Capítulo 8, parte 5

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A paz foi chegando aos poucos, mas os tempos ainda eram de neblina. Uma semana depois da conversa com Nicole, Liam ainda não havia voltado à casa dela para buscar suas coisas que lá ficaram. Não era muito, mas ir lá custaria encará-la depois de toda aquela conversa desastrosa. Levou dez dias para toda essa coragem vir e levá-lo aonde ele deveria ir.

Ligou para a moça e combinou um horário para fazer o que tinha de ser feito. Ao telefone, a voz dela era calma, mas o ressentimento era indisfarçável. Da mesma forma, a vergonha moral que habitava Liam se expressava por meio das lacunas de silêncio e do tom ainda entristecido daquela voz um dia tão certa do que fazia.

Ao anoitecer, ele foi à casa dela. A visita não demorou muito; além de não terem nada para conversar, Nicole já havia separado as coisas do ex em caixas e sacolas; o único trabalho que ele teve foi levar as coisas até o porta-malas do veículo. Não falaram nada além do estritamente necessário. Os olhos de Nicole eram vazios como duas taças, e não mais buscavam os de Liam em nenhum momento. O rapaz, por outro lado, queria saber o que dizer para tornar aquilo tudo menos insuportável, mas, ciente de que era protagonista de todos os erros que levaram àquilo, o que quer que dissesse jamais seria o suficiente para minimizar os estragos que fizera.

Não houve uma despedida. Antes que Liam entrasse no carro para ir embora, Nicole fechou o portão para não vê-lo partir. O ruído metálico da batida do portão foi o adeus que ninguém disse; daquele dia em diante, ela não fazia mais parte da vida dele, definitivamente. Não houve choro nem comoção, nem extensões forçadas da briga que tiveram no outro dia; não houve sentimento nenhum: houve uma ruptura, nada mais. Os dois ainda teriam tempo para aprender o que aquilo significava na prática.

Téo foi quem ficou na posição mais desconfortável dentre os envolvidos de forma indireta no caso; era amigo dos dois quase nas mesmas proporções. Embora Liam fosse mais próximo e tivessem, os rapazes, mais contato e intimidade, era logica e racionalmente impossível ficar ao lado do amigo naquele cenário todo, que Téo previra com precisão desde o princípio. Nada aconteceu por falta de aviso; foi tudo conversado e problematizado, e as consequências pelo agora só tinham um responsável: Liam-ele-mesmo. Não houve choro nem comoção, nem extensões forçadas de tudo o que Téo já havia cansado de dizer em inúmeras oportunidades; houve um esperado desalento, nada mais.

A felicidade pretendida com o término ainda parecia um ideal distante. A consciência de todo o tempo durante o qual Nicole foi enganada, e o fato de que esse tempo ela jamais recuperaria, mesmo encontrando alguém que a amasse de verdade, que desse a ela o respeito que ela merecia... A consciência disso era algo assombroso, e dessa culpa Noah era cúmplice, e por isso ele sentia o mesmo desgosto que os outros dois; por saber o que ela sentia, por ter sido parte disso, por ter aceitado o adultério, por ter passado por cima de sua racionalidade em nome daquele sentimento sem nome.

O relacionamento caminhou assim, de luto. Ainda não haviam encontrado um motivo para celebrar, e a certeza de que acabavam de entrar em uma nova fase que era consequência de um final tão nefasto era como sobreviver a um acidente do qual as outras vítimas foram fatais. Vida nova? Novos planos? Projetos para o futuro? Nada disso em vista. Vivendo um dia de cada vez era como a vida seguia, devagar e sempre. Mesmo no aniversário de Noah, em março, a comemoração foi moderada. Como presente, Liam deu ao amado algo que sempre quisera dar, mas só agora pôde: uma aliança.

— Liam...

Noah procurou o que dizer, mas não soube ao certo o que queria expressar.

— Eu quero ser seu namorado, Noah... E quero que você seja meu namorado também. Oficialmente, sem se esconder de ninguém...

Não foi um presente meticulosamente calculado ou pensado para ser o presente de aniversário; ocorreu quase como uma coincidência: agora livre para fazer isto, Liam escolheu as alianças, comprou-as e entregou a de Noah quando o encontrou no dia de seus anos. Um elo de prata com uma faixa preta no centro, que tornava o acessório mais discreto, mas não menos bonito e simbólico.

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora