Capítulo 7, parte 4

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Noah estava certo: não havia muito que fazer na cidadezinha. Ficaram aquele dia todo no quarto, assistindo TV, falando sobre coisas amenas, comentando a programação, contando as histórias da meninez. Da janela do quarto vinha a brisa gelada e lívida como o céu nublado, que ainda não chovia. Debaixo dos cobertores, acariciavam-se sem malícia. Seus corpos queriam um ao outro, mas sabiam, entendiam e concordavam que deveriam esperar por outro momento—não só por haver assuntos inacabados entre eles, mas também porque Noah se sentia um pouco encabulado de fazer intimidades sabendo que os pais estariam logo ao lado. Assim sendo, tudo que fizeram foi trocar longos beijos saudosos e sinceros e afagos gentis até a noitinha cair.

Inácio voltou do trabalho cheio de sacolas. O jantar de ano novo deveria ser especial, pois o convidado da vez assim o era. Rita prometeu um lombo assado recheado e o pai, uma garrafa de Vinho do Porto que encomendara na adega de Atma. Para aquela noite, porém, o canelone do almoço ainda estava saboroso. Comeram juntos mais uma vez, e conversaram sobre tudo um pouco; e então Inácio perguntou:

— E aí? Já têm planos pra amanhã?

— Acho que a gente vai pescar — o filho respondeu.

— Hum... O tempo não tá muito bom, mas o rio é bonito de ver mesmo assim. Vão precisar de alguma coisa?

— Acho que não; só das varas e isca, mesmo. Isso tem aqui em casa, não tem?

— Tem, sim.

— O Noah diz que não, mas é muito bom de pesca, sabe, Liam? — Rita acrescentou. — Sempre que ele e o Inácio saem pra pescar, ele volta com pelo menos dois!

O rapaz corou, sorrindo de lado sem desmentir a mãe. Liam o olhou com ternura, dando-lhe o mesmo sorriso que observava. Sentia que havia feito a coisa certa ao se oferecer para passar aqueles dias ao lado do companheiro.

Recolheram-se cedo, por volta das onze. O frio da noite e o estômago cheio eram ingredientes que contribuíam fortemente com a vontade de se deitar e se aconchegar no calor do outro e repousar o sono dos justos ao lado de quem se ama. Os pulmões se enchiam de ar sereno e se esvaziavam lentamente, e os lábios se arqueavam sutis num semi-sorriso involuntário, bobo, sossegado. As pálpebras pesadas eram indicativas de um adormecer que não demorou a chegar, e se instalou suave sobre os seres.

Liam acordou primeiro. Ouviu, do quarto, a conversa de Rita e Inácio — este também acabara de se levantar. A barriga roncava junto com Noah, que ainda repousava sonoramente. Movendo-se com cuidado para não perturbá-lo, Liam saiu da cama e foi escovar os dentes. Seduzido pelo café que certamente o esperava na cozinha, decidiu não esperar pelo parceiro; o dia longo de conversa e boas vindas fora o bastante para deixá-lo à vontade perto dos pais dele.

Encontrou-os à mesa, falando baixo para não acordarem os rapazes.

— Bom dia, querido! — a mãe cumprimentou.

— Bom dia; bom dia, seu Inácio.

— Bom dia, rapaz. Senta aí, vamos tomar café.

Sentou-se ao lado da mãe, de frente ao patriarca, que o olhava com olhos muito gentis.

— Dormiu bem? — Rita perguntou.

— Sim, muito bem! A cama do Noah é ótima.

Riram da resposta inesperada. Ofereceram-no tudo que estava sobre a mesa e o que estava na geladeira também. Desavergonhado, ele aceitou o que bem quis, servindo-se com fartura dos pães e quitutes ao alcance da mão.

— Eu tô tão feliz por você ter vindo, Liam! — Rita repousou a mão sobre a do rapaz. — O Noah fala tanto de você...

— Bem ou mal? — brincou.

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora