88Hz

As Ondas

Um mês depois dela ir embora

Acordei naquela manhã com os doendo. O despertador soava sem parar e levei alguns segundos para encontra-lo no criado mudo ainda de olhos fechados. Wallace se contorcia no colchão do chão tentando levantar, mas sem forças. Ariane dormia logo mais à frente em seu saco de dormir preto como a noite.

— Wall — chamei. — Tá acordado?
— Mais ou menos.

Ouvi meus pais passando pelo corredor, a porta estava entreaberta. Conversavam algo sobre as cadeiras de praia, porém não entendi muito bem. Wallace se sentou no colchão, mas ainda estava de olhos fechados.

— Posso ficar aqui dormindo?
— Não, Wall.

Ele olhou para Ariane que ainda era uma estátua, depois voltou a olhar pra mim. Eu entendia aquele olhar, ele queria saber se chamávamos ela ou não. O fato era que nenhum de nós queria que ela acordasse de mau humor, a Ariane de mau humor era mais ou menos como um lobisomem assassino.

— Chama você — eu disse.

Ele se levantou e foi até onde estava o saco de dormir da Ariane, empurrou-a com gentileza de um lado para o outro. "Acorda, Ari. Acorda." É claro que ela nem se mexeu.

— ACORDA ARIANE. — Ele gritou. Ela ficou sentada no mesmo instante, seu cabelo estava bagunçado e ela, em um ato quase inimaginável... sorriu.

— Bom dia meus lindos — disse ela. Ela se levantou devagar e se espreguiçou. Quando ela fez isso, sua camisa branca foi até em cima e deixou exposta a calcinha preta que ela usava. Tentei virar o rosto o mais rápido possível para não parecer desrespeitoso, ela pareceu não se importar. Notei também que ela havia feito uma tatuagem na coxa, do qual eu não tive tempo para olhar. Ela saiu andando em silêncio até o banheiro do meu quarto e fechou a porta.

— Nossa — eu falei. Wallace estava olhando para os próprios pés, se percebeu o que havia acontecido ali, não comentou nada. Também supus que ele já havia visto o corpo de Ariane de perto outras vezes.

Fomos os três apertados no banco de trás do carro junto com um isopor que levava refrigerantes e até algumas latas de cerveja. Encontraríamos meu tio e sua família na praia, meu pai ficou de levar a bebida e ele a carne para o churrasco. Minha mãe colocou em alguma rádio aleatória onde só podia se escutar músicas sertanejas. Ariane fez um gesto fingindo que estava vomitando e nós soltamos um riso suave.

— Qual a graça, crianças? — perguntou minha mãe do banco da frente. Meu pai soltou uma risada abafada sobre o volante e minha mãe o encarou. — É sério, qual a graça querido?
— Eles não gostam dessas músicas, meu amor.

O meu bom gosto musical eu tinha herdado do meu pai. Praticamente todos os vinis e fitas que eu tinha pertenceram a ele. Mas ele sabia respeitar o gosto musical da minha mãe e em todo o tempo que eles estiveram juntos, não o vi reclamar das suas músicas nem uma única vez. Conhecendo meu pai como eu o conhecia, sabia que ele teria vindo preparado com uma coleção de músicas boas para a viagem até o Cassino.

— Meu bem, vou colocar umas músicas pros meninos agora, certo? — ele disse quando uma música americana começou a tocar na rádio. — E menina.

Minha mãe assentiu com a cabeça e ele pegou uma fita cassete do porta-luvas. Nós três ficamos observando enquanto ele colocava a fita sem título na pequena entrada. Ficamos nós três imaginando que musica seria que iria tocar, e esperando para que fosse uma boa. A música Black da banda Pearl Jam começou a tocar.

Meu pai nunca havia me decepcionado.

Chegamos a praia e eu queria me sentir melhor, mas não consegui. A última vez que eu tinha estado ali havia sido com Valentina e qualquer lugar sem ela parecia vazio. Ainda lembrava do seu corpo quente junto ao meu, ela usava a parte de cima do biquíni, porém um short na parte debaixo. Me deixou surpreso que aquela garota tão corajosa e impulsiva pudesse ter vergonha de usar um biquíni. Sorri sozinho ao lembrar.