26. Despedida

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Pelo restante do fim de semana não vi Amabily. Ela não esteve presente nem no almoço de despedida que meu pai e  Evandra fizeram. Na certa enroscada com o gringo.

- Melhor assim! - pensei alto terminando de arrumar as coisas
- Deu pra falar sozinho agora, irmão? - Bruna entrou rindo no quarto com Ninah atrás dela.
- Só pensando alto - Respondi entre dentes.
- Posso imaginar... - Minha irmã deu aquele sorriso torto característico
- Vou sentir sua falta, Rafa! - Ninah me abraçou
- Sabe que eu também, caçulinha? - Sorri e retribui o abraço - Mas estarei perto. Me visite quando quiser.
- Sei que estará perto, mas... - Seus olhos lacrimejaram - ... você está certo! Acho que vou acabar te perturbando muito.
- A hora que desejar, pequena!
- Sabe, Rafa! O dia que tiver um filho, tomara que seja uma menina! Ela vai se apaixonar pelo pai que você será.
- Acho que essa ideia já passou para mim, Ninah! Mas obrigado pelo elogio.
- Me adote como filha, então! - Ela sorriu - Pai Susano é um fofo, mas você...em pouco tempo aprendi a te amar não como um irmão, mas como o pai que não tive.
- Oh Deus!!! Que lindo, Ninah!!! Nunca imaginei ouvir qualquer coisa parecida vinda de você. - Bruna falou emocionada e eu senti o corpo todo gelar.
- Eu tenho muitos sentimentos, Bru. Só não fico expondo para qualquer um.
- Vem aqui, pequena! - Puxei Ninah novamente para os meus braços."Se ela realmente for minha filha, não preciso de mais nada" -  Você já é o meu coração! - Ela se aninhou ainda mais em meus braços e eu depositei um beijo em sua testa enquanto a garganta travava um soluço.

Depois de abraçar todos de minha nova família e de me despedir mais uma vez, parti para o meu apartamento , para o meu canto...para longe de Amabily.

                             ***

Fazia duas semanas que havia me mudado e até meu avô já tinha vindo conhecer meu novo espaço. Não perguntei por ela, ninguém tocou em seu nome e eu já estava conseguindo não pensar, mas minha querida irmã de sangue, tinha que aprontar! Claro, não seria Bruna, com ajuda de Lyz, soube depois, que não me deixaria em paz tão facilmente.

- "Rafa, preciso de um favorzinho seu!" - me pediu com voz manhosa ao telefone e meu radar indicativo de "perigo, é treta!" nem deu sinal de vida
-"Que foi desta vez, Bru?"
-"Problemas com o carro de novo! Pode me pegar aqui em casa e me levar ao Center Sul?"
-"Pede ao pai, Bruna!"
-"Papai e Evandra viajaram às pressas!"
-"E as meninas?"
-"Ninah e Lyz estão em desfile e Bily...bom, é ela, né, irmão?" - Bufei baixo. Provavelmente a "irmãzinha" estava por aí enroscada em alguém.
-"Ok, Bru! Que horas?"
- "Daqui uns 30 minutos?"
-"Certo..."

Cheguei 40 minutos ou mais depois do combinado  e ao entrar na casa que parecia silenciosa demais para aquela família feliz, chamando por minha irmã, ouvi os acordes do piano e senti o perfume dela...encostei no arco da sala de convivência e Amabily estava ao piano de costas para mim, quando  começou a cantar My immortal. Adentrei mais a sala e sentei no sofá, vendo seus cabelos presos no alto da cabeça em um meio rabo de cavalo balançando suavemente conforme balançava sua cabeça devagar e arrancava notas precisas do instrumento.

"I'm so tired of being here
Suppressed by all my childish fears
And if you have to leave
I wish that you would just leave
'Cause your presence still lingers here
And it won't leave me alone

These wounds won't seem to heal
This pain is just too real
There's just too much that time cannot erase"

Ela parou e levou a mão ao rosto como se limpasse lágrimas e depois continuou.

"When you cried, I'd wipe away all of your tears
When you'd scream, I'd fight away all of your fears
And I held your hand through all of these years
But you still have all of me

You used to captivate me
By your resonating light
Now, I'm bound by the life you've left behind
Your face it haunts my once pleasant dreams
Your voice it chased away all the sanity in me

These wounds won't seem to heal
This pain is just too real
There's just too much that time cannot erase

When you cried, I'd wipe away all of your tears
When you'd scream, I'd fight away all of your fears
And I held your hand through all of these years
But you still have all of me"

Suspirou em uma meia parada como se para tomar fôlego e cantou mais alto

"I've tried so hard to tell myself that you're gone
But though you're still with me
I've been alone all along"

E mais baixinho continuou de cabeça baixa. Ali eu tive a certeza que ela estava realmente chorando.

"When you cried, I'd wipe away all of your tears
When you'd scream, I'd fight away all of your fears
And I held your hand through all of these years
But you still have all of me"

"Estou tão cansada de estar aqui
Suprimida por todos os meus medos infantis
E se você tiver que ir
Eu desejo que você simplesmente vá
Porque sua presença permanece aqui
E ela não me deixa em paz

Essas feridas não vão cicatrizar
Essa dor é muito real
Existe tanta coisa que o tempo não pode apagar

Quando você chorou, eu enxuguei todas as suas lágrimas
Quando você gritou, eu lutei contra todos os seus medos
E eu segurei sua mão por todos estes anos
Mas você ainda tem tudo de mim

Você costumava me cativar
Com a sua luz brilhante
Agora sou limitada pela vida que você deixou para trás
Seu rosto assombra todos os meus sonhos que costumavam ser agradáveis
Sua voz expulsou toda a sanidade em mim

Essas feridas não vão cicatrizar
Essa dor é muito real
Existe tanta coisa que o tempo não pode apagar

Quando você chorou, eu enxuguei todas as suas lágrimas
Quando você gritou, eu lutei contra todos os seus medos
E eu segurei sua mão por todos estes anos
Mas você ainda tem tudo de mim

Eu tentei tanto dizer a mim mesma que você se foi
Mas mesmo você ainda estando comigo
Eu estive sozinha todo esse tempo

Quando você chorou, eu enxuguei todas as suas lágrimas
Quando você gritou, eu lutei contra todos os seus medos
E eu segurei sua mão por todos estes anos
Mas você ainda tem tudo de mim"

Eu deveria apenas deixar que ela virasse e me visse ali, ou poderia sair antes dela terminar, mas estava hipnotizado e num ímpeto levantei para bater palmas, vendo Amabily pular no lugar e se virar bufando.

- O que está fazendo aqui??
- Bruna me pediu para... - Ela não me deixou terminar
- Bru saiu faz tempo!! E eu achei que estivesse sozinha!
- Ela me ligou dizendo que... - E então soube que minha irmã armou para mim - Filha de uma boa mãe!!!
- Quê? - Os olhos de Amabily estavam vermelhos mas chispavam.
- Bruna armou isso! Ela sabia que você estaria aqui!
- Sim, ela sabia! Conversamos um pouco antes que ela saísse. - Fitei seus olhos e resolvi mudar de assunto
- Você só canta ou toca quando está sozinha?
- Sim, porquê? - Ela arrebitou o nariz
- Amabily, pelo que sei estávamos bem quando sai daqui.
- E estamos! - Ela deu de ombros e se sentou
- Então porquê essa animosidade toda? - Me aproximei
- Nada! Só levei um susto...só isso.
- Adoro Evanescence! - Me lembrava a juventude, e talvez a sua irmã nerd -  mas essa música é triste...te lembra alguém?
- Sim, lembra. Mas não quero falar sobre isso.
- Às vezes faz bem falar um pouco sobre o passado... - Tentei. Eu queria saber mais
- Passado? Como você sabe que  faz parte do meu passado? Quem falou? - Ela levantou brava -  Lyz? Ninah? Minha mãe? - Ela respirou - Minha mãe não faria...Quem?
- Ninguém. Apenas presumi por ser uma música antiga.
- Ah! - Ela se sentou novamente.
- Mas agora eu sei que há alguma coisa! Pela sua entrega e pela...raiva?
- Nada que te diga respeito, irmãozinho!
- Ok...voltamos ao que éramos! - Virei as costas e saí - Tchau, irmãzinha!

Fui até o carro com o coração batendo forte e com as bolas apertadas dentro da calça.

- "Pôrra de mulher!!!"

Bufei, dei meia volta e decidi que se já estava ali, não iria dar o gostinho da vitória para aquela baixinha sexy.

Vai ter volta!Onde histórias criam vida. Descubra agora