A Morte

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Dois meses depois de ela ir embora

— Atira em mim.

A verdade é que eu nem sei o motivo de eu ter agido daquele jeito. Talvez eu quisesse apenas tirar toda a atenção do Wallace para que eu não tivesse uma morte em minhas mãos, para não perder o meu melhor amigo. Mas talvez eu quisesse mesmo que Ricardo puxasse aquele gatilho e enfiasse uma bala na minha cabeça. Talvez eu quisesse o silêncio e a paz da morte, do vazio. Droga, eu não conseguia acreditar em algo além desse mundo. Eu não conseguia acreditar que pudesse existir um paraíso. Eu queria tanto acreditar nisso, seria tão mais fácil viver a vida sabendo que isso não é tudo. Que isso não é o fim ou que eu vou encontrar todas as pessoas que eu já perdi

Mas eu não. Eu nunca consegui pensar assim.

— Para com isso Ed! — Gritou Wallace.
— Atira em mim se tu tem coragem, Ricardo.
— Você acha que eu não vou atirar?
— Eu não disse nada, tô mandando tu atirar. ATIRA.

Não olhei pra trás, mas pude sentir o peso dos olhares dos meus amigos. Imaginei o Wallace quase fechando os olhos, me vendo vivo pelo que poderia ser a última vez. Desejei que fosse mesmo. Desejei que eu morresse no lugar de Wallace.

— Tu é um merda — disse Ricardo. — Acha que isso vai funcionar?
— Isso o que?
— Esse seu joguinho.
— Não é joguinho nenhum. Tu não é tão machão? Me mata logo.

É claro que não era isso que ele estava esperando. Provavelmente na cabeça do Ricardo ele pensou que nos seguiria, me assustaria e colocaria a arma na minha cabeça, então eu imploraria para que ele não me machucasse e me deixasse ir pra casa, mas ele não percebeu uma coisa.

Eu não tinha mais Valentina.
Eu já estava morto.

— Quer saber? Você não consegue puxar esse gatilho porque provavelmente nem sabe como essa droga de arma funciona. Você é burro demais, cara!

Ele me acertou no rosto com o punho do revolver. Meu nariz doeu ainda mais. Tentei não emitir nenhum som para não transparecer fraqueza, mas foi impossível.

— Tu é um merda.
— É Ricardo. Tu já disse isso.

Nessa hora eu tive certeza de que ele nunca iria puxar aquele gatilho. Não iria porque ele não tinha coragem o suficiente. Ricardo era o tipo de pessoa que vivia de aparência, exatamente por ser considerado um dos garotos mais bonitos da escola. Mas é claro que suas qualidades acabam ai. Ele precisava sempre inferiorizar os outros pra parecer mais do que o ser humano pequeno e desprezível que ele era. Nesse momento eu percebi que ele nunca ligou pra aquela maldita fita, aposto até que ele deixou lá de propósito pra alguém pegar, só pra ele ter motivo pra brigar com alguém. Mas eu estraguei os planos dele. Eu venci aquele idiota e ele se sentiu humilhado na frente de todo mundo. Por isso ele veio atrás de mim.

— O que seus dois amiguinhos estão pensando de você? — Perguntei.
— Esses dois idiotas não tem que pensar nada.
— Como é? — Disse o mais forte.
— Eles acham que tu é um covarde. Isso que eles acham. Aliás, todo mundo acha. Vir me encarar com uma arma? Sério? Não aguenta mesmo uma briga de verdade?
— Eu te quebro a qualquer hora do dia.
— Coloca essa arma no chão e vamos brigar então.

Ele riu.

— Tá certo.

Ricardo enfiou devagar a arma na cintura. Não pensei direito, só fui na direção dele antes mesmo que ele pudesse pensar. Arranquei a arma dele e a joguei no chão. Cai por cima dele na areia, mas dei o primeiro soco com toda a raiva que eu tinha acumulado nos últimos minutos, então o segundo. E o terceiro. Ricardo conseguiu me chutar e fez com que eu caísse na areia, vi seus olhos procurando o revolver, mas Wallace apareceu no meu campo de visão e acertou a barriga dele com o pé de cabra.

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