•Capítulo 27•

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Ayume Martins.

A luz da manhã filtrava suavemente pelas cortinas quando abri os olhos. A realidade da viagem iminente ao Rio, à Maré, começou a pesar sobre mim como uma manta densa e pesada. Ao meu lado, o espaço na cama estava vazio; Puma já estava de pé, provavelmente preparando as coisas para nossa partida.

No pé da cama, encontrei um moletom e uma calça jeans cuidadosamente dobrados, deixados para mim como um lembrete silencioso de que não havia tempo a perder. Vesti as roupas rapidamente, sentindo o tecido frio contra minha pele ainda aquecida pelo sono. O moletom era grande e confortável, envolvendo-me com a lembrança de seu dono.

Ao sair do quarto, encontrei Puma na cozinha. Sua postura era rígida, a expressão fechada e séria, o olhar distante. Ele estava diferente do Puma de horas atrás, que compartilhava sorrisos e toques suaves sob a manta. Agora, ele parecia revestido de uma armadura emocional, o líder frio e calculista necessário para enfrentar o que nos aguardava.

— Está pronta? — Sua voz era firme, o tom autoritário trazendo à tona o líder que ele era lá fora, em seu território.

— Sim, estou pronta. — Respondi, tentando mascarar qualquer hesitação que pudesse sentir.

— Ótimo. Vamos. — Ele se virou, sem esperar uma resposta, e eu segui rapidamente atrás dele.

Ao sair, a cena diante de nós era como algo tirado de um filme de ação. O local, um sítio isolado, estava agora repleto de carros blindados e homens armados que se movimentavam com uma eficiência que só vem com a prática e a necessidade. O ar carregava uma tensão palpável, cada homem ali ciente do papel que desempenhava naquela operação meticulosamente orquestrada.

Puma caminhou em direção a um dos carros, um gesto de sua mão suficiente para que os homens se organizassem ao redor dele. Eu o segui, tentando não parecer tão deslocada quanto me sentia.

— Entre no carro. Vamos direto para a Maré. Não fale com ninguém a menos que eu diga. — Sua instrução foi dada em um tom baixo, mas claro, dirigindo-se a mim sem fazer contato visual.

— Entendido. — Afirmei, enquanto me acomodava no banco traseiro de um dos veículos blindados.

Puma entrou depois de mim, o espaço confinado do carro amplificando a distância emocional que ele colocara entre nós. Ele checava seu celular, seus dedos deslizando pela tela com uma rapidez que refletia a urgência da situação.

A viagem foi silenciosa, o único som era o ronco suave do motor e o ocasional crackle do rádio de comunicação. Puma parecia perdido em seus próprios pensamentos, o cenho franzido em concentração ou preocupação.

Eu observava o cenário mudar à medida que nos aproximávamos do Rio, a paisagem urbana começando a tomar forma. O peso do que estava por vir começava a se tornar real, e, apesar da frieza de Puma, eu sabia que ele estava tão ciente da gravidade da situação quanto eu, talvez até mais.

— Puma, — comecei, hesitante, querendo quebrar o silêncio pesado. — Tudo vai dar certo, não vai?

Ele finalmente me olhou, seus olhos encontrando os meus por um breve momento antes de voltar a olhar para frente.

— Vai sim. Só precisamos manter o foco e... — Ele parou, suspirando. — E confiar um no outro, não importa o quê.

Esse "não importa o quê" ecoou entre nós, uma promessa silenciosa de que, apesar das circunstâncias, estávamos nisso juntos. E, de alguma forma, essa era a única certeza que eu precisava.

À medida que o carro desacelerava, o ambiente ao nosso redor começava a mudar drasticamente. As estruturas densamente compactadas e a vida vibrante das ruas anunciavam que havíamos chegado à Vila do João, um lugar marcado por histórias e conflitos, onde Puma comandava com mão de ferro. O carro estacionou em frente a uma casa que reconheci imediatamente - era a mesma onde eu tinha ficado anos atrás, um lugar que, apesar de suas paredes rústicas e aparência modesta, carregava um peso de memórias profundas.

Lance BandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora