Capítulo 21 - Visão

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Ficamos na comunidade por mais dois dias, até que os pés de Will cicatrizaram o bastante para podermos ir embora. Os pesadelos continuam me atormentando, mas o lugar possui tanta paz que eu me sinto descansada.

O carro de Halt está distante, em outra estrada, e eu já estava me preparando para formar novas bolhas nos pés quando Jaeger ofereceu cavalos.

Claro que qualquer coisa é melhor do que andar, mas sinto uma certa insegurança nisso, visto que só andei de cavalo duas vezes em toda a minha vida, sendo a última quando eu tinha oito anos.

É começo da manhã do terceiro dia e estou escovando os dentes, nos limites da floresta, quando escuto Chacal atrás de mim. Sei que é ele porque é o único que conversa comigo.

— Não, eu não consegui convencer Halt de te dar aulas também, Chacal — digo, sem mesmo me virar.

— O que te fez pensar que eu vim perguntar isso?

Encaro o garoto de rosto esperto. Em todos os aspectos, ele me lembra uma raposa. Passamos muito tempo juntos durante esses dias. Ele é três anos mais velho do que eu e o único realmente disposto a conversar, tirando Will, que tem que ficar em repouso.

— É o que você me pergunta sempre que se aproxima.

Ele levanta as mãos em sinal de rendição.

— Tudo bem, você me pegou. Mas não, hoje eu vim para te apresentar aos cavalos.

— Isso sim é novidade.

O garoto ri antes de pedir para que eu o siga.

— Temos cinco — conta — Coruja os comprou há um ano, quando a Tecelã ficou velha demais para ir à cidade a pé.

A Tecelã. Eu a vi no dia anterior na varanda de sua cabana. Trocamos apenas um breve aceno, mas Halt me contara um pouco sobre ela.

— Não foi ela quem meio que fundou a comunidade?

Chacal assente.

— Junto com Jaeger — ele olha ao redor quando entramos na floresta. — Mas ela tem alguns netos que não concordam com a vida aqui e ela faz questão de visita-los no inverno. Os cavalos se provaram muito úteis para nos locomovermos.

— Você também tem família?

Chacal demora alguns segundos pra responder. Eu estava prestes a deixar para lá quando ele fala:

— Não.. eu.. bom, eu vivi a vida toda em um orfanato... Assim que fiz dezoito e saí de lá, conheci Jaeger e vim para cá. Não tenho pretensão alguma de viver na cidade, mas às vezes Jaeger me pede para buscar algumas coisas ou escoltar a Tecelã para a família dela.

Fico calada, sem saber bem o que dizer, e ele suspira, desconfortável.

— Aqui estão!

Se eu olhasse para trás, ainda conseguiria ver a sombra das cabanas na clareira. Estamos na frente de um cercado grande com um estábulo, onde cinco cavalos claramente velhos estão pastando calmamente.

Chacal limpa a garganta.

— Da esquerda para a direita, temos o Veloz, Teimoso, Whakaaro Nui, Dócil e Selvagem.

Ele pula o cercado e se aproxima de Dócil, uma égua bege, que prontamente abaixa a cabeça para que Chacal a acaricie. Ele sorri para o cavalo, absorto nas carícias, até que acena para mim, pedindo para que eu me aproxime.

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