Incondicional | Gicela

Não vou te deixar

Pessoas estranhas e uma pilha de livros era tudo o que eu tinha agora em minha frente enquanto pesquisava na biblioteca algo válido para o trabalho de anatomia topográfica. Já tinha tomado dois copos de café para me manter em pé, já que mal consegui dormir depois da conversa que tive com meus pais ontem a noite, que liberaram minha ida até São Paulo para a formatura da Marcela. Eu e ela já estávamos combinando tudo, juntamente a Bianca e Mari, que acabara de voltar do banheiro. 

- Pronto, agora me conta direito como foi a conversa com seus pais - disse Mariana, se sentando na cadeira da frente. 

Contei a ela como tinha sido a conversa e expliquei que precisei insistir muito para me deixarem ir, chegando até a pensar que eles não cederiam. Eu já estava saturada de ter que depender da permissão deles até pra dar uma volta no quarteirão, estava me sentindo como se estivesse dentro de uma bolha e não conseguisse sair a menos que eles permitissem. 

Aproveitei para contar a Mari sobre a conversa que tive com a Marcela a alguns dias sobre terminar a faculdade em São Paulo e, como eu já imaginava, ela também chegou a ter a mesma conversa com a Bianca. 

 - Imagina nós duas morando lá, Mari? Conhecer gente nova, sair desse fim de mundo - falei animada, idealizando a ideia em minha cabeça. 

- Teria coragem de deixar seus pais? - perguntou Mariana.

- Sim - respondi, enquanto digitava parte do trabalho - Já tenho vinte e cinco anos, Mari. Quero viver a minha vida, conhecer lugares diferentes, trabalhar, ser independente...

- Eu sinto a mesma coisa, Gi. Bom, você sabe que desde o colégio eu tenho vontade de mudar daqui. Você que nunca ligou muito pra isso, nunca imaginei que ia te ouvir falar assim um dia.

- Eu não ligava porque eu achava que era feliz. Eu achava que a vida que eu tinha bastava, era muito imatura pra entender certas coisas. Agora é diferente...agora eu sei o que eu quero e sei que não vou ser feliz aqui, muito menos longe da Marcela.

- Por falar em nela, já sabe o que vai usar na formatura? 

- Ainda não, mas melhor resolver isso hoje. 

Terminamos o trabalho e fomos até algumas lojas comprar os vestidos da formatura, depois passamos para pegar Jack na casa da Marcela e o levamos para passear, já que ela praticamente não tinha mais tempo para isso por causa da correria de últimos dias de estágio e ele estava ficando muito tempo sozinho. Paramos em um dos quiosques da praça para tomar água de coco e em seguida Marcela e Bianca chegaram e se juntaram a nós. 

- Oi, meu amor - disse Marcela, beijando-me o rosto - Oi, Mari - falou, cumprimentando-a e sentando-se ao meu lado com Jack no colo. 

- Oi, Gi - disse Bianca, antes de se juntar a Mari do outro lado da mesa. 

- Saíram mais tarde hoje, amor? - perguntei, notando que se passava do horário que costumavam sair do hospital. 

- Sim, tivemos que acompanhar uma cirurgia.  

- Acompanhar? - rebateu Bianca, na mesma hora - Nós praticamente operamos a paciente sozinhas, Marcela. 

- Sim, verdade - respondeu, tomando minha água de coco - Mas o importante é que deu certo. 

- Mérito seu, Marcela Mc Gowan. Aluna exemplar e futura melhor médica que esse país já viu. 

Marcela ficava nitidamente envergonhada quando a elogiavam, ela era modesta demais para concordar ou se vangloriar mas eu sentia muito orgulho de saber que minha namorada, além de linda e inteligente, era a melhor naquilo que fazia. Estava ansiosa para vê-la se formar, a dias Marcela só falava nisso e mais do que ninguém eu sei o quanto esse dia será especial e importante pra ela. Mari e eu já tínhamos resolvido o que era preciso para faltar na faculdade e Bianca já tinha comprado hoje de manhã nossas passagens para São Paulo.