•Capítulo 38•

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Ayume Martins.

Cinco anos se passaram desde que a Luna nasceu, e muita coisa mudou na nossa vida. Eu olho ao redor e vejo o quanto crescemos, o quanto o tempo moldou cada um de nós, como uma escultura sendo esculpida lentamente pelas mãos de um artista invisível. Nossa casa no Complexo da Maré se tornou um refúgio em meio ao caos da vida que levamos. Não é uma vida fácil, mas é a nossa vida, construída com amor, luta e, às vezes, sacrifício.

O Puma... bom, o Puma nunca largou o crime. Eu sabia, desde o início, que essa seria uma batalha que eu nunca ganharia. Ao contrário, ele só subiu mais na hierarquia, se tornando um dos nomes mais respeitados aqui na comunidade. Respeitado e temido. Às vezes, eu fico acordada à noite, preocupada com o que pode acontecer, com os perigos que ele enfrenta todos os dias. Mas ele sempre me diz para não me preocupar, que ele sabe o que faz. E, de certa forma, eu aprendi a confiar nisso, a confiar nele.

Eu continuei com a minha carreira, firme e forte. Trabalhar como médica na UPA daqui da comunidade é uma das coisas que mais me dá orgulho. Eu cresci com esse sonho, e apesar das dificuldades, consegui realizá-lo. Ser médica aqui não é só uma profissão, é um chamado. Ajudar as pessoas do lugar onde eu moro, estar lá para quem mais precisa, é algo que me dá um senso de propósito que nada mais poderia me dar.

Com o tempo, meu pai acabou aceitando o Puma como genro. Foi difícil, claro, mas acho que ele percebeu que o nosso amor é real, e que, apesar de tudo, o Puma sempre esteve ao meu lado, me protegendo, me amando da forma que só ele sabe. Hoje, meu pai até vem para os churrascos que fazemos aqui em casa, e embora ele e o Puma não sejam os melhores amigos, eles se respeitam. Isso, pra mim, já é uma grande vitória.

Hoje é dia de churrasco. Estamos todos reunidos na área externa da nossa casa. O cheiro de carne assando, o som das risadas, as crianças correndo pra lá e pra cá... é um daqueles dias em que tudo parece estar no lugar certo. Puma está ao meu lado, conversando com o pessoal, mas eu noto que ele sempre mantém um olho na Luna, como se quisesse protegê-la de qualquer coisa que pudesse acontecer.

A Luna, nossa pequena, está brincando com as outras crianças. Ela tem cinco anos agora, uma mistura perfeita de nós dois. A energia dela, a curiosidade... às vezes, me vejo nela, e isso me faz sorrir. Ela é o nosso mundo, a razão pela qual continuamos lutando todos os dias.

De repente, Rafinha, o filho do Pascoal, aparece do nada, com aquele jeito atrevido e engraçado que só uma criança pode ter. Ele tem seis anos, mas já acha que é um homem feito.

— Tia Ayume, eu vou namorar a Luna um dia, sabia? — ele solta, sem nem pensar duas vezes, com a maior convicção do mundo.

Eu não consigo segurar o riso, mas olho pro Puma e vejo que ele tá com aquela expressão de "sério isso?" que só ele sabe fazer. Ele dá uma olhada rápida pro Rafinha, e eu posso ver que ele tá tentando não rir também, mas ao mesmo tempo, não quer deixar passar em branco.

— É mesmo, moleque? — Puma pergunta, com um tom que parece brincadeira, mas que deixa claro que ele tá de olho.

Rafinha, sem perder o pique, responde na mesma hora.

— Claro que é, tio Puma! A Luna é minha melhor amiga, e eu gosto dela. — Ele diz isso com tanta seriedade que é impossível não achar graça.

Puma balança a cabeça, e dessa vez, ele não segura o riso. Mas tem algo nos olhos dele, um cuidado, uma proteção que só aparece quando o assunto é a Luna.

— Vai nessa, Rafinha. Mas lembra que a Luna é minha princesinha, hein? — ele fala, e apesar do tom leve, eu sei que ele tá marcando território.

Luna, que estava por perto, ouve a conversa e vem correndo até mim. Ela é tão linda, com aquele sorriso que ilumina tudo ao redor. Ela sobe no meu colo e me abraça, e eu sinto um calor no peito, um amor que não consigo descrever.

— Mamãe, o Rafinha é bobo, né? — ela diz, com aquele jeito inocente que só as crianças têm.

— Não, meu amor, ele só gosta de você — respondo, acariciando o cabelo dela.

Puma puxa a Luna para o colo dele, e eu vejo o quanto ele é babão por ela, mesmo que tente esconder. Ele beija a testa dela e sussurra algo que não consigo ouvir, mas que faz ela sorrir ainda mais.

Enquanto eu observo essa cena, penso em tudo que passamos nesses cinco anos. A vida não foi fácil, mas conseguimos criar algo bonito, algo que vale a pena. Eu olho ao redor, vejo as pessoas que amamos, as crianças brincando, o sol brilhando lá fora, e sinto uma paz que não tem preço.

A realidade do Complexo da Maré é dura, mas conseguimos encontrar felicidade nas pequenas coisas, nos momentos compartilhados, no amor que nos une. E isso, no final das contas, é tudo que importa.

Lance BandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora