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O silêncio na mesa é tão desconfortável que chega a ser palpável.
Eu não sei a quanto tempo meu corpo está tensionando, mas estou tão incomodada quanto a primeira vez que tive que ir a um ginecologista. Minha raiva do dia anterior passou, mas é claro que eu permaneço chateada pra caramba. Principalmente considerando que de ontem para hoje, foi a primeira vez em onze anos de casamento, que eu e meu marido dormimos em cômodos separados.
Eu não consegui dormir direito. Honestamente, devo ter cochilado por uns quarenta e cinco minutos nessa noite. Por isso acabei dando uma exagerada na maquiagem esta manhã, não querendo parecer um cosplay de panda Japonês na hora de ir trabalhar. No meio da noite, antes de conseguir dar uma cochilada ridícula e inútil, eu levantei para ver onde Leon estava, já que nosso apartamento nunca esteve tão silencioso.
Ele não estava na sala e muito menos no quarto de hóspedes. Achei estranho, peguei o meu celular para ligar para ele cogitando, já completamente desesperada, a ideia que ele saiu de casa por estar extremamente aborrecido. Mas aí eu vi a luz escapando pela fresta inferior da porta, ele estava no escritório dele.
Eu caminhei até lá e vi que a porta estava apenas escorada. Abri-a lentamente e de cara tive a visão de meu marido dormindo sob a mesa. Parecia exausto e isso me encheu de culpa ao ponto de que eu senti meu estômago embrulhar. Foi a pior sensação que já senti em toda minha vida. Então eu adentrei o lugar, tremendo em ansiedade por me questionar se deveria ou não acordá-lo. Fiquei com medo dele ainda estar chateado comigo e gritar outra vez. Acabei não o acordando.
Mas assim que ergui o rosto para a direita do cômodo, vi algo que tirou meu fôlego completamente. O quadro branco de Leon completamente abarrotado, mas o que mais chamou minha atenção foi o título de todo seu trabalho: "como resolver toda essa merda". E abaixo, abarrotando todo o quadro em letras miúdas e em vários pequenos quadros para separar as situações, ele tentava encontrar formas de me ajudar com o processo e não vacilar com sua própria cliente.
Engoli em seco e meus olhos se encheram de água, acabei dando a volta e fiquei de pé ao lado de meu marido debruçado sob a mesa, usando ambos os braços como travesseiros. Acariciei seus cabelos lentamente e quando ele murmurou algo de modo sonolento, eu me afastei na mesma hora. Corri pro quarto, me deitei, me escondi debaixo do edredom e tornei a chorar como louca até pegar no sono. Quer dizer, até eu cochilar.
Agora estamos "tomando café" como habitualmente fazemos juntos antes de irmos trabalhar. Leon está olhando uma pasta de arquivos, estudando algum caso que não estou ciente enquanto toma café e termina o prato de panquecas. Pensei que nos resolveríamos assim que nos sentássemos juntos à mesa, já que ele também fez a gentileza de fazer meu café enquanto eu ficava quarenta minutos trancada no banheiro, escondendo minhas olheiras com maquiagem. Mas não foi nada disso.
