Capítulo 7, parte 1

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Da inauguração do London, passaram-se quase dois meses. Esse ínterim foi mais um tempo de aprendizado e adaptação para todos os lados. O mais atingido, claro, era Liam, mas as pessoas ao seu redor também tiveram que se acostumar a algumas mudanças.

A primeira e mais exclamativa delas era: agora ele era um homem sério. Nada de saídas todos os finais de semana, nada de saídas no meio da semana, nada de acordar à hora do almoço, nada de dirigir pela cidade sem rumo para encontrar qualquer distração, nada de irresponsabilidades. Os dias de vida desregrada agora faziam parte de um passado recente. Cuidar de um negócio, embora ainda pequeno, mostrava-se uma tarefa áspera e exigente, que tirava do rapaz a disponibilidade para se aventurar pela existência a seu bel-prazer. Mas ele não se queixava, não; pelo contrário! Se soubesse quão gratificante era ver seu esforço se transformar em trabalho e seu trabalho, em progresso, talvez tivesse começado antes! Entrar no London às cinco da tarde e tê-lo movimentado da noite à meia-noite era como observar o trigo crescer numa extensa seara.

Téo e Nicole, por suas vezes, perderam cinquenta por cento da companhia do amigo, outrora sempre disponível. Quando queriam vê-lo, ir ao bar e dividir sua atenção com os afazeres do local eram quase a única opção. Com a cabeça sempre cheia, uma agenda em que sempre havia uma conversa marcada com um fornecedor, ou com o gerente, ou com os responsáveis pelas mídias sociais, ou com o contador, ou com o próprio pai—a quem Liam sempre lembrava estar ciente de seu débito—, não era mais possível manter a rotina de idas e vindas por todas as partes de Taigo. Compreensivos e de acordo, ninguém reclamou.

Uma conversa séria com Nicole sobre o ocorrido na noite de inauguração nunca existiu. Da mesma forma, Noah nada disse sobre o encontro com Téo naquela segunda-feira; tudo passou como se nada tivesse acontecido. Dos três, Liam se preocupou mais com Noah, mas este garantiu que o encontro não foi nada assim tão excepcional; ninguém morreu no final. Nicole não insistiu em questionar o porquê de o namorado não ter atendido nem uma de suas nove ligações, bem como Téo não tornou a falar daquele assunto batido. Ou todos fingiram muito bem não se importar ou Liam era quem se importava demais.

Já se iam meados de dezembro, mês de festividades. Taigo e suas ruas e lojas já estavam devidamente decoradas para o Natal, bem como o espírito de cordialidade e alegria injustificadas começava a pairar sobre todas as auras. Para Liam, particularmente, era apenas mais um dia no calendário — e uma excelente justificativa capitalista para gastar o pobre dinheiro da população. Para Noah, mais crente do que o outro, outras conotações emergiam. Para Lilian, porém, membra-fundadora da Sociedade do Espetáculo, o Natal era um acontecimento social, um evento: nessa data, todos os anos, toda a família, mesmo os membros mais insignificantes, incluindo tios ranzinzas, tias-avós caducas, sobrinhos desconhecidos, primos recém-nascidos, crianças-sem-nome e irmãos dos cunhados dos parentes de terceiro grau, eram convidados para um banquete na mansão Meirelles Prado. Naturalmente, Liam detestava esse tipo de evento e sempre preferia a companhia de seus amigos à reunião massiva de tantas pessoas irrelevantes, mas, naquele ano, certo convite o pegou desprevenido.

— Nada disso, meu filho, eu faço questão de que ele venha.

— Mãe, o Noah não gosta dessas coisas, ele não vai querer vir.

— Eu quero ele aqui, Liam — Lilian insistiu. — Desde que eu te pari, esse é o único amigo seu que vale alguma coisa. Você sabe que o Natal é importante pra mim e eu gosto de pessoas importantes perto de mim. Se for preciso, eu ligo pra ele e o arrasto pra cá pelo braço. Não tem desculpa.

— Mãe, ele também tem pai e mãe, e eles não moram aqui; tenho certeza que ele vai viajar pra casa dos pais... E

— Fale pra ele trazê-los também, se for o caso. Já disse que eu faço questão.

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora