Capítulo 24 - Jane

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Como pode aquele garoto estupidamente amigável conseguir me deixar tão estupidamente frustrada? Não apenas porque vamos passar as próximas noventa e seis horas juntos, mas também porque essa seria mais uma relação destinada ao fracasso em minha lista e mais um contato para Bernardo discar alguns minutos antes de vomitar.

– Tem certeza, Jane? – Bia pergunta novamente, dessa vez segurando uma tesoura na mão direita, e me fazendo empurrar Bernardo para longe da mente.

– Absoluta – digo, enrolando no pescoço a toalha que usei para tomar banho.

– Eu preciso filmar isso, porque tô sentido que vai bombar! – Lídia estica seu celular em minha direção e sou forçada a lhe dar meu melhor olhar impaciente. Ignorando o aviso, Lídia gira entorno da cadeira em que estou sentada, me filmando em 360º e parando ao lado de Bia, que desembaraça meu cabelo. Estamos no meio da sala do apartamento delas, com a colega de quarto, Paloma, dividindo sua atenção entre o que fazemos e seu computador.

– É só cabelo, Bia. – Tento aliviar a tensão que circula ao seu redor. – Essa não é a primeira vez que corta meu cabelo e nem vai ser a última.

– Ir ao salão é tão caro assim? – pergunta Paloma entediada, colocando o computador de lado. – Se quiser eu faço, já cortei cabelos antes. Só assim essa algazarra acaba logo.

Levanto, pois meu cabelo está longo demais para Bia cortá-lo enquanto estou sentada. Ajoelho na cadeira e sento sobre os calcanhares, para melhor ajustar a altura. Cortamos meu cabelo no final do ano passado e outro corte precisa ser feito urgentemente, já que não tenho tanta paciência assim e lavá-lo está começando a dar trabalho demais.

Bia inclina a tesoura pela terceira vez, avaliando a melhor posição para começar. Na primeira vez, ano retrasado, ela chorou porque achou que tivesse cortado torto demais para consertar.

– Sem segredo – digo, tentando achar palavras para prevenir olhos vazando novamente. – Pense numa linha reta e corte.

Sinto a ponta da tesoura encostar do lado direito em minhas costas antes de ouvir o barulho de fios sendo mastigados pelo objeto. Ela continua na mesma posição, repetindo o movimento durante alguns segundos. Lídia não polpa risos.

– Jane, ainda bem que eu estou filmando a cara da Bia! Precisa ver! Parece que está cortando o próprio cabelo... ela está sofrendo tanto! – Lídia gargalha, mas mantém o celular firme apontado para a irmã. Bia grunhe frustrada e apoia a testa em minhas costas, murmurando algo incompreensível.

– Eu não me importo – diz Paloma, pegando a tesoura de Bia, que cede sem resistência. Bia me encara desolada, quase pedindo desculpas, e esboço um sorriso para reconfortá-la.

– Nada complicado – explico a Paloma e aperto a toalha em meu pescoço. – Um corte reto, sem firulas.

– Como já disse antes, essa não é a minha primeira vez. – Ela solta um muxoxo reprovador enquanto avalia os fios ao redor do meu rosto. – Senta na cadeira, já que preciso repartir seu cabelo de novo. – Bia toma essa deixa para ser prestativa, como sempre, e avisa que vai ao banheiro pegar pregadeiras.

– Não – Lídia reclama, com a voz esganiçada. – Deixa Bia fazer!

– Senta a bunda no sofá, menina – resmunga Paloma. Sempre desconfiei que ela fosse a colega de casa ideal para conviver com Lídia: Paloma não se deixa levar por dramas de ninguém. – E se você me filmar e colocar na internet, amanhã vai acordar com seu cabelinho ruivo sozinho no travesseiro. – Lídia faz uma careta, mas tira o celular do rosto da garota e o coloca na minha frente.

A fórmula matemática de Bernardo e JaneOnde histórias criam vida. Descubra agora