Capítulo 7, parte 3

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O tempo ainda não estava bom. Liam acordou cedo, ou mais cedo do que geralmente costumava acordar, e viu o sol clarear pálido pela janela. Àquela hora, ao conferir o relógio, concluiu que Noah já estaria saindo de viagem para a cidade dos pais. Com os olhos cansados e o corpo preguiçoso, levantou-se e foi fazer sua higiene matinal, tendo em mente o tempo todo a estranha consciência de que, pela primeira vez, veria—e veria sem fazer a mínima ideia do que estes pensavam de si—os pais de Noah. Mil e duas coisas passavam por sua cabeça. Quanto eles sabiam afinal? Muitas dúvidas e inquietações o acompanharam até o momento da descida para a cozinha, onde os funcionários já circulavam.

— Bom dia... — cumprimentou, sonolento.

— Bom dia, seu Liam — Leda respondeu junto aos demais, tardando em aprender a parar de se dirigir ao patrão formalmente.

— Cadê todo mundo?

— Devem estar dormindo até agora... Mas por que o senhor acordou cedo? Ainda é clima de feriado por aqui.

— Eu vou viajar.

Sentou-se ao balcão, deitando a cabeça sobre os braços cruzados.

— Tá tudo bem? O senhor quer alguma coisa?

— Quero café, por favor...

Leda buscou o bule de café e um potinho de açúcar, deixando-os ao lado do patrão, que se serviu vagarosamente.

— O senhor tá com uma carinha tão preocupada... — a empregada disse.

Olhando-a com complacência, Liam sorriu, atestando sua incapacidade de esconder das faces seus sentimentos.

— Não tô muito bem mesmo, não... Um dia eu devo te conto o porquê.

— Ainda é o mesmo porquê da outra vez que o senhor ficou de me contar o porquê um dia?

Houve outra vez? Noah era motivo de tantas subidas e descidas emocionais que Liam já nem sabia quantas noites de sono perdera pela mera existência dele na Terra.

— Não lembro, mas, pra eu ter te dado essa resposta... provavelmente.

Leda torceu os lábios, frustrada por ter sido deixada para a próxima novamente.

— Tá bom. Fico esperando, viu?

E foi continuar seus afazeres. Liam sorriu, achando graça da preocupação da serviçal, que, dentre todas as pessoas que viviam consigo naquela mansão, era a única que notava suas alterações de humor mais indisfarçáveis.

Meia hora depois do café, Liam enviou mensagem a Noah:

[09h51] Liam: Bom dia, be. Já chegou?

[09h54] Noah: Oi be. Ja sim, ja conversei com os meus pais, pode vir quando quiser

[09h56] Liam: Beleza. To indo, chego em umas duas horas.

Não queria perder tempo. Foi para o quarto fazer as malas—ou a mala, pois não usaria roupas o suficiente para encher mais de uma mala—e aproveitou a manhã para dar satisfações a quem julgou necessário dá-las: avisou à empregada que viajaria e voltaria no primeiro dia do ano seguinte, desejando-lhe, de antemão, feliz ano novo; avisou à mãe que passaria a virada na casa de Noah, que agradecera mas declinara o convite de comemorar o réveillon com os Meirelles Prado; avisou a Téo que ficaria uns dias com Noah para tentar compensar o desastre do Natal e o agradeceu mais meia dúzia de vezes pela receptividade e pela disposição a ouvi-lo lamentar-se; avisou a Nicole que estaria com Noah, possivelmente incomunicável, sugerindo-lhe que aproveitasse sua ausência para passar algum tempo com os pais; avisou ao gerente do London que se ausentaria e solicitou que este se encarregasse de resolver por si qualquer problema de maior importância. Tendo deixado todos com todos os avisos possíveis, nada, absolutamente nada poderia entrar em seu caminho e estragar o ano novo que pretendia passar na mais absoluta paz ao lado de Noah.

Se Eu Tivesse um Coração (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora