"Acorda, linda, acorda e arrasa" ecoa a voz excitada de Lídia. "Acorda e beijinho no ombro para esse sono que está inchando seus olhos maravilhosos". Me apoio sobre os cotovelos, com a barriga virada para baixo, e tento pegar o celular de Lídia. Não consigo imaginar como Bia acorda todos os dias com esse alarme sem surtar e sem jogar o celular pela janela... como preciso fazer agora.
- Sai – resmunga Lídia, empurrando minha mão para fora de sua cama.
- Então faz essa voz do capeta parar – reclamo. Ninguém em sã consciência gravaria sua própria música de alarme... com sua própria voz aguda e cheia de motivação irritante. Juntando todas minhas forças, tento manter os olhos abertos para não cair no sono novamente. A cortina falha em sua função primordial e deixa parte da manhã escapar pelos cantos da janela, ignorando nosso sono.
- Levanta, Jane – chama Bia, fazendo meu colchão afundar com seu peso. O pé de sua cama está cheio de malas e ela precisa passar pela minha cama para levantar da sua. Assim que seus pés encontram o chão firme, ela puxa o edredom de Lídia para baixo, fazendo a irmã grunhir frustrada.
- Você também, Lili... que sempre demora séculos para se arrumar. – Bia acende a luz e um palavrão escapa dos meus pulmões. Cegueira momentânea é o que ganho por tentar ficar de olhos abertos e não voltar a dormir. Bia se movimenta no quarto, pegando peças de roupas estrategicamente posicionadas. – Se der a hora de sairmos e não estiver pronta, vai ficar para trás, já estou avisando!
- Jane não vai me deixar para trás – resmunga Lídia.
- Tem certeza disso? – retruca Bia.
- Mas Jane ainda está deitada! – Lídia parte para defensiva, provavelmente se lembrando das duas vezes em que promessas semelhantes foram cumpridas. Bia diz outro "avisada" e entra na suíte.
Bocejo com vontade e levanto. Automaticamente, arrumo a cama (mas não sem rugas, como Bia), guardando a manta e o travesseiro emprestados no armário. Tiro uma blusa limpa de dentro da mochila e pego a calça que usei ontem de cima da cadeira. Com as roupas na mão e areia nos olhos, vou ao outro banheiro antes que Lídia monopolize o local.
De relance vejo meu reflexo no espelho e me assusto com a imagem. Quanto tempo vai demorar até me acostumar com o novo corte? Deixo o pijama que Bia havia me emprestado pendurado atrás da porta. Há quanto tempo não visto um pijama? Desde a última vez que Bia me emprestou, com certeza.
- Em cinco minutos vou terminar de descer todas essas malas para o carro – aviso. – Se você não estiver pronta, só no próximo feriado. – A ameaça faz efeito e Lídia se arrasta para fora da cama com os olhos fechados. Coloco minha mochila no ombro e empurro a mala de Bia para fora do quarto. Lídia passa por mim resmungando algo que soa como "mal humor".
Estaciono a mala vermelha na porta da sala, volto ao quarto e pego a sacola grande e cor de rosa de Lídia. Calço as botas mecanicamente e demoro tanto para amarrar os cadarços, que me sinto uma criança de três anos. Coordenação motora pela manhã é algo tão raro quanto Lídia acordar e levantar, sem enrolar na cama. Lutando contra o sono, arrasto as malas até o elevador e de lá até a garagem.
A mala de Bia é tão grande que aposto que sua irmã cabe ali dentro sem esforço. Ando pela garagem vazia e vejo minha belezinha me esperando. A visão ajuda a espantar um pouco do sono. Abro o porta-malas (propositalmente vazio das tranqueiras cotidianas) e empurro o macaco e a caixa de ferramentas para o canto, para colocar as bagagens.
Juntando toda pouca força que alguém pode ter ao acordar, coloco o chumbo que Bia chama de mala dentro do carro, tentando não suar muito. Por cima coloco a sacola de Lídia. Antes de guardar minha mochila, tiro a carteira e a coloco no bolso que não está ocupado pelo celular.
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A fórmula matemática de Bernardo e Jane
Genel KurguJane nunca se rendeu às convenções sociais. Por isso, seus bens mais preciosos são seu carro (restaurado por suas próprias mãos), sua guitarra (por ser mais portátil que seu piano) e um caderno preto com todas suas músicas (às vezes) inacabadas. Ber...