Capítulo 2

2.6K 179 3
                                    

Giovanna Martins

Meu peito aperta com as últimas notícias. Ele deixou a casa dele para a ex-mulher, e agora onde é que ele vai ficar, se todos os seus parentes não vivem no Brasil? Eu não queria, mas estou angustiada e preocupada com o bem-estar dele, e eu pensando que o odiava.

— Onde é que você está dormindo? — pergunto, e ele me olhas surpreso com a pergunta.

— Em um hotel, tem uma cama quente, uma banheira e televisão, não se preocupe, estou bem.

— Não que eu esteja preocupada, mas, está chovendo forte, suas roupas estão úmidas, porque não passa a noite aqui? Meu pai está viajando com a namorada e só volta no final do mês como você sabe — digo dando as costas, para que ele não me atinja com aquele olhar de réu novamente e me faça ceder a mais alguma coisa.

— Eu não quero incomodar — ele fala me seguindo. — Só vou me despedir do nosso filho.

Assim que entramos na sala, pego o controle, desligo a televisão, e observo Christian fazer pirraça, mas ele se contém, a presença do pai de alguma forma o intimida.

— Papai já está indo — Santiago fala se agachando próximo do sofá para beijar o filho.

— Não, papai! — o menino cruza os braços, faz biquinho, e deixa uma lágrima escorrer. Sem saber como agir, Santiago me olha esperando por uma solução.

— Para de fazer birra, mocinho! Você assistiu televisão até tarde hoje, hora de dormir. E seu pai precisa ir, já está tarde — falo com autoridade.

Estico o braço para ele, mas o garoto envolve seus bracinhos no pescoço de Santiago, e esconde o rosto no peito do pai, como se aquele fosse seu abrigo mais seguro.

— Fica papai, por favor — o menino volta a resmungar fazendo sua típica chantagem emocional da qual já estou vacinada.

Não estou apenas cansada emocionalmente e com sono, as últimas notícias me trouxeram um turbilhão de pensamentos, e questionar a vontade do menino definitivamente não é o que quero fazer. Então me junto a ele na torcida "fica papai".

— Vai ser bom para ele, Santiago. Você pode colocá-lo para dormir, ler algumas de suas histórias favoritas, essas coisas que pais fazem.

Santiago me lança um olhar demorado ponderando uma reposta, aquela era a primeira vez depois na nossa separação que eu o convido para estar mais próximo, e sinceramente nem sei por que fiz isso.

— Tudo bem. Vocês venceram — ele diz animado pegando o filho no colo. Imediatamente o choro do menino cessa, dando lugar a um sorriso sacana de quem conseguiu o que queria. Sem-vergonha.

Eles sobem as escadas fazendo bagunças de menino e rindo. Santiago desaparece no corredor com nosso filho no colo enquanto eu, vou em busca de roupas de cama limpas e toalhas secas, para Santiago tomar um banho quente e se acomodar.

Abro a porta do quarto ao lado do meu, tem muito tempo que papai e eu não recebemos visita. Por este motivo o quarto de hóspedes não está preparado para tal finalidade, pois ali depositamos tudo o que não necessitamos, mas também não queremos jogar fora, parece um brechó ou um quarto de descartes, onde os moradores são as traças e os ácaros que vivem nas grandes pilhas de caixas e tantas outras coisas entulhadas ali.

Para ele, parece bom. Penso maliciosamente.

Enquanto eu preparo a cama ouço risos animados vindo do quarto de Christian. Onomatopeias voam pelo ar criando um perfeito mundo de imaginação; civis em perigo e uma cidade sendo atacada por um monstro terrível faz parte do faz de conta da brincadeira.

Quando menos percebo, há um sorriso contente em meus lábios, e em segundos me vejo presa com aquela mesma sensação de que eu senti a anos atrás, a sensação de ter uma família minha, só minha.

Quando descobri sobre a gravidez, fiquei apavorada, mas mesmo assim, imaginei que tudo seria fácil, afinal o pai do meu bebê havia me prometido que sempre estaria comigo, em bons e maus momentos.

Finalmente teríamos a nossa própria casa, e eu teria a família que sempre sonhei. Sempre. Mas nada foi como planejei, nada saiu como deveria, nada! E quando meus pensamentos voltam a arrumação da cama, o meu sorriso se torna em um completo vazio. O amargo ressentimento volta a ofuscar meu sorriso e eu me vejo em meu mundo cinza, sem vida.

Termino de forrar a cama, e pego toalhas secas, caminho em direção ao quarto de Christian, e quando atravesso a porta, Santiago põe o indicador no lábio e assopra sem deixar escapar ruídos.

— Shhhh.

Christian está dormindo, em um sono leve, abraçado com o boneco do Batman, enquanto Santiago segura o Superman. Eles estavam brincando de super-heróis, por isso tanta bagunça.

Apago a luz e me afasto da porta. Santiago, ajusta o corpo do filho na cama, o cobre, quando vira seu rosto em minha direção, me olha com um sorriso vitorioso. Desde que o filho nasceu, é a primeira vez em que ele tem o privilégio de colocá-lo para dormir.

— Ele é maravilhoso — ele diz sorrindo como se estivesse acabado de descobrir novas sensações.

Sinto um sorriso brotando em meus lábios, mas o impeço antes que ele se complete.

— O quarto de hóspedes está pronto — falo seca, sem demostrar sentimentos, afeto, ou quaisquer vestígios de empatia.

Onde foi a nossa intimidade? Aonde foi parar os beijos calorosos que trocávamos e a vontade de sorrir com um simples olhar? Aonde foi parar os sentimentos que um dia foram tão recíprocos? Aonde?

Estico a toalha em sua direção. Ele a pega sem jeito.

— Obrigado — ele diz caminhando em direção ao quarto que indiquei.

— O quarto não tem suíte, você pode usar o banheiro do corredor — digo indo em direção ao meu quarto sem esperar por uma resposta, até mesmo um agradecimento.

Quando tudo deu erradoOnde histórias criam vida. Descubra agora