Capítulo 23 - Bernardo

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- O que sua mãe acha disso, Bê? – pergunta o pai, assim que termino de explicar o convite de Jane. Seu questionamento é retórico, pois ele sabe muito bem que eu lhe perguntaria primeiro e depois à mãe (no caso de não estarem os dois juntos, como agora).

- Sabe que ainda não falei com ela – digo, mantendo a voz baixa. Estou na biblioteca, aproveitando o wi-fi de graça, e mesmo que à minha frente esteja apenas uma enorme janela, não posso fazer barulho. Ao menos é o que a garota a alguns metros parece dizer com a reprovação em seu olhar. Imagina se eu não estivesse usando fones de ouvido?

- Me conta de novo quem são essas pessoas? – pergunta. Atrás do pai, consigo ver os quadros do seu consultório. Aproveitei seu horário de almoço para ligar, já que a chance dos meus pais concordarem com a viagem é maior quando estão separados, especialmente se estiverem prologando a discussão de ontem. – Não, espera. Essa hora sua mãe deve estar em horário de almoço, vou ligar para ela.

E lá se vai meu plano por água abaixo. A tela do pai se move, enquanto liga para mãe. Aguardamos em silêncio até que ela atenda. Bom, silêncio é algo relativo quando o pai murmura para si mesmo todas as suas ações. "Cadê você, amor?", "achei!", "agora vamos te ligar" e assim por diante.

- Recebi sua mensagem, querido – diz a mãe ao surgir na tela, ao lado do pai. Mesmo chamando a todos de "querido", sei que está falando com o pai, pois não lhe enviei nenhuma mensagem. – Então Bernardo quer passar o feriado com sua nova namorada?

- O que? Como assim? Ele não me deu esses detalhes! – Meu pai oscila entre curioso e ofendido. Ele é o único que se ofende se algo acontecer em minha vida sem ser ele o primeiro a saber. Quer dizer, não que Jane e eu estejamos namorando oficialmente, mas é tudo uma questão de tempo.

- Flávio me contou que Bernardo arranjou uma nova namorada... Jane, é esse o nome dela, querido? – pergunta, sem me dar chance de responder. Como sempre, Flávio, filhinho da mamãe, ataca novamente. – Ele descobriu isso quando foi visitá-lo no final de semana.

- Flávio foi lá essa semana? – A boca do pai faz um O, perplexo. – Quantos outros segredos minha família está escondendo de mim?

- Sim, querido. Tenho certeza de que te falei da visita.

- Tenho certeza de que não... e minha memória é muito boa.

- Querido, te falei isso no domingo à noite e, se minha memória não falha, sua resposta foi "morre, desgraçado, morre!". – E aí está a prova de que a discussão deles ainda não terminou.

- Você sabe muito bem que não deve falar coisas importantes no meio do jogo!

- O que você disser. – A mãe revira os olhos e, mesmo sem tirá-los da tela, sei que irá falar comigo. Posso perceber pela forma como sua testa e os cantos dos seus olhos se suavizam. – Bernardo, acho ótimo que tenha superado aquela loura de farmácia, como seu irmão diria. – Não é segredo que nunca gostou de Thaís. Ela, Flávio e Bruno fazem um excelente trio quando o objetivo é falar mal dela... ou de qualquer uma das minhas ex. – Mas gostaria que respondesse a duas perguntas antes. A primeira é simples: o que você quer, querido?

- Ir.

- Certo. – A mãe esboça um quase sorriso. – A última pergunta é aquela que seu pai irá me fazer às duas da manhã, longe dos seus ouvidos, mas estou cansada e acho que podemos resolvê-la agora. Você está indo nessa viagem apenas porque não vamos te visitar, como havíamos combinado?

- Não, é claro que não – respondo. – Mas esse foi o motivo para terem me chamado para ir com elas.

- Tudo bem por mim – conclui. – Agora vou desligar...

A fórmula matemática de Bernardo e JaneOnde histórias criam vida. Descubra agora