Capítulo 19 - Escolho você

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KALI:

  Meus olhos percorriam pela sala do delegado, e, de repente, fixaram-se em um porta-retrato de madeira pendurado na parede branca, ao lado do sofá azul. Nele, o delegado segurava seu diploma de formação, ao lado de uma senhora negra de sorriso amável e olhos profundos. Aquela senhora era a mesma que me abordara na rua, entregando-me o panfleto. Um arrepio percorreu meu corpo ao pensar na conexão entre elas.

  — Quem é essa mulher no retrato? — questionei, incapaz de conter minha surpresa e temor.

  O delegado esboçou um sorriso radiante ao falar dela. 

  — Essa é minha mãe adotiva. — ele  revelou. — Linda, não é?

  Fiquei chocada, pois o Sr. Brown havia afirmado anteriormente que sua mãe adotiva já era falecida. A confusão tomou conta de mim, e eu não pude deixar de indagar: 

  — Como isso é possível? — pensei atordoada. 

  Meus pensamentos demoraram muito quando o delegado chamou meu nome, trazendo-me de volta à realidade. Ele pediu que eu me sentasse para a entrevista, e assim o fiz, tentando manter a compostura diante da situação. O delegado, Anthony, começou a fazer suas perguntas, e eu respondi com a sinceridade que sempre carreguei.

    Para ajudá-lo a entender o que estou dizendo, entreguei minha pasta, onde continha todos os empregos que já trabalhei. Ele pegou de minhas mãos sutilmente, folheando a pasta que eu trouxera, parecia um tanto surpreso com a quantidade de empregos que eu havia acumulado ao longo do tempo. Sua expressão denunciava curiosidade e, talvez, uma compreensão crescente da minha jornada.

  Por fim, o delegado me dirigiu um olhar inquieto sobre mim.

  — Se quiser perguntar, por favor, faça. — falei gentilmente.

  — Pelo seu histórico Kali, você é uma moça que não tem limites! — ele brincou no início. — Mas algo me intriga. Por que você nunca conseguiu permanecer em nenhum dos seus empregos anteriores? — ele questionou.

  Aquele momento, tentei não ser tão emotiva na hora de falar, pois esse assunto por mais que me doa, era a realidade que sempre vivi.

  — Bom... Acontece que em todas as minhas experiências no trabalho havia discriminação em relação ao meu tom de pele. Quase sempre as pessoas me criticavam por quem eu devia ser com base nisso. Quando acontecia algo urgente no trabalho, os funcionários jogavam a culpa em mim, diziam que eu não tinha capacidade suficiente para estar naquele emprego. — expliquei, emocionada.

  Vi uma ocorrência genuína no rosto do delegado. A empatia brilhava em seus olhos, algo que eu não esperava encontrar.

  — Eu sinto muito por tudo o que você passou, Kali. É inaceitável que alguém seja tratado assim. — ele falou de maneira zelosa comigo.

  — Obrigada, delegado. Infelizmente, não é uma luta fácil, mas estou determinada a superá-la! — suspirei, enxugando as lágrimas de minha face. 

  — E quanto aos seus sonhos, Kali? O que você quer alcançar? — ele perguntou curioso. 

  — Meu sonho é abrir meu próprio negócio, uma confeitaria. Sempre amei a culinária, especialmente os doces. Quero criar algo que me permita prosperar e mostrar às pessoas que todos merecem uma chance, independentemente de sua cor e origem. — confessei, sorrindo de alegria.

  — Admiro sua determinação, Kali. — ele comentou.

  — Obrigada, delegado. — agradeci.

  — Por favor, aqui você pode me chamar normalmente. Não estamos mais numa delegacia. — ele falou sorrindo de volta.

 — Está bem, senhor Anthony. — respondi educadamente.

  As palavras dele ecoaram em minha mente, deixando-me intrigada sobre o que o destino ainda reservava para nós dois. Anthony observa-me por um momento durante um longo tempo, deixando-me levemente constrangida.

  — O que foi? — indaguei sem entender.

  — Parabéns, Kali! Você é a escolhida para trabalhar aqui! Eu gostei da sua personalidade! — elogiou o delegado.

  — Muito obrigada, senhor Anthony. Eu prometo fazer o meu melhor! — exclamei determinada. 

  — Ótimo. Por enquanto, eu vou descansar um pouco no quarto. Comece pela sala, por favor. E depois para o escritório. Combinado? 

  Balancei a cabeça com um sorriso nos lábios, grata pela oportunidade que ele me deu. 

  Começo a realizar as tarefas, consciente de que este é um novo começo e talvez uma mudança positiva em minha vida. O som dos passos de Anthony se afastando indica que é hora de eu começar a mostrar meu profissionalismo na limpeza.

  Enquanto eu cuidava da limpeza na sala, meus olhos foram novamente atraídos pelo retrato da mulher negra na parede. Uma sensação de apreensão se instalou em mim, quase como se eu temesse ter me encontrado com um fantasma. Contudo, eu me forço a afastar esses pensamentos, concentrando-me nas tarefas que necessariamente foram me designadas.

  Com o chão limpo, passei o esfregão para finalizar a tarefa, sem perceber que o piso agora estava um pouco escorregadio. De repente, a voz do delegado ecoou ao abrir a porta do quarto.

  — Vou pegar um energético na geladeira. — ele falou, quando passou por mim.

  Antes que pudesse reagir, ele deu um passo na sala, mas o piso traiçoeiro fez com que seus pés escorregassem. Agi instintivamente, largando o esfregão e correndo para segurá-lo pelo roupão, evitando uma queda desastrosa. No entanto, o impulso nos levou ao sofá, onde caímos juntos. Risos nervosos preencheram o ambiente enquanto nós se recuperávamos da situação inesperada.

  — Ops! Parece que o chão quis pregar uma peça em nós! — brinquei.

  — Graças a você, escapamos de um tombo maior. Boa tentativa, Kali! — ele riu de volta. 

  Aquele momento inusitado criou uma aproximidade entre nós, e compartilhamos risos enquanto permanecíamos no sofá, olhares cheios de cumplicidade que se estabeleceram em uma conexão emergente.

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