Prólogo

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Três meses atrás

Se andar pelas ruas dessa cidade universitária à meia noite, você vai encontrar apenas carros estacionados e cachorros encolhidos, se protegendo do frio como podem. Mas essa não é uma noite qualquer.

Pessoas entram e saem da casa número trezentos e um, conversam na porta da garagem em grupos animados, sobem e descem as escadas externas, que levam ao terraço, rápido demais para quem está meio bêbado.

- Acredita que paguei vinte reais pelo ingresso antecipado, Bê? – pergunta um dos rapazes conversando no jardim da casa. Elesegura uma garota morena pela cintura. Seu olhar não está nela, mas no garotoque se aproxima do grupo, de mãos dadas com uma loura pequena e entediada.

- Eu pagaria o dobro para assistir àquele pessoal tocar! – responde Bernardo, beijando as costas da mão da menina, que por enquanto é sua namorada.

- E você deveria mesmo! – diz um rapaz que nenhum deles conhece, mas que se aproximou do grupo reclamando da cerveja e isso, em qualquer festa, é motivo suficiente para iniciar uma amizade.

Vestindo uma jaqueta de couro pequena demais para seu tamanho, ele rodopia chaves de carro nos dedos, exibindo-as. Disfarçadamente, os olhos da loura sobem de suas mãos para seu peito com interesse. – Tem gente ali que deveria estar tocando em qualquer outro lugar, menos nessa esquina de fim de mundo – acrescenta.

- Como assim você pagou, Bruno? – pergunta o último integrante de roda. Seus cachos balançam surpresos ao redor do rosto, emoldurado por óculos grandes.

- Você não? – Bruno traz mais para perto a morena (que ignora os demais, perdida em seu celular, balançando o corpo levemente ao som da música que vem do andar de cima), porque a noite está fria e sua camisa nova não fica bem com nenhum de seus agasalhos.

- Tem porteiro, cara? É só entrar. – Os cachos reviram os olhos, tomando um gole de sua cerveja. Bruno encara as pessoas na porta e assente, sentindo pesar o papel minúsculo carimbado dentro do seu bolso. Tinha o peso de uma nota de vinte reais.

- Você não presta atenção em nada! – diz Bernardo, com um sorriso fácil. – Eles falaram que queriam o dinheiro para comprar as bebidas, mas que a entrada era liberada.

- Por que você deu dinheiro a eles, então? Só paguei, porque te vi pagando e achei que precisávamos de ingresso! – reclama Bruno.

- Porque nós estamos ouvindo um pessoal excelente tocar, enquanto bebemos cerveja que saiu quase de graça. – Satisfeito com seu argumento, Bernardo troca a bebida de mão, colocando seus dedos gelados dentro da blusa de sua companheira. Ela grita, pula e lhe dá um soco nas costelas, irritada.

- Calma, Tata! Foi só brincadeirinha – diz, se desculpando. Algumas vezes esquecia que Thaís está entre as pessoas mais temperamentais que já conheceu, indo do nada a amassos em cantos escuros, em menos de cinco segundos. Ela emburra e solta sua mão da dele.

- Uma vez, aquela garota arrasando o teclado e eu, fizemos uma aposta para ver quem conseguiria aguentar mais tempo debaixo de uma cachoeira – começa a contar o novo amigo, numa voz que demanda atenção.

A garota morena levanta os olhos do celular, com interesse maior em seu sorriso rodeado pela barba por fazer, do que na história. – No meio de julho, num frio de bater os queixos, com água caindo numa pressão que molhava tudo há muitos metros de distância. Ela tira o casaco e a calça jeans, mergulha na água e me desafia a entrar dentro daquele inferno gelado.

- E o que aconteceu? – pergunta Thaís, desejando continuar ouvindo sua voz firme e sedutora, saindo de uma boca igualmente atraente.

- O que mais eu poderia fazer? Pulei na água! Antes mesmo de chegar debaixo da cachoeira eu já não estava sentindo nem os pés, nem as mãos. – O rapaz sorri, sabendo que tem seu público cativo. Bernardo aproveita a distração de Thaís e a traz mais para perto, pela barra de seu casaco. Num gesto rápido, a garota se afasta do seu alcance.

A fórmula matemática de Bernardo e JaneOnde histórias criam vida. Descubra agora