• Maiara Pereira •
Eu pensei que nada mais poderia me derrubar depois da morte da minha mãe, mas a minha reação com a partida do Nenê me mostrou que eu estava muito enganada. Minha família buscou Felipe, que não parou de chorar por nenhum minuto, sem entender nada. Eu também chorava, um lamento dolorido enquanto me sentava no chão, debruçada sobre a cama da figura paterna com quem tive o privilégio de conviver, mesmo que por pouco tempo.
Isis se sentou na beirada, passando as mãos pelo meu cabelo, como se o afago fosse capaz de remendar o meu coração atormentado. Os filhos dele estavam vindo à cidade e eu queria sumir daquela casa antes de ter de olhar na cara daqueles ingratos.
Sentia ódio deles, mesmo sem saber o motivo pelo qual nutriam desprezo pelo pai. Eu era capaz de sentir as nuances da alma das pessoas e tinha a absoluta certeza de que Nero Baltazar não havia sido um homem mau, ou um pai ruim. Pelo menos não de forma intencional.
Maiara: Não acredito, Isis. Não acredito! — Soquei o colchão, erguendo a cabeça para encará-la. A pele do seu rosto, antes muito branca, estava bem avermelhada. Os olhos tão inchados quanto os meus.
Isis: Maiara... eu sinto vontade de morrer, mas tenho tantas responsabilidades deixadas por ele...
Maiara: Você e ele...?
Ela assentiu com o seu semblante abatido.
Isis: A culpa por ser um pouquinho feliz, anos depois da morte da esposa, destruiu tudo. Um dia ele acordou e decidiu que precisava sofrer até o fim da vida, para pagar por um único erro. Mesmo sem ter ouvido de sua própria boca, eu sei que Aline o condenou quando nos descobriu e Nero apenas aceitou a sentença. Apenas aceitou. — As lágrimas escorriam enquanto ela contava.
Maiara: Qual o problema daquela fedelha dos infernos? — questionei com a raiva pulsando em minhas têmporas.
Isis: Ela não é filha dele... O que sei é que, mesmo tentando tratá-la como se fosse, a menina o odeia desde uma situação que o pai presenciou.
Maiara: Como assim, Isis? Me explica pelo amor de Deus! Preciso entender!
Isis: Ah, Maiara...
Maiara: Isis, chega de segredos! — Me levantei e segurei com as duas mãos em seu rosto.
Isis: Não sou psiquiatra para diagnosticar uma adolescente, mas tudo leva a crer que a menina tem algum tipo de sentimento perverso dentro dela. A família tinha um cachorrinho filhote, e um dia ele sumiu... Aline chorou a morte dele, foi a que mais ficou triste, porém Nero a encontrou escondida no jardim ao anoitecer.
Maiara: O que ela fez? — Me sentei ao lado de Isis, apreensiva.
Isis: Estava enterrando o bichinho dentro de uma caixa, com certa satisfação... Nero abriu a caixa e viu o peludo esfaqueado. Ela matou o cachorro, enterrou as roupas sujas, a faca e escondeu a caixa para depois cavar um buraco mais fundo. — Meu choque era tão intenso que minha boca não parava fechada. — Contou a todos que o filhote sumiu, chorou muito e depois... foi enterrá-lo escondida.
Maiara: Meu Deus...
Isis: Para proteger a menina, ele não disse nada a ninguém... Mas me contou que a partir desse dia, quando os dois estavam a sós, a versão doce e meiga que a menina costumava ser, desapareceu.
Maiara: Mas ela nunca foi meiga comigo.
Isis: E nem comigo, porque me via como inimiga. Mas eu já assisti ao seu comportamento perto dos irmãos. A expressão facial muda por completo.
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A parte que me faltava
FanfictionMaiara Pereira é uma jovem modesta e previsível, com o sonho de passar no vestibular para medicina, até que sua patroa a convidou para uma festa de boas vindas e exigiu sua presença na noite que mudou sua vida completamente. Fernando Zorzanello é a...