Capítulo 25 - Jane

3K 418 125
                                    

"Acorda, linda, acorda e arrasa" ecoa a voz excitada de Lídia. "Acorda e beijinho no ombro para esse sono que está inchando seus olhos maravilhosos". Me apoio sobre os cotovelos, com a barriga virada para baixo, e tento pegar o celular de Lídia. Não consigo imaginar como Bia acorda todos os dias com esse alarme sem surtar e sem jogar o celular pela janela... como preciso fazer agora.

- Sai – resmunga Lídia, empurrando minha mão para fora de sua cama.

- Então faz essa voz do capeta parar – reclamo. Ninguém em sã consciência gravaria sua própria música de alarme... com sua própria voz aguda e cheia de motivação irritante. Juntando todas minhas forças, tento manter os olhos abertos para não cair no sono novamente. A cortina falha em sua função primordial e deixa parte da manhã escapar pelos cantos da janela, ignorando nosso sono.

- Levanta, Jane – chama Bia, fazendo meu colchão afundar com seu peso. O pé de sua cama está cheio de malas e ela precisa passar pela minha cama para levantar da sua. Assim que seus pés encontram o chão firme, ela puxa o edredom de Lídia para baixo, fazendo a irmã grunhir frustrada.

- Você também, Lili... que sempre demora séculos para se arrumar. – Bia acende a luz e um palavrão escapa dos meus pulmões. Cegueira momentânea é o que ganho por tentar ficar de olhos abertos e não voltar a dormir. Bia se movimenta no quarto, pegando peças de roupas estrategicamente posicionadas. – Se der a hora de sairmos e não estiver pronta, vai ficar para trás, já estou avisando!

- Jane não vai me deixar para trás – resmunga Lídia.

- Tem certeza disso? – retruca Bia.

- Mas Jane ainda está deitada! – Lídia parte para defensiva, provavelmente se lembrando das duas vezes em que promessas semelhantes foram cumpridas. Bia diz outro "avisada" e entra na suíte.

Bocejo com vontade e levanto. Automaticamente, arrumo a cama (mas não sem rugas, como Bia), guardando a manta e o travesseiro emprestados no armário. Tiro uma blusa limpa de dentro da mochila e pego a calça que usei ontem de cima da cadeira. Com as roupas na mão e areia nos olhos, vou ao outro banheiro antes que Lídia monopolize o local.

De relance vejo meu reflexo no espelho e me assusto com a imagem. Quanto tempo vai demorar até me acostumar com o novo corte? Deixo o pijama que Bia havia me emprestado pendurado atrás da porta. Há quanto tempo não visto um pijama? Desde a última vez que Bia me emprestou, com certeza.

- Em cinco minutos vou terminar de descer todas essas malas para o carro – aviso. – Se você não estiver pronta, só no próximo feriado. – A ameaça faz efeito e Lídia se arrasta para fora da cama com os olhos fechados. Coloco minha mochila no ombro e empurro a mala de Bia para fora do quarto. Lídia passa por mim resmungando algo que soa como "mal humor".

Estaciono a mala vermelha na porta da sala, volto ao quarto e pego a sacola grande e cor de rosa de Lídia. Calço as botas mecanicamente e demoro tanto para amarrar os cadarços, que me sinto uma criança de três anos. Coordenação motora pela manhã é algo tão raro quanto Lídia acordar e levantar, sem enrolar na cama. Lutando contra o sono, arrasto as malas até o elevador e de lá até a garagem.

A mala de Bia é tão grande que aposto que sua irmã cabe ali dentro sem esforço. Ando pela garagem vazia e vejo minha belezinha me esperando. A visão ajuda a espantar um pouco do sono. Abro o porta-malas (propositalmente vazio das tranqueiras cotidianas) e empurro o macaco e a caixa de ferramentas para o canto, para colocar as bagagens.

Juntando toda pouca força que alguém pode ter ao acordar, coloco o chumbo que Bia chama de mala dentro do carro, tentando não suar muito. Por cima coloco a sacola de Lídia. Antes de guardar minha mochila, tiro a carteira e a coloco no bolso que não está ocupado pelo celular.

A fórmula matemática de Bernardo e JaneOnde histórias criam vida. Descubra agora