Capítulo 6, parte 6

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O sábado e o domingo foram tão quanto ou mais corridos que a sexta-feira. As duas manhãs e as duas tardes que seguiram pareceram longos preparativos para a noite de trabalho, o que tirava de Liam o ócio mental necessário para parar e avaliar o saldo do final de semana. No sábado, acordou na cama de Noah e percebeu nove chamadas perdidas de Nicole. Não retornou nem enviou mensagem, ciente de que a veria à noite e de que agora dispunha do cansaço do labor para justificar suas ausências.

Conversou com o pai, porém, em casa, única pessoa da mansão habilitada a esse tipo de diálogo, embora Alberto ele mesmo tivesse suas reservas e não falasse tão extensivamente com o filho (ou qualquer outra pessoa); era homem de poucas palavras e raramente as gastava. Em todo caso, sorriu meio sorriso quando o filho acabou de contar sobre a inauguração e o congratulou com três tapas-afagos no ombro, desejando-lhe sucesso, ainda mais sucesso do que na noite de inauguração.

No sábado, Evelyn conheceu o London. Levou consigo suas colegas de Santa Maura e foi embora cedo, mas não deixou de dar ao irmão os sinceros cumprimentos pelo trabalho, reconhecimento que muito satisfez o irmão em trans-constru-formação. Nesse final de semana, contudo, ao contrário do esperado, motivos de diferentes ordens levaram Téo e Nicole a não voltarem ao bar. O novo ritmo de vida de Liam certamente alteraria o já canônico costume das saídas semanais do trio. Os três se dariam, decerto, algum tempo para reprogramar os velhos hábitos.

Apenas na segunda-feira à tarde veio o momento de se sentar com o contador e fazer um primeiro balanço, seguido de algumas médias, hipóteses, regras de três e conjecturas para um futuro não tão distante. Se as coisas seguissem como haviam começado, as perspectivas eram boas; talvez em meados do ano seguinte Liam conseguisse, com boa administração, começar, aos poucos, a devolver o dinheiro que Alberto nele investira. Alugar um apartamento e sair da mansão também começava a fazer parte dos próximos passos a serem tomados—mas, claro: tudo ainda eram planos e nada mais.

Também na segunda-feira, depois do pôr do sol, Noah conheceu o London em funcionamento. Quando adentrou o bar, foi recebido pelo amado com um caloroso aperto de mão, pois em público os excessos deviam ser tolhidos (a estranheza do gesto foi indisfarçável, apesar da consciência de ambas as partes de que demonstrações públicas de afeto entre dois homens, no século XXI, ainda poderiam ser um problema).

Foi como levar alguém a um primeiro encontro, com poucas nuances de diferença. A conversa acontecia com a tranquilidade de sempre, mas a sensação de desconforto imediato durante as poucas lacunas de silêncio existia, e essa sensação era, evidentemente, fruto das censuras, tanto a moral quanto a social: não podia Liam nem tratar o dileto como tal por ser de amplo conhecimento que ele tinha uma namorada, como também não seria decorosa uma cena gay naquele lugar naquele momento (e de ambas as coisas Noah também sabia), mesmo que fosse ele o dono do pedaço.

Ainda na mesma segunda-feira, por volta das oito, o Inesperado fez uma daquelas surpresas. Entrando pelo bar com o capacete em mão e olhos para todos os lados, vinha Téo a passos lentos. Quando o avistou, Liam fez apenas sorrir com todos os dentes e chamá-lo pelo nome, estendendo um braço para que ele o localizasse. Apenas ao sentar-se novamente para anunciar a chegada do amigo é que o ocorreu que era Noah quem ainda estava consigo, e que conhecer Téo talvez não fosse do agrado dele. A expressão do rapaz, porém, ao ouvir aquele nome conhecido não foi o suficiente para denunciar o que se passava em sua cabeça.

— E aí, doutor? — cumprimentou Téo o amigo com um meio abraço.

— E aí?... — a duração do gesto foi o único tempo que Liam teve para pensar em como fazer as apresentações. — Téo, este é... o Noah. Noah... Téo.

O levantar de sobrancelhas de Téo parecia indicativo de que ele não esperava que aquele rapaz sentado junto a Liam fosse... ele.

— Tudo bem, Noah? — trocaram um aperto de mãos. — Prazer.

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora