Capítulo 11 - Bernardo

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- Você não pode mais me ignorar – digo, me sentando ao lado de Jane. Seus cabelos escondem parte de seu rosto enfiado num caderno preto, escrevendo algo em letras minúsculas... que parecem notas musicais? Coloco a mochila numa cadeira vazia e me afundo no assento, descansando da caminhada de casa até a aula. Andar é o único jeito de chegar às aulas de oito da manhã sem desejar estar em casa debaixo das cobertas. Principalmente numa segunda-feira tão fria que faz o cobertor parecer ainda mais tentador que o normal.

- Quem disse? – resmunga a garota, sem levantar a cabeça.

- Eu. Me recuso a voltar a ser invisível em seu radar. Além disso, me sinto mal pelo que aconteceu no final de semana.

- O que aconteceu no final de semana? – Jane pergunta sarcástica, saindo de sua posição de Quasimodo. – Você não pode estar se referindo àquele cheiro repugnante que ainda está impregnado em meu carro, não é?

- Talvez sim, talvez não, mas definitivamente por alguma coisa.

- Definitivamente.

- Sinto que devo fazer alguma para compensar, mesmo sem saber direito o que aconteceu – digo, fingindo emoção na voz.

- Se você desaparecer, talvez eu esqueça tudo o que aconteceu... até entrar no carro novamente. – Aí está a prova de que Jane não é uma pessoa matutina. Bocejo, tentando espantar o sono, depois de ter virado a noite jogando. #VidaLoka.

- Que tal um café? Com pão de queijo? – pergunto.

- Que tal você pagar por um lava-rápido completo?

- Não vai acontecer. – Não com minha renda mensal e não depois de ter feito um trabalho bem bom (ou não muito ruim) em seu carro.

- Então estou bem, obrigada. – Ela volta a rabiscar o caderno preto, me ignorando.

- Então tá. – Retiro um caderno da mochila e inicio a jornada em busca da caneta perdida, dentro da mochila sem fundo. Papeis soltos, lápis sem ponta, papeis de bala e chocolate são despejados na mesa, na tentativa de encontrar uma única caneta que funcione.

- O que você está fazendo? – pergunta Jane, suas sobrancelhas unidas, indignada. Uma Bic cai de um dos mil bolsos.

- Estou arrumando meu material. – Balanço a caneta recém encontrada na altura do seu rosto. – A aula vai começar... olha ali na frente, aquele é o professor. Ele já vem fazendo o trabalho dele há algumas semanas. E você? – Aponto para o homem grisalho e com barriga proeminente por baixo da camisa social listrada. Ele havia acabado de entrar na sala e, sem falar com ninguém, retira sem pressa algumas folhas e canetas de quadro de sua pasta preta, que foi feita para carregar notebooks.

- Não sente aqui, Bernardo. – O tom de Jane parece quase implorar ao se afundar na carteira ao meu lado, apoiando a nuca no encosto desconfortável. – Tem tantos outros lugares vazios lá na frente, todos estão gritando seu nome, não tá ouvindo?

- Ainda não. – Imito sua posição exageradamente. – Está muito cedo para ouvir cadeiras falando, Jane. Isso só acontece depois das duas da manhã e de pelo menos três Josés Cuervos. – O professor começa a falar sobre a atividade que havia passado na última aula e o silêncio da sala aumenta. É raro ver turmas barulhentas no primeiro horário da manhã. – Parece que alguém acordou com o pé esquerdo hoje... ou talvez nem tenha dormido já que cadeiras estão gritando.

- Só preciso ficar quieta, sem barulho, sem conversa durante as primeiras horas da manhã. É pedir demais? – sussurra, sem se mover.

- Quando se tem aulas as oito, diria que sim. – Abro o caderno e comparo minhas respostas com as que o professor anota no quadro enquanto Jane boceja sonoramente. – Você sabe que ele vai recolher a atividade, não é?

A fórmula matemática de Bernardo e JaneOnde histórias criam vida. Descubra agora