O meu primeiro instinto ao ver o rosto magro do diretor é esconder as partes do meu livro atrás do corpo, o que é a coisa mais idiota que eu poderia fazer. O diretor estica o pescoço cumprido, tentando ver atrás de mim.
— O que está tramando?
Eu me atropelo nas palavras ao tentar me recuperar da surpresa:
— Eu estava.... estava... — é a minha primeira vez falando com o diretor frente a frente e isso chega a ser tão assustador quanto encarar Horace. — Eu vim pedir transferência.
— Transferência? — Repete, arqueando uma sobrancelha. A visão me faz lembrar de um pavão empertigado. Ele parece ter saído de um livro infantil. — Vai se mudar de cidade?
Ando um passo para trás.
— Não... eu só... quero ir para outra escola.
— Não vejo o porquê a senhorita iria querer isso. É uma aluna com excelentes notas — diz. — Nunca ouvi nenhuma reclamação sobre você.
Você é uma aluna exemplar e eu preciso de você representando a escola nesse sentido, tanto quanto Horace nos esportes, é o que eu sei que ele quer realmente dizer.
— Mesmo assim — minha resposta sai baixa. — Não quero continuar.
— Poderia me dizer o porquê? — Ele se aproxima um passo.
Eu me distancio dois.
— Não. O senhor não daria ouvidos.
Calo-me imediatamente. O que está acontecendo comigo hoje? Devo ter batido a cabeça forte demais na queda. Onde que eu tirei essa ousadia?
— Tente — o diretor coloca os ombros para trás e tenta se aproximar mais um passo. Ao ver que eu não recuo, ele cobre a distância que nos separa e segura o meu ombro. — Venha, tome uma xícara de chá enquanto me conta o que aconteceu.
Hesito. Isso está indo completamente fora dos meus novos planos. Tudo bem que eu não havia pensado que o diretor já havia reparado em mim — ou melhor, em minhas notas —, e por isso eu não havia sopesado essa minha vantagem contra Horace.
Tenho meu livro como prova, mas Horace tem a mordida. Eu o agredi fisicamente enquanto que ele me agredira emocionalmente.
Qual dos dois o diretor iria achar mais importante, eu não sabia.
— Apenas contar. Não precisa vir à público. — diz ele ao notar minha hesitação. — Eu apenas gostaria de entender o porquê uma das melhores alunas desse colégio quer nos deixar de repente.
Assinto, dando um passo à frente. Bem, já que estou em um beco sem saída, posso pelo menos tentar fazer o certo. E não apenas por mim, penso, mas por todos aqueles que já sofreram e sofrerão nas mãos de Horace.
O diretor me guia até a sua sala sem soltar o meu ombro e me indica uma cadeira para sentar. Ele dá a volta na sua mesa de queixo erguido e se senta de frente para mim.
— E então? — Indaga, as duas sobrancelhas erguidas. Ele estica o pescoço longo para pegar o chá no canto da mesa e me serve enquanto usa esse tempo para elogiar meu bom comportamento e em como eu fora bem nas últimas provas. — eu esperava que você pudesse representar a escola nas competições de ciências semestre que vem.
Fico surpresa e sem reação por alguns segundos enquanto processo os elogios. Eu jamais esperaria isso de alguém. Apesar de que o diretor pavão parece mesmo ser um colecionador de qualquer aluno que possa fazer propaganda da escola.
Há quadros de alunos segurando troféus em sua mesa, voltados para mim e eu não duvido que eu estaria entre eles se ganhasse a tal competição. E tenho menos dúvidas ainda de que Horace ganhará um quadro em breve para si.
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Cryokinesis
Science FictionAlyss nasceu com um dom. Um dom que por muitas vezes desejou não tê-lo. A habilidade de poder controlar o gelo e as baixas temperaturas tornou-se um fardo em sua vida; principalmente porque agora ela está sendo caçada. O que para ela era julgado c...