Capítulo 26 - Ameaça incompreensível

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KEVIN:

  Depois que Kali entrou em sua casa, montei na minha moto, coloquei o capacete e parti de volta para minha mansão. Um sorriso arrogante se estampou em meus lábios.

  — Isso foi moleza! — pensei animado.

  Eu havia vencido a primeira etapa da aposta, e parecia ter sido extremamente fácil.

  No momento seguinte, tive que frear a moto bruscamente por causa do semáforo vermelho. Enquanto estava parado, meus pensamentos voltaram para a cena do beijo que compartilhei com Kali, e para minha surpresa, ela o retribuiu. Ainda sinto meu coração acelerar com essa lembrança.

  O sorriso vitorioso em meu rosto começou a desvanecer quando uma dúvida repentinamente assolou minha mente. Uma sombra de preocupação se instalou praticamente em meus pensamentos.

  — Droga, o que está acontecendo aqui?! Eu estava tão confiante, mas agora... Será que caí em uma armadilha? — pensei em choque.

  Lembro-me de seus avisos  enigmáticos que Kali costumava mencionar toda vez que eu chegava perto dela. Logo, comecei a questionar a rápida mudança no comportamento dela. As atitudes arrogantes e desafiadoras de Kali desapareceram tão rapidamente que eu peguei pensando se tudo não passava de um teatro dela.

  — Estranho... Ela estava mesmo interessada em mim ou tudo não passou de uma encenação? Será que eu me deixarei levar pelas palavras dela? — questionei baixinho, desconfiado.

  Uma incerteza cresceu em meu peito, e eu me vi em um dilema de dúvidas sobre os verdadeiros interesses de Kali. Será que ela descobriu sobre a aposta? Não, não deve ser isso. Deve haver outro motivo por trás.

  — Preciso entender o que está acontecendo. Essa incerteza está me consumindo. A Kali não pode ter virado o jogo tão facilmente, certo? — reclamei frustrado com tal possibilidade. 

  Finalmente, a cor do semáforo mudou, e pude seguir meu caminho. Enquanto pilotava pela rua, algo me chamou a atenção. Naquele bairro, próximo a casa de Kali, numa esquina havia entre dois estabelecimentos de luxo: um local precário e abandonado, destoando completamente do ambiente ao redor.

  De repente, surgiram vários flashes em minha mente, e logo uma dor latejante atingiu minha cabeça, a ponto de desviar a atenção em meio a estrada. Distraído, não percebi um carro entrando na minha frente. O impacto foi significativo, a moto colidiu com a traseira do veículo. 

  Caí ao chão e, ao recuperar a visão, deparei-me com uma luz ofuscante para o céu. E nele vi uma jovem mulher, mais nova e de pele negra, que encarava-me com olhar assustado.

  Ergui meus dedos para o céu com dificuldade, como se tentasse tocar o rosto da jovem moça de olhar assustado. 

  — Quem é você? — murmurei rouco. 

  No entanto, a adolescente misteriosa desapareceu de repente. Minha mente girava de dor latejante, pisquei algumas vezes, mas nada fazia essa tensão corporal aliviar. Todo o meu corpo estava fraco e dolorido, desmaiei sob o último raio de sol do entardecer.


  Mergulhado numa escuridão profunda, me vi num vazio perturbador e intimidador. De repente, a mesma adolescente negra e misteriosa surgiu à minha frente, porém, a cada movimento que fazia em sua direção, ela se dissolvia na penumbra.

  — Por que me persegue? —  ela sussurrou, suas palavras ecoavam no vazio. 

  Confuso e inquieto, eu a questionava:

  — Quem é você? O que está acontecendo? 

  Mas ela permanecia em silêncio.

  — Deixe-nos em paz! — a voz dela ressoou pela escuridão. 

  Eu tentei entender suas palavras, mas tudo se intensificava na maior negridão ao meu redor, obscurecendo minha visão.

  — Fique longe da minha família! — ela anunciou num tom de ameaça, e apenas senti as palavras dela vibrando no ar. 

  Desesperado por respostas, gritei assustado com aquilo:

  — O que você quer de mim, afinal?!

  No entanto, apenas o silêncio ecoou, sem resposta alguma, enquanto eu me via afundando mais na escuridão abissal. 

  De repente, a garota surgiu diante de mim, cara a cara, sua aparição inesperada acabou me pegando de surpresa. Contudo, havia um elemento intrigante: o rosto dela estava encoberto pela escuridão, apenas seus olhos eram visíveis, iluminados em meio à penumbra.

  — O que você quer? Dinheiro? — perguntei outra vez, incomodado.

  — Justiça! — ela clamou ferozmente.

  Eu estava confuso, sem compreender o significado de suas afirmações. Eu não sei do que ela estava falando, e nem sequer a conhecia.

  Ela me encarou profundamente e revelou que o sofrimento que eu causei em sua vida seria retribuído. A garota misteriosa afirmou diante de mim que a justiça seria feita, independente de ser justa ou não, boa ou má.

  — Pagarás pelo que fizeste à minha família desde que entrou no restaurante naquele dia, Kevin Bittencourt. — ela profetizou, com suas palavras ecoando como um veredicto sombrio. 

  Eu me sentia cada vez mais envolvido por uma sensação desconcertante de culpa e medo, sem entender completamente as implicações do que a adolescente afirmava.

  — Quem é você?

  — Você saberá conforme o tempo. Esteja avisado. — ela falou, desaparecendo por completo.

  De repente, sinto um incômodo nos olhos e ao abri-los lentamente, percebo a presença de meu pai e Iolanda. Viro a cabeça suavamente para o lado, e percebo que estou em casa, no meu quarto.

  — Pai...? — o chamei, quase rouco.

  Então meu pai me dirige um olhar preocupado, e chega bem perto de mim, agradecendo-o por não deixá-lo.

  — O que está acontecendo? O que houve? — perguntei sem entender.

  — Você não se lembra, filho? Você sofreu um acidente. O médico já veio aqui e disse que você ficará bem. Não sabe o quanto me preocupei com você, Kevin! — ele exclamou com uma voz chorosa.

  Aquela foi uma cena angustiante. Desde a morte da minha mãe, eu nunca tinha visto meu pai chorar. Fiquei comovido que apesar de nossas brigas tão intensas, ele parecia ter um pouco de carinho por mim.

  — Eu estou bem, pai. — afirmei. — Apenas quero descansar. 

  Meu pai assentiu, e junto com Iolanda, saiu do quarto, deixando-me sozinho. 

  — Quem era aquela menina? — pensei angustiado. — Se o acidente foi mesmo real, então aquela garota também é. Por que não consigo me lembrar dela?









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