Santiago Castillo
— Filho, estou cansado de ver esse desenho, o que acha de irmos lá fora um pouco, ver como está o dia? A chuva já passou. — É a terceira vez que tento trocar de canal, ou fazer o menino sair de cima do sofá, mas ele se recusa a fazer qualquer coisa que não seja assistir aquelas bizarrices infantis. — Sabe onde sua mãe foi? — pergunto. — Ela disse alguma coisa?
Às vezes me esqueço que o pingo de gente só tem quatro anos.
— Mamãe tá namolando — ele fala olhando para o telão. — E o vovô biga, biga e biga.
— O quê? — Será que estou ouvindo direito?
O garoto nada responde, apenas continua olhando fixamente para a tela e ri de algumas trapalhadas do personagem.
Vendo que não há outro jeito, pego o controle e desligo a televisão. Ele me olha com a expressão revoltada, tenta pegar o controle da minha mão, mas eu levanto o braço bem no alto, sem dar chances de ele conseguir alcançar.
Sem sucesso, ele me olha já juntando lágrimas no olhar esticando um biquinho mimado.
— Não filho, não chora... Olha... Papai vai levar você para comprar doce. Você quer doce? — Falo sentindo um certo desespero bater. Se o garoto começar a chorar eu não vou saber o que fazer.
Ele ainda coça os olhinhos tristes, quando eu o calço e o preparo para sair de casa. Depois de prontos, ele já está mais animado me contando sobre a bola nova que ganhou de alguém, mas a única coisa que consigo pensar além da história de saber que Giovanna está namorando, é com quem ela está namorando.
O tempo está nublado, mas para a minha sorte, não está chovendo, e próximo ao condomínio há um supermercado. Não vai ser preciso ir dirigindo, até porque no meu carro não há nenhum equipamento para transporte de crianças.
Começamos a caminhar, na medida em que suas pequenas perninhas conseguem andar.
— Então filho, a mamãe está namorando? — Pergunto o pegando no colo, para apressar nossa caminhada.
Ele confirma a pergunta com a cabeça.
— Buno, disse que vai ser meu papai dois — ele estica os dedinhos e me mostram o número dois.
— Seu segundo pai? — falo sentindo certo incômodo.
Ele confirma com a cabeça novamente.
— E sobre seu avô brigar, me conta o que está havendo.
— Vovô e mamãe biga sempe.
Segundo Giovanna o relacionamento com o pai sempre foi bom, mas andava desgastado. Não me admiraria de saber que eles andaram se desentendendo.
— E como é esse tal de Bruno? — Resmungo.
— Gandão assim — ele diz levantando o braço, me passando a ideia de altura. — Lá no alto.
E eu pensando que depois de tantos anos, ela ainda sentisse aquele amor tão devoto que tinha por mim no passado. Eu sei que ela tinha o direito de seguir com sua vida, mas a ideia de vê-la nos braços de outro, desceu pela minha garganta como um cacto, me gerando ciúmes e desconforto.
Parecia tão absurda aquela ideia do meu filho estar chamando outro de pai, que eu ainda tentava assimilar como e quando aquilo começou a acontecer sem que eu soubesse. E o pior, onde é que ela conheceu o cara, e quem era ele? Onde é que eu estava que não vi tudo aquilo acontecer? Onde é que eu estava quando Giovanna pensava em dar um pai substituto para o meu filho?
***
Biscoitos de vento, jujubas, chicletes e chocolates. É o que tem dentro da enorme sacola de mercado que estou levando para casa junto de mim e meu filho.
Desde que Christian me falou a respeito do tal Bruno e das brigas frequentes entre Giovanna e o pai, fiquei preocupado. Não consegui pensar em outra coisa a não ser averiguar a situação.
Eu não quero ser intrometido e muito menos inconveniente, até porque Giovanna tem o direito de refazer a vida, ela é jovem... bonita, mas até que eu tenha a certeza de que esse tal Bruno seja um bom homem, e que vai tratar meu filho e a mãe como merecem, não vou ficar em paz.
Atravessando o portão do condomínio, vejo uma mulher um pouco distante, colocando uma placa de compra e venda, na entrada da casa ao lado.
Me aproximo segurando a mãozinha do meu filho e pergunto:
— Bom dia, está à venda?
A loira de olhos escuros, blazer e colares chamativos, me olha sorrindo simpática, e responde:
— Bom dia, está à venda sim, os donos passaram para a minha imobiliária pela manhã cedo — ela estica um cartão de visita em minha direção com um sorriso largo de quem sabe que está próxima de um comprador em potencial.
— Obrigado — pego o cartão e leio o verso.
Srta. Bianca Andrade. Consultora imobiliária.
— Se tiver interesse, entre em contato comigo — ela diz em tom simpático, enquanto alisa o cabelo do meu filho. — Que criança linda. É seu filho?
Sorrio educadamente.
— Sim. — Respondo vendo-a olhar para meu dedo anelar e procurar por alguma aliança de compromisso.
— Pai solteiro? — Ela pergunta com certa pretensão.
— Sim e não. — A mulher ri me avaliando com interesse. — Tentando reconquistar a mãe.
Um "oh" forma-se em seus lábios, ela parece constrangida, e surpresa, ajeita a bolsa que está no ombro e pega a chave do carro.
— Bem. Então tenha um bom dia. Tchau rapazinho — ela gesticula gentilmente para meu filho que retribui a ação com um sorriso.
Quando ela se vira para entrar no carro, sou motivado pelo orgulho, ciúme e raiva por saber que cheguei tarde demais e Giovanna agora pertence a outro.
A única coisa de que tenho a certeza: é que preciso estar por perto, e àquela parece uma ótima oportunidade.
— Senhorita, Bianca! — chamo a mulher que já está com a porta do carro aberta. Ela me olha e então... — Eu vou comprar a casa!
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Quando tudo deu errado
RomanceNo passado Giovanna Martins viveu um romance intenso com Santiago Castillo, o pai de seu filho Christian de apenas quatro anos. Juntos eles enfrentaram muitas circunstâncias que nem sempre foram a favor desse amor deixando muitas marcas e mágoas ent...