos para trás, tirando os fios do rosto.

— É um lugar muito bonito, mas imagino que não seja tão tranquilo assim.

— O dinheiro faz tudo – responde.

— Mas não precisava gastá-lo com algo tão banal. Podíamos ter ido para qualquer outro lugar, não que eu esteja reclamando, gostei muito da vista. – Sorrio.

Ele continua me encarando, deixando-me totalmente sem jeito. Cruzo as pernas para diminuir a excitação que começa subir por elas, lembrando dos meus filhos que estão bem aqui, alheios a nós dois.

— Mamãe, podemos correr aqui? – Indaga, Noah, sorridente.

— Sim, desde que tenham cuidado. Fiquem perto da mesa, por favor.

Eles acenam, saindo para fazer alguma brincadeira de criança. Respiro fundo, seguindo-os com os olhos só para ter certeza de que vão ficar bem.

— Você é uma ótima mãe.

Solto um riso, relaxando um pouco na cadeira. Às vezes, tudo o que eu gostaria é que o tempo não passasse e que os gêmeos não crescessem, não se tornassem adultos, não fossem para longe dos meus cuidados. Mas não tenho controle sobre isto.

— Eu faço o que posso para ser mãe e pai deles. Tenho medo de não ser boa o suficiente – admito.

— Não, você é amorosa, paciente, tem pulso firme. Realmente admirável.

Dou de ombros, sorrindo, grata pelo elogio. É bom ouvir isso, às vezes.

— Tem planos de ter mais filhos?

Sua pergunta me pega totalmente de surpresa, não que eu nunca tivesse pensado nisso, mas não esperava que fosse perguntar.

— Quando me casei, gostaria de ter três. Era apaixonada pelo Thomas, então fazia muitos planos com ele. – Solto um riso, balançando a cabeça. — A verdade é que ele era péssimo. Depois de um tempo, quando tivemos certeza de que minha gravidez seria saudável, ele parecia pensar que aquilo me manteria ao lado dele, independente de qualquer coisa.

— E aquilo que o Noah disse?

— É isso que você está pensando. – Afirmo.

Vejo seu rosto ficar tenso, como se quisesse fazer alguma coisa muito ruim.

— Ele não se importava se o próprio filho estava vendo tudo, simplesmente me agredia por qualquer motivo. Eu ficava desesperada, com medo do Noah tentar me defender e levar uma surra – murmuro, com o choro entalado na garganta.

Escondo o fato de Thomas ter tentado me matar, não acho necessário alimentar ainda mais a raiva evidente em sua expressão.

— O filho da puta chegou a...

— Ele fez de tudo, Marcus – interrompo sua pergunta óbvia. — Tudo de ruim que passar pela sua cabeça.

Seu punho fechado cai sobre a mesa, e sei que quer socar algo, alguém para ser mais exata. Mas essa pessoa está morta.

— É por isso que pretendo pensar muito antes de ter outro filho – continuo, — não quero fazê-lo passar por algo assim de novo.

Ele fica pensativo, olhando algo além de mim, perdido em sua própria cabeça. Agora, vendo-o tão vulnerável, sinto que esconde um passado tão perturbador quanto o meu. Posso ver sua angústia, seus medos, sua queda.

O que havia acontecido com ele?

Talvez eu nunca soubesse a resposta para isso.

— Também tenho medo de ser um pai ruim, e é por isso que não pretendo ter nenhum filho. Nenhum outro.

Fico com um aperto no peito, pensando no bebê que perdeu, junto com sua esposa. Deve ter sido horrível, mas era óbvio que tinha algo mais.

Então, de repente, meu corpo inteiro congela. As batidas do meu coração se tornam frenéticas com o pensamento que passa pela minha cabeça.

Puta merda!

— Está tudo bem? – Pergunta, de cenho franzido.

— Sim. – Sorrio. — Só pensando em como somos pessoas quebradas.

Não menti, mas também não disse a verdade.

As crianças voltam quando a comida chega, e por mais que eu estivesse rindo e me divertindo com eles, não conseguia parar de pensar em uma coisa.

×××

Marcus decidiu não subir, foi direto para sua casa depois de deixar os presentes. Nos despedimos apenas com palavras, eu não queria confundir os gêmeos ainda mais, caso presenciassem um beijo.

Eles se jogam no sofá e eu finjo tranquilidade, indo até a cozinha. Aproximo-me do calendário grudado à geladeira e corro meus olhos pelos dias, choramingando quando destaco a página de agosto.

O mês simplesmente voou, e estamos quase encerrando setembro!

Minha menstruação está atrasada!

A injeção está atrasada!!

Puta merda, Ana! – Sussurro para mim mesma.

LIBERTE-MEOnde histórias criam vida. Descubra agora