Capítulo 29

277 32 9
                                    

• Fernando Zorzanello •

Escolher uma hospedagem no campo não havia sido intencional. Enquanto rolava pelo aplicativo de reservas para substituir a minha estadia, me deparei com uma cabana no alto de uma montanha e desejei ter a experiência. Por ser uma cidade pequena, até o hotel mais afastado ficava próximo do centro dela.

Se naqueles dias, com a cabeça me preocupando apenas com a Maiara, foi difícil dormir, imaginava como seria ao ter Felipe em meus pensamentos também.

Os anos de noites mal dormidas cobraram seu preço. Tinha apenas 31 anos, mas sofria de insônia. Se houvesse uma data limite apertada para cumprir, parava de viver para alcançar o meu objetivo. A ansiedade de um prazo se esgotando me paralisava e eu abominava descompromisso profissional.

Entendia que o objetivo principal de estender a minha viagem era encontrar Maiara e convencê-la a termos uma conversa, e o objetivo secundário era, de fato, descansar um pouco. Senti um desejo descomunal de permanecer na pequena cidade, mas só depois de ver aquele garoto esperto, entendi o porquê.

Só parei de divagar sobre a minha nova realidade quando estacionei em frente ao meu chalé. Pedi para que ela não falasse nada durante o percurso e ela acatou meu pedido. Me contive e não me virei para olhá-la, mesmo que de esguelha. Mantive os olhos apenas na estrada.

Ainda com raiva, cogitei não abrir a porta para ela, mas eu sempre abria a porta para qualquer mulher que fosse. A filha de uma puta que me deixou sem dizer adeus, me fez procurá-la por incontáveis meses e me escondeu um filho, sim, mas ainda era uma mulher, ainda parecia ser a única que me interessava.

Tímida, com o olhar abatido e se preocupando em abaixar o vestido curto que expunha suas pernas firmes, desceu do carro. Foi atingida pelo vento frio e abraçou o próprio corpo.

Não ofereça um agasalho.

Deixe-a passar frio, ela merece.

Fernando: Vamos entrar. Lá dentro tem uma lareira — sugeri com frieza, ignorando as vozes da minha cabeça. Não esperei por sua resposta, segui em direção ao tablado de madeira que levava até a porta, presumindo que ela me acompanharia.

Peguei a chave do bolso do terno para destrancar o chalé e caminhei para o interior ao mesmo tempo em que removia o blazer. Subi as mangas da camisa para acrescentar lenha na lareira, que ficava entre duas grandes janelas, e ouvi o som da porta se fechando. Olhei de relance e ela estava estática ao lado da porta, sem dar um pio.

A cabana era dividida entre uma espécie de sala e, do outro lado, havia uma cama extensa, super king. Uma banheira oval de um modelo mais antigo também se dispunha no canto direito do quarto, sem nenhuma parede ao redor, e ao lado dela, a entrada do banheiro privativo. O piso era de cerâmica clara, mas todos os móveis eram de madeira escura, assim como o teto e as janelas.

Garanti que a lareira estivesse a todo vapor e arrastei duas cadeiras de bambu, que compunham a decoração, para frente dela. Me sentei em uma e então deixei que nossos olhos se encontrassem.

Fernando: Sente-se, Maiara.

Seu caminhar até a cadeira foi apreensivo. Parecendo estar indecisa sobre se sentar ou não, repousou a mão no encosto e me direcionou um olhar preocupado.

Maiara: Quero que você me deixe falar primeiro... — Assenti e gesticulei para que ela prosseguisse. — Antes de tudo, imploro para que você não tente tirar o meu filho de mim. Não posso viver longe dele, Fernando, por favor.

Encarei-a com descrença por seu discurso. Deixei o meu rosto se franzir, demonstrando minha repulsa pelas suas palavras. Aos olhos dela, eu deveria ser o pior homem do mundo.

A parte que me faltavaOnde histórias criam vida. Descubra agora