Nervosinho

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Quando cheguei no bosque na manhã seguinte, vi que o que quer que tenha acontecido para deixar Charlie bravo, havia sido entre nosso treino e o café da manhã, porque ele não fez nenhuma questão de ser agradável quando me deu um oi seco e me puxou para o colo correndo comigo até o ringue de pedra.

Me deixou na grama devagar e subiu no ringue pegando as fitas para enrolar meus pulsos.

— Bom dia pra você também — eu disse colocando a mão na cabeça, tonta.

— Nunca me deu bom dia, não seja dramática — ele voltava para mim com as faixas em mãos.

Era verdade, mas o meu normal era responder ao seu bom dia, que geralmente acompanhava um “lindinha”, com “oi”. Não por que eu era mal educada, às vezes meio birrenta, mas não queria parecer amigável demais às suas cantadas provocativas.

Se ajoelhou à minha frente e puxou meu braço começando a enfaixar meu pulso, mão e dedos rapidamente, tão rapidamente que nem conseguia acompanhar os movimentos com os olhos.

Fiquei em silêncio enquanto ele fazia o mesmo na outra mão.

— De pé — ele simplesmente se levantou e voltou para o ringue.

Esfreguei os olhos que ainda estavam um pouco sonolentos e me levantei, notando que Charlie analisava todos meus movimentos com calma. Senti vontade de ser irônica e perguntar se tinha algo errado com a minha cara, mas me contive, com preguiça e, sinceramente, com medo dele ser grosso igual Nick a ponto de eu não suportar mais a presença dele.

— Aquecimento — ele disse cruzando os braços — depois reflexos.

Assenti. Charlie me olhou em silêncio alguns segundos e depois indicou a ponta do ringue com o maxilar.

— Agachamento, pulos e corridinha — ele disse a última parte de forma pejorativa como se uma “corridinha” fosse o máximo que eu conseguisse.

Comecei com os agachamentos, que sinceramente, eram péssimos, mas era o menos péssimo dali. Dei duas voltas no ringue assim, e como Charlie não disse nada, o olhei esperando uma confirmação.

— Pulos — disse apenas.

Ok, falaria só o necessário, maravilha.

Terminei o aquecimento já me sentindo cansada, como sempre ficava, mas endireitei a coluna e fui para o X que Charlie havia acabado de riscar com giz no chão.

— Sua telecinese não funciona aqui, então tente não levar uma bolada na cara — foi até uma coisa preta, e quando tocou nela, várias “saídas” foram reveladas, supus que sairiam bolinhas por ali — nível um — disse para a máquina.

— Nível um: desvio e agilidade — a máquina disse, era a voz grossa de um homem que me fez estremecer um pouco.

— Não saia do X — Charlie disse ao lado da máquina e de frente para mim.

A primeira bolinha laranja saiu e eu abaixei a cabeça desviando, eram muitos buracos para me concentrar e notei na segunda bolinha que não sairia na ordem, então precisava realmente ficar atenta.

Levei uma bolinha no ombro, mas foi de raspão.

Ficamos muitos minutos naquilo, já estava ficando ofegante só por desviar daquelas malditas bolinhas.

— Nível um concluído — a máquina disse.

Charlie assentiu para si mesmo e simplesmente sumiu. O procurei com os olhos e não o achei, até ver que ele estava parado ao lado da máquina de volta, e todas as bolinhas que estavam na grama e ringue haviam sumido.

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