Capítulo 75

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Violet estava inquieta desde que se despedira de Livia e mais ainda depois de Sam sair desembestado atrás dela e de voltar tão desolado, que se trancou em seu quarto e não quis falar sequer com as pessoas que estavam lá para ajudá-lo. Ela se retirou discretamente para os fundos da casa dele, deixando Oliver brincando com Jackson e Ashley, que aparentemente estava tão apaixonada pelo garotinho quanto pelo rapaz.

Ela sentou em um degrau e começou a roer suas unhas, sua perna batia de cima para baixo, na tentativa de externar um pouco da sua energia. Não estava tão quente, mas ela estava com calor.

Sofia chegou pouco tempo depois. Ela havia subido atrás de Sam assim que ele chegara e não viu quando Violet se retirou para ao fundos. Assim que desceu, começou a procurar por ela.

-Violet? O que está fazendo aqui sozinha?

-Ah, nada...- rapidamente, ela controlou a sua perna e parou de roer as unhas- Como está o Sam?

-Péssimo.- ela estranhou o comportamento da esposa, mas não queria forçá-la a dizer, então apenas sentou-se ao lado dela- Eu não sei o que rolou entre eles lá, mas não foi bom.

Violet assentiu, não tinha muito o que dizer. Ela esperou que Sofia saísse dali, mas isso não aconteceu, acabou que também conseguiu se segurar por muito tempo e logo estava roendo as suas unhas de novo.

-Amor, você está bem?- Sofia colocou a mão na testa dela, não havia febre- O que deu em você?

Violet fez uma expressão de frustração e rendição.

-Droga... Eu não devia te contar isso, eu não devia contar a ninguém, na verdade, não é meu segredo, mas eu não estou conseguindo ver o que está acontecendo e ficar parada, e-eu tenho que te contar...

-Me contar o quê?

-Sofia...- ela respirou fundo- Tem uma coisa que você precisa saber sobre a Livia.









A situação não era a mesma de oito anos antes, mas Sam se sentia tão idiota naquele momento quanto em outrora. Desta vez era diferente, pois ele sabia, de modo tão certo quanto o fato de que o sol vem de dia e lua, à noite, que Livia iria embora assim que a situação difícil com Jane terminasse, de um modo ou de outro. Então, como ele pôde se apegar a ela novamente?

O problema era que, desta vez, não tinha uma viagem para a Carolina do Norte esperando por ele na outra semana e não tinha como ele deixar a vila tão rápido. Além do mais, se na outra vez tudo o que ele queria era não ter Jane por perto, nesta ele daria a sua alma para ouvir a vozinha fina e doce dela mais uma vez.

Ele estava deitado em sua cama, tentando não desabar por alguma dessas razões, apenas olhava para o seu teto e mexia na manga do seu paletó jogado ao lado. Ele sabia que as pessoas estavam no andar de baixo, mas não imaginou que alguma subiria, por isso, sentou-se em um movimento brusco quando a porta foi aberta sem que a pessoa se importasse sequer em bater.

-Sam, tem uma coisa que a Violet precisa te mostrar!- Sofia adentrou o quarto, puxando a outra mulher pelo braço, para que ela andasse mais rápido. Havia urgência em sua voz e incredulidade em sua expressão.

-T-tudo bem...- ele ajeitou o cabelo, a posição em que estava na cama devia tê-lo bagunçado- Aconteceu alguma coisa? Tem algo de errado?

Violet suspirou, envergonhada e hesitante. Quando conversou com Sofia, ela achou que receberia uma sugestão e que a atitude a ser tomada ficaria ao seu critério, mas sua esposa a arrastou até o andar de cima, questionando como ela nunca havia falado sobre aquilo antes.

Para ganhar tempo, Violet sentou na ponta da cama de Sam, de frente para ele, e encontrou uma posição confortável para terem aquela conversa.

-Sam, depois que a Livia deu a luz à Jane, ela ficou internada por alguns dias, acredito que você se lembre disso.- durante a pausa que ela fez, Sam assentiu, é claro que ele se lembrava- Em um desses dias, eu fui sozinha ao hospital e pedi para uma médica ou enfermeira, não me lembro exatamente, falar com a Livia e dizer que eu estava implorando para conversarmos um pouco, ela estava muito assustada com tudo, não queria receber ninguém, fazia um escândalo quando alguém entrava no quarto em que ela estava... Mas, por alguma razão, que eu não entendi na hora, Livia me deixou entrar sem a menor insistência.

"Quando eu abri a porta, ela estava sentada no sofá do quarto, parecendo não dormir há dias e segurando a borda do berço no qual Jane se mexia um pouco, como se fosse cair se não segurasse em alguma coisa. Ela me convidou para sentar perto dela e me agradeceu por ter ido até lá, porque já ia me chamar. Ela me contou que a sua mãe havia ido ao hospital e refeito a proposta de adotar Jane e que, a partir daí, finalmente tinha um plano para seguir."

-Plano?- Sam franziu a testa, mas não olhou só para Violet, virou-se para Sofia também.

-Nem olha para mim.- sua amiga fez o gesto de rendição com as mãos- Eu achei que a Violet era péssima em guardar segredos, mas ela conseguiu manter esse a sete chaves, eu não fazia ideia até uns minutos atrás. Continua, amor.

-Livia me fez jurar segredo sobre tudo o que ela me contou...

-E o que ela contou?!- Sam a interrompeu, estava ansioso demais para contextualizações.

-Calma, Sam...- pediu- Depois desse dia, só nos vimos mais duas vezes: uma no dia em que ela e Jane receberam alta, quando eu fui ajudá-la a ir para o convento, e uma no dia em que ela foi embora. E-eu sabia que ela ia embora, na verdade.

-V-você o quê?!- Sam parou até de piscar.

-Como eu disse, Sam, ela me fez jurar segredo. E essa segunda vez também foi a última em que eu tive notícias dela até você me contatar para a procurarmos, eu não fazia ideia de onde ela estava antes disso. Bom, a questão é que, nessa última vez que nos vimos...- Violet estendeu o que estava em sua mão para ele, só então que ele percebeu que ela segurava alguma coisa. Era um envelope, um pouco amassado e aparentemente velho. Um dia fora completamente branco, mas algumas partes estavam amareladas, não havia um endereço escrito na frente, não havia nada, exceto duas palavras escritas a lápis, quase que completamente apagadas pelo tempo, com a caligrafia torta e desengonçada de Livia: "Para Sam"- Ela me deu esta carta e disse que só entregasse a você quando nenhum sentimento seu por ela existisse mais, então eu a guardei por anos, até ter contato com você de novo. Quando você me procurou há algum tempo, eu achei que finalmente fosse a hora de te entregar, mas, só pela sua voz e pelo jeito que você falava, eu soube que não era. Quando eu e a Livia nos reencontramos e tivemos um tempo juntas, ela ficou nervosa e pediu para que eu me livrar da carta, o que tentei fazer, por isso estava na minha bolsa, mas não tive coragem... Bom, os seus sentimentos por ela claramente não sumiram e ela não queria mais que você recebesse, mas... A Livia está noiva, vai casar ano que vem e você vai refazer a sua vida na Carolina do Norte, eu sei que vocês não vão mais ficar juntos, provavelmente nem mesmo como amigos, mas independentemente de qualquer coisa eu não achei justo que vocês se afastassem de novo sem que você soubesse da verdade e sem que ela se livrasse desse peso. Vocês dois merecem se livrar desse fardo, por isso falei com a Sofia e ela...

-Eu te fiz fazer o que você devia ter feito oito anos atrás.- Sofia estava atrás da esposa e tinha os braços cruzados, ela estava um pouco irritada por Violet ter escondido aquilo dela por tantos anos- Nem todo segredo é para ser guardado.

-Violet, o que tem nesta carta?- Sam ergueu o envelope, sua mão estava trêmula.

-Apenas leia. Quando você ler, vai entender tudo. Eu e a Sofia vamos lá para baixo, vamos te dar privacidade.

Sam encarou as duas até que a porta se fechasse atrás delas, depois olhou o envelope em suas mãos. Uma Livia de dezesseis, com a personalidade cruel que a permitiu usar várias pessoas de uma vila e a própria filha, havia escrito aquilo para ele. Uma Livia cruel que só se viu frágil quando quase morreu em um sequestro e, mesmo assim, ainda fora capaz de despejar toneladas de veneno nele antes de partir. O que ela poderia ter escrito? O que ela poderia ter escrito ali que já não tivesse dito da forma mais cruel possível antes daquele fatídico dia?

Com um pouco de medo do que leria, mas consciente de que o medo só seria cessado quando lesse, ele abriu a carta. 

*     *     *

Eu sei, o capítulo é pequeno e deixa um ar de mistério, mas quarta tem outro!!!

Mas e aí? O que vocês acham que a Livia escreveu na carta? 👀

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