Taglioma

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Um mês depois de ela ir embora.

Estava sentado na cadeira da escola, ainda estávamos na segunda aula e eu não via a hora de ir embora. O professor Rubens falava qualquer coisa sobre a segunda guerra mundial e eu estava rabiscando na última folha do meu caderno, era um elfo com orelhas pontudas montado em um coelho gigante branco. Ri do desenho que eu havia feito e passei o papel para Wallace, que sentava no meu lado esquerdo.

— Posso saber que troca de bilhetes é essa, Eduardo? – Perguntou Rubens, o professor. Ele tinha um bigode meio grisalho e aparentava ser mais velho do que realmente era, talvez fossem os anos de estresse dando aula.
— É sobre a matéria, professor – disse Wallace, tentando me acobertar.
— Vejamos – o professor entrou em meio a fileira de mesas. De repente todos os olhos da sala estavam voltados a nós. Rubens pegou o papel da mesa de Wallace e se pôs a observa-lo. – Pode me dizer onde exatamente um duende montado em um cachorro se encaixa na história, Eduardo?
— É um elfo montado em um coelho – disse. pude ouvir risadinhas na sala toda.
— Quietos – gritou Rubens. – Isso não é engraçado. A escola é um local para o aprendizado, meninos e meninas. Vocês provavelmente devem encher a boca todo dia para falar que a escola é horrível e que não queriam estudar, mas anotem as minhas palavras: Daqui dez anos vocês vão se lembrar desse dia e pensar que essa foi a melhor época de suas vidas. O problema dos momentos bons é que não conseguimos perceber que eles são bons até que já estejam no passado.
— Tudo bem, desculpe. – Eu disse, bem mais porque queria evitar uma briga do que por estar realmente arrependido. E eu descordava sobre aquele ser o melhor momento da minha vida, até hoje ainda tenho certeza que foi alguns meses antes daquele momento.
— Então Eduardo, já que estava prestando tanta atenção na aula, me diga, em que país Adolf Hitler nasceu?
— Alemanha?
— Que burro, ele nasceu na Áustria – gritou alguém no fundo da sala.
— Quem foi que respondeu Áustria? – Perguntou Rubens. Um garoto bem quieto na última carteira levantou a mão. Se tratava de Enzo Miramar, ele era na dele, mas gostava de implicar com os outros. Estava sempre sozinho, não gostava muito de socializar com ninguém.
— Eu respondi.
— Responda apenas quando a pergunta for direcionada a você – disse Rubens. – Não tente bancar o espertinho ou achar que é mais inteligente do que os outros. Se esforce para ser bom, não para ser melhor que outra pessoa.
— Eu sou um dos melhores corredores dessa escola.
— Não mude de tópico, Enzo. Os bobos sempre tentam mostrar seus troféus de força para compensar a fraqueza do cérebro. Me diga, melhor posição que você já chegou?
— Cheguei em segundo na competição de corrida estadual.
— Ou seja, perdeu. Não existe segundos lugares na vida, isso é somente um modo meigo de dizer que não és o vencedor.

Enzo não respondeu, mas o olhar dele dizia tudo: estava com raiva. O professor voltou para a frente do quadro negro e voltou a falar sobre a segunda guerra. Não achei certo o que ele havia feito, tinha praticamente humilhado o garoto na frente da sala, mas gostei de ver o rosto de Enzo quando ficou sem nenhum argumento.

— Foi por pouco – disse Wallace no recreio. – Quase que a gente iria levar a lição de moral que o Enzo levou, ainda bem que ele foi idiota e falou bobagem.
— Acho que ele pegou pesado demais com ele.
— Ah, ele mereceu, vai – disse Wallace. Concordei com a cabeça.
— Ei garotos – disse uma voz feminina. A garota loira e usando uma camisa de flanela apareceu entre nós. – Vocês viram a Ari?
— Oi Beth – disse Wallace.
— Olá Beth, tudo bem?

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