Mal chegamos ao hospital e o guri fora levado às pressas para atendimento. Temiam que ele pudesse entrar em estado de choque anafilático a qualquer momento. E, entrar em choque, além de ser perigoso, poderia render uma noite inteira dormindo no hospital. Xandy, como era chamado o pai do Guilherme, apareceu após uma hora inteira dentro do consultório. Ele era um rapaz 27 anos. Muito jovem para ser pai, já que o Guilherme tinha apenas 14 anos. Era treinador da categoria de base do time de futebol do Rio Preto. De descendência turca, tinha pele clara, cabelos, barba negra e olhos verdes claros. Mas aquela altura, aparentava além de mais velho, muito cansaço.
- Ele vai ficar bem! – disse o Xandy sem esboçar qualquer sorriso – Deram uns antialérgicos e agora ele ficará bem. Só queria saber o que leva um guri de apenas 12 anos a subir naquela arvore?
"12 anos tem o Burro?" – pensei atônito.
- Foi culpa minha Xandy – disse olhando para os meus pés.
- Sua? – perguntou ele espantado e agora voltando toda sua atenção para mim.
- Na verdade, não é tão minha assim! Eu também passei por isso, lógico, sem marimbondos, mas eu passei.
- Do que está falando? – perguntou ele balançando a cabeça sem entender.
- Temos um acordo nosso...
- Nosso quem? – cortou ele.
- Meu, do Murilo e do resto da turma...
- Murilo, o filho do sargento, aquele rapaz de 18 anos que capotou o carro no rio e quase te matou? – cortou ele novamente, corando a face e aparentando cada vez mais nervoso.
Por mais que o Murilo tivesse ido embora há dois meses, eu ainda sentia como se ele fizesse parte da minha vida. Deixava-me triste e sempre que suas lembranças vinham, eu precisava reunir todas as forças para não chorar.
- Alan? – me chamou o Xandy com um estalo dos dedos – além do Murilo, quem mais está incluído nesse tal "teste"
- Eu e toda a molecada – disse desviando meus olhos daqueles olhos verdes.
- Isso inclui o Guilherme? – perguntou ele puxando meu queixo para encará-lo.
Retribui o olhar por uns segundos, sem responder nada. Apenas fitei-o balançando a cabeça negativamente e vi que as têmporas pulsavam freneticamente com a nossa conversa.
- O Guilherme com aquela mania de judiar das pessoas – disse ele após longos minutos analisando os dedos das mãos.
- Com todo respeito, mas o Guilherme não participou dessa vez! – disse arrancando um sorriso de deboche.
- Dessa vez Alan? – continuou a sorrir ironicamente.
"Sabe aquele ditado Alan "Em vez de ajudar, piora"? – pensei comigo mesmo – Deveria calar a boca de vez!"
Minutos após outro longo silêncio, entrou uma mulher desesperada.
- CADÊ MEU FILHO? – gritou ela pra recepcionista.
Engoli seco e senti meu estômago pesado. A recepcionista segurara a mão da moça que aparentava estar em choque e a fez sentar. Segundos depois, entrou o meu irmão pela porta de emergência.
"Puta que pariu. Agra fodeu!" – pensei abaixando minha cabeça na esperança que ele não pudesse me ver.
"Sabe leitores, aquela sensação eu temos quando nada mais poderia piorar, aí vem algo que menos esperamos e nos surpreende? Era exatamente o que estava para acontecer!"
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MEU CORPO É MUITO PESADO!!!
RomanceHistória de um garoto chamado Alan Bortolozzo, que vai descobrindo ao longo de sua vida, como se aceitar, como viver sendo homossexual, como ser aceito, como ter amigos que o apoiam, como ser recebido pela família e, o melhor, como é possível haver...