• Fernando Zorzanello •
Três horas após o telefonema, eu estava no escritório que Nero Baltazar ocupava quando vivo, em sua casa, com Natália Hozaki, uma das advogadas mais atuantes em direito sucessório da minha equipe. A energia da casa não estava pesada, mas o luto pairava sobre a cabeça de todos como uma névoa densa e obscura.
Assim que adentramos o escritório e a porta se fechou, as descobertas fizeram as coisas se esquentarem.
Júlio intercalava entre ataques de raiva e choros doloridos. Aline não deixava escorrer uma lágrima, parecia estar em choque. Sentada na poltrona, cabisbaixa, apoiava uma das mãos na cabeça. Thomas abria a boca apenas para vociferar palavras chulas em alto e bom som, ou questionar coisas banais. Pedro, que estava no Japão, pegou o primeiro voo para o Brasil.
Pedi para que Natália se sentasse na cadeira da mesa em L, porque estava de saltos altos, e fiquei em pé ao lado dela. Observei por um momento uma linda miniatura de avião na estante, enquanto pensava no que dizer. À nossa frente, se sentavam Júlio e Thomas, em cadeiras de madeira. Aline se encolhia na poltrona próxima da porta.
Fernando: Thomas, preciso que se comporte como homem imediatamente ou me reunirei apenas com Júlio e Aline — exigi.
Minha amizade com Júlio não incluía aceitar um garoto mimado como o irmão dele, me dando ordens descabidas.
Thomas: Doutor — pronunciou em tom de zombaria —, se não acha um absurdo o que está acontecendo aqui, não deve ser normal das ideias.
Júlio: Cale a porra da sua boca, Thomas! — Júlio interveio. — Se existe alguém que encontra soluções, esse alguém é o Fernando. Respeite! — O mimado fechou a cara e pareceu pôr um zíper na boca.
As revelações foram impactantes. Por saber do contexto e da história dos filhos do Nero com ele, entendia o porquê de ele ter destinado metade de toda a sua fortuna para a suposta cuidadora.
Cuidadora ou amante?
Tudo se tratava de suposições.
A advogada do falecido, que parecia abominar Júlio, fez questão de informá-lo de que havia um testamento nesses termos, durante uma discussão acalorada. E, para piorar, o filho da cuidadora havia sido reconhecido como herdeiro do Nero Baltazar. Tornando-se herdeiro necessário, participaria da partilha dos bens.
Fernando: Não acha melhor lidarmos com o suposto testamento após a autópsia e procedimentos funerários? — questionei.
Natália: Seria o ideal — Natália anuiu.
Thomas abriu a boca para responder e desistiu, entendendo que sua opinião não era mais solicitada. Júlio ficou pensativo.
Aline: Se posso opinar... — sussurrou Aline ao se levantar, passando as mãos pelo vestido preto. Assenti para que continuasse. — Quando ainda podia vir à minha própria casa, convivi com a Maiara, e posso garantir: ela fez tudo de caso pensado.
Fernando: Explique.
Aline: Já a ouvi colocando meu pai contra mim, andava de roupas curtas e provocativas pela casa... A Carla, uma das funcionárias, me contava tudo. O filho não é do papai.
Fernando: Tenho conhecimento, Júlio me contou.
Aline: Mas ela forçou a convivência pra que eles se apegassem! Carla me contou que ela saía para se prostituir e deixava o filho pequeno pro meu pai cuidar! Nunca senti tanta revolta na vida. Me sinto tão mal! — Havia ódio em sua pronúncia. A tristeza deu lugar à mágoa.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A parte que me faltava
FanfictionMaiara Pereira é uma jovem modesta e previsível, com o sonho de passar no vestibular para medicina, até que sua patroa a convidou para uma festa de boas vindas e exigiu sua presença na noite que mudou sua vida completamente. Fernando Zorzanello é a...