Capítulo 9, parte 1

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:: TEM RECADINHO NO FINAL! LEIAM, PLEASE! ::

Cerca de meia hora depois, Eve me ligou, desesperada. Disse que a reação dele foi horrível... Eu ainda estou com as emoções meio fora do lugar, não sei bem o que pensar... Mas tinha que ser assim; não tinha um jeito fácil de fazer isso, ele ia sofrer de todo modo. Eu e ela estamos juntos nessa; precisamos ser e permanecer fortes. No final vai ficar tudo bem, pra todos nós, eu tenho certeza.

Quando abriu os olhos, Liam não estava mais no Santa Maura, mas em um quarto que desconhecia. Sonolento, com as pálpebras pesadas, foi recobrando a consciência vagarosamente. Olhou seu redor sem mover a cabeça e, segundos depois, começou a reconstruir a sucessão de eventos que o levaram até aquele local estranho, que logo ele percebeu ser o quarto de Téo.

Em segundos a história se refez toda em sua mente, e despertar foi como morrer um pouco mais por dentro. Não sabia que horas eram e isso pouco importava; o quarto estava escuro como o anoitecer, mas seus olhos viam. Com um gosto ruim na boca, Liam se levantou com dificuldade. Ao sentar-se à beira da cama, a cabeça girou e o estômago embrulhou; seus sensores estavam todos desconfigurados. Com o torso desnudo, caminhou com os pés descalços arrastados até o banheiro do quarto do amigo, onde se olhou no espelho e viu refletido um Liam semivivo. Os olhos fundos, vermelhos, inchados, o cabelo desarrumado, a pele ainda marcada pela violência de mais cedo.

Não havia o que pensar ou dizer a si mesmo; tudo estava acabado. Noah, o ser humano a quem mais ternamente amou em toda a vida, e Evelyn, sua irmã de sangue... juntos. Juntos. Cada vez que essa lembrança imediata emergia era como uma punhalada no peito, que já não tinha mais sangue para derramar; as lágrimas ressecadas não mais caíam: apenas lhe faziam arder o firmamento dos olhos.

— Ei...

A luz do banheiro era a única acesa. Téo surgia das sombras do quarto com olhar complacente. Não conversaram, ao menos não com palavras. Téo envolveu o amigo num abraço sem retorno, confortando-o em seu calor fraterno. De olhos entreabertos, apático, Liam repousou a cabeça sobre o ombro do outro, deixando-se proteger sem protestar. Não sabia como havia chegado ali, nem por que lhe deram um sedativo no hospital; esperava ser arrastado para fora e talvez levado pela polícia. Acordar no quarto de Téo era um evento que exigia explicações que Liam não queria ouvir.

— Você pode ficar uns dias aqui em casa se quiser...

O aceite ao convite era óbvio e providencial, mas a proposta ativou de forma convulsiva os pensamentos. Liam dividia o mesmo teto que a irmã; ambos respiravam o mesmo ar, e dividiam a mesma mesa de café da manhã, e não raramente ele a levava de carona para o hospital. A mera representação mental de Evelyn causava ondas de ódio e ojeriza; de um sentimento tão claustrofóbico e destrutivo que Liam nem sabia ser capaz de sentir. Imaginar que ela era quem Noah beijava era de uma agonia inexpressável. Por quanto tempo eles teriam escondido isso? Quando começaram? E por quê? Como?! Depois de tudo que viveram!...

— Vai tomar um banho; eu vou arrumar alguma coisa pra gente comer — Téo desabraçou o amigo com cuidado e se afastou, pesaroso por ter que deixá-lo sozinho mesmo que por poucos instantes.

Vítima dos efeitos do sedativo ou não, Liam se encontrava incapaz de questionar qualquer comando. Operando em modo robótico, voltou ao banheiro quando Téo saiu do quarto, já tendo deixado uma toalha e cueca sobre a tampa da privada para quando o outro acordasse.

Ele foi. Encostou a porta, despiu-se, ligou o chuveiro e apenas se sentou sobre o chão gelado de cerâmica branca. Fechou os olhos e mergulhou naquele mundo negro não para sanar sua dor, mas para senti-la. O choro veio novamente, sem força e sem som. Que dor era aquela que era quase física? Que sentimentos insuportáveis eram aqueles? Seria aquilo? Seria aquilo o mesmo que Nicole estaria sentindo? Quão igual ou quão diferente era sua dor? Ah, se Liam soubesse! se arrependimento matasse! ele teria contado a ela a verdade muito antes se ela estivesse agora sentindo um décimo do que ele sentia!

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora